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15 de Março de 2012 às 23:30

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O futebol é um mundo, é um desporto, é uma paixão, é uma loucura - e é também um negócio. Um negócio de gente rica em clubes falidos. Um negócio em que sempre se pagaram salários milionários mas não os impostos. Quando Catroga penhorou as Antas, levou com uma retrete de Pinto da Costa. Veio Sousa Franco e a bestialidade de um Totonegócio nauseabundo - mas as dívidas perduraram. Até ontem. Com um truque.

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O futebol é um mundo, é um desporto, é uma paixão, é uma loucura - e é também um negócio. Um negócio de gente rica em clubes falidos. Um negócio em que sempre se pagaram salários milionários mas não os impostos. Quando Catroga penhorou as Antas, levou com uma retrete de Pinto da Costa. Veio Sousa Franco e a bestialidade de um Totonegócio nauseabundo - mas as dívidas perduraram. Até ontem. Com um truque.

Ontem pode ter sido um dia histórico. A Federação diz que vai pagar as dívidas que os clubes reconhecem. E assim o mesmo Governo que foi chicoteado pelo recuo face ao lóbi da EDP vence o lóbi do futebol. Se for assim, Passos, Gaspar e Relvas hoje não são postos a andar - sobem para o andor. Com aplausos.

Eia uma história que cheira mal. Foi em 1999 que se fez o Totonegócio, acordo mediante o qual as dívidas ao fisco dos clubes de futebol seriam pagas pelas receitas futuras do Totobola. As receitas não bastaram, fez-se novo acordo em 2004, as receitas voltaram a não bastar, os clubes foram agora ameaçados de execução pelo fisco. Federação, Liga, clubes lá foram bater no ceguinho e pedir para pagar a coisa a prestações. No total, são 33 milhões de euros, dos quais os clubes contestam 20 milhões, em parte por considerarem que foi o Estado quem atraiçoou as receitas do Totobola ao criar novos jogos sociais. Essa fatia está em tribunal.

Preparava-se um desfecho inaceitável de favor aos clubes. Não o houve. Os 13 milhões de euros que a Federação reconhece são pagos já, mantendo-se as mesmas receitas de jogos sociais. Os outros 20 milhões ficam a marinar nos tribunais. Mas assim todos saem bem: o Estado que recebe 13 milhões, o Governo que não cedeu, os clubes que passam a cumpridores e a Federação agora liderada por Fernando Gomes que quer acesso às receitas "de outros jogos que o Governo venha a criar". É aqui que está o truque: o Estado anda doido para tributar os jogos online, o que ainda não conseguiu, por essas empresas estarem em offshores. Ora, os clubes querem garantir já parte dessa promissora tributação.

Se o Governo aceitar o acordo, os clubes garantem assim simultaneamente a regularização da situação fiscal e mais uma fonte de receitas futuras. E bem precisam delas. Porque o seu modelo de negócio está todo torto.

Há uma indústria que vive do futebol e sangra os clubes. Enquanto os clubes vão falindo, submersos em dívidas, há hordas de agentes enriquecidos que transaccionaram jogadores com salários obscenos com dirigentes que não se sabe bem do que vivem. Quando a crise chegou e tapou o crédito, a situação tornou-se evidente. Clubes vencedores, como o Porto e agora o Benfica, montaram um modelo de negócio que vive de vendas caras de jogadores comprados baratos; clubes bem geridos como o Braga ascendem na Europa; clubes mal geridos como o Sporting estão em falência: o sportinguista mais eufórico com o resultado de ontem em Manchester, que lhe permitiu a passagem à próxima ronda da Liga Europa, há-de ter sido o director financeiro do clube.

O futebol profissionalizou-se mas ainda é estruturalmente inviável. Vive de receitas futuras, razão pela qual a Olivedesportos tem o poder que uma ANF tinha nas farmácias ou que o FMI tem em Portugal: empresta a aflitos.

A solução para o Totonegócio não é o princípio de nada mas é pelo menos o fim de um acordo vergonhoso feito entre gente sem vergonha na cara. Se o acordo vingar, se a Federação pagar, se o Governo não entregar as receitas futuras, tira-se o chapéu a esta gente toda. Se, se, se é apesar de tudo melhor que mas, mas, mas. Até porque podemos dizer: olha, ainda há vergonha. Haverá?

psg@negocios.pt


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