Opinião
O subsídio que embala o berço
O envelhecimento da população e o aumento da esperança média de vida transformaram-se numa fonte de problemas graves em quase toda a Europa. Criaram crises no financiamento do celebrado modelo social europeu, apertado por uma legião crescente de reformado
Os cuidados de saúde melhoraram, mas são agora mais caros. E têm que acorrer às necessidades de mais pessoas, durante mais tempo.
Os benefícios do progresso são bem-vindos, mas não são gratuitos. Uma parte da solução tem-se centrado na mudança de regras dos sistemas públicos de pensões de reforma e de serviços de saúde, na tentativa de conter despesas e assegurar a respectiva sustentabilidade. Mas não chega. O ataque à reduzida taxa de natalidade, que afecta a maioria dos países europeus, entrou na ordem do dia. E por razões de peso. As previsões indicam que, por volta de meados do século corrente, a Europa terá menos sete milhões de habitantes. A quota do Velho Continente na população global terá baixado, por essa altura, dos actuais 21% para apenas 7%. Os números justificam que os sinais de alarme estejam a soar, incluindo em Portugal, onde o número médio de filhos por mulher se tem mantido em baixa persistente, situando-se agora em 1,36.
Os dados em causa dão óbvio apoio às medidas anunciadas pelo primeiro-ministro na semana passada, destinadas a estimular o aumento da taxa de natalidade. Mas um quadro consistente de incentivos vai necessitar de um esforço maior e mais alargado. A observação daquilo que se passa nalguns dos parceiros de Portugal mais bem sucedidos nesta batalha por um novo “baby boom” fornece algumas lições úteis. O sucesso das políticas não depende tanto da subsidiação das famílias de acordo com o número de descendentes, mas da compatibilização entre a vida pessoal e profissional de quem decide constituir família.
Qualquer pai, mãe ou simples candidato ao estatuto, sabe que fazer a opção por ter filhos pode tornar-se num fardo suficientemente pesado para desincentivar a aventura. Os horários de trabalho são rígidos, as exigências das carreiras profissionais não contemplam cedências para cuidar da família e as empresas abdicaram de tomar a iniciativa de proporcionar condições a quem tem que largar os filhos durante o dia para poder cumprir as suas obrigações laborais. Qualquer reportagem que tenha por objectivo recolher testemunhos sobre os sacrifícios que é necessário aceitar para ter, simultaneamente, família e profissão, apenas corre o risco de enfrentar sérias dificuldades por excesso de escolha na edição da informação.
É por tudo isto que a eficácia de medidas que tenham por objectivo aumentar a natalidade exige muito mais que a boa intenção de subsidiar os nascimentos. Está em causa a articulação de políticas sociais e laborais e, mais difícil, uma mudança de valores que não depende de decisões avulsas, nem da simples vontade do Governo. Ao anunciar o reforço dos incentivos à natalidade, o primeiro-ministro deu apenas um primeiro passo num caminho longo. A iniciativa merece nota positiva, mas também suscita dúvidas. Sendo os incentivos dirigidos às famílias de menores rendimentos, o que sucederá quando os apoios chegarem ao fim do seu prazo de vida? O Estado continuará a embalar o berço?