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26 de Setembro de 2014 às 14:46

Os méritos da nova normalidade da China

A economia da China está, finalmente, num processo de reequilíbrio, com a taxa de crescimento a cair de mais de 10%, antes de 2008, para cerca de 7,5%, actualmente. Será esta a "nova normalidade da China", ou o país deve antecipar um crescimento ainda mais lento na próxima década?

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O reequilíbrio da China é evidente, em primeiro lugar, no sector das exportações. O crescimento das exportações abrandou desde a taxa média anual de 29% entre 2001 e 2008 para menos de 10%, tornando a procura externa um motor menos crítico para o crescimento da economia.

 

Além disso, o emprego no sector da indústria e a produção industrial, como percentagem do total, começaram a declinar no ano passado. De facto, no primeiro semestre deste ano, o sector dos serviços foi responsável ??por mais de metade do crescimento económico total. Assim, não é nenhuma surpresa que o excedente em conta corrente da China tenha diminuído rapidamente, de um pico de mais de 10% do PIB, em 2007, para cerca de 2% do PIB nos dias de hoje.

 

Este reequilíbrio ajudou a melhorar a distribuição de rendimentos da China. Na verdade, nos últimos anos, a proporção da força laboral no rendimento nacional tem vindo a aumentar - um reflexo directo da queda da produção e da expansão dos serviços.

 

Isso também significou um maior equilíbrio regional: As províncias costeiras, que produzem mais de 85% das exportações do país, estão a assistir a uma desaceleração mais acentuada, enquanto as províncias do interior têm mantido taxas de crescimento relativamente elevadas. Como resultado, o coeficiente de Gini da China (um índice de desigualdade de 100 pontos, no qual zero significa igualdade absoluta e um, desigualdade absoluta) caiu de 0,52 em 2010 para 0,50 em 2012.

 

São dois os principais factores que estão a impulsionar esta mudança. O primeiro é a queda da procura global, consequência da crise financeira de 2008, que obrigou a China a ajustar o seu modelo de crescimento mais cedo do que o previsto. A segunda é a transformação demográfica em curso na China. A proporção de pessoas com idade para trabalhar (16-65 anos) na população total tem diminuído desde o pico de 72% de 2010. E o número absoluto de pessoas em idade activa tem vindo a diminuir desde 2012.

 

Ao mesmo tempo, a China está a viver um rápido processo de urbanização, com cerca de 200 milhões de pessoas que saíram do sector agrícola entre 2001 e 2008 para procurar empregos nas indústrias urbanas. Mais recentemente, contudo, o ritmo de migração diminuiu substancialmente, com as áreas rurais da China a conservar 35% da força de trabalho total.

 

Tudo isto implica taxas de crescimento menores para a economia da China - embora talvez não tão baixas como as taxas de 6-7% que economistas como Liu Shijing e Cai Fang estão a prever para a próxima década. Basear-se no histórico de crescimento da China para prever o desempenho futuro é inerentemente problemático, devido não só às mudanças importantes na força de trabalho, mas também à velocidade e escala do crescimento pré-2008 da China que não teve precedentes.

 

Para começar, é provável que a contribuição para o crescimento do PIB da proporção crescente de pessoas em idade activa, anterior a 2010, tenha sido superestimada. Isso faz com que o subsequente declínio na proporção seja uma medida imprecisa para determinar o impacto negativo sobre o desempenho económico.

 

Além disso, essa abordagem negligencia os dividendos educacionais de que a China beneficiará durante os próximos 20 anos, à medida que a nova geração substitua os trabalhadores mais velhos. Hoje, a taxa de retorno dos trabalhadores chineses entre os 50 e os 60 anos é metade das pessoas com 20 a 25. Por outras palavras, os jovens trabalhadores serão duas vezes mais produtivos do que aqueles que se estão a reformar neste momento.

 

De facto, o nível de escolaridade na China continua a melhorar. Em 2020, a proporção de pessoas com idade 18-22 a frequentar o ensino superior vai chegar a 40%, em comparação com 32%, actualmente. Esta melhoria no capital humano está destinada a compensar, em certa medida, a perda líquida de mão-de-obra.

 

Além disso, a baixa idade de reforma da China - 50 para as mulheres e 60 para os homens – dá aos responsáveis políticos uma margem de manobra considerável. O aumento da idade da reforma em apenas seis meses em cada um dos próximos dez anos seria mais do que suficiente para compensar o declínio anual da força de trabalho, que será, previsivelmente, de 2,5 milhões de trabalhadores durante este período.

 

Há outras tendências que estão a impulsionar as perspectivas da China. Embora o investimento tenda a cair como proporção do PIB, deverá demorar uma década até cair abaixo de 40% - um nível ainda robusto para os padrões internacionais. Entretanto, o capital social pode manter uma taxa de crescimento razoável.

 

Finalmente, a capacidade de inovação da China está a melhorar constantemente, devido ao rápido aumento do capital humano e dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento. No próximo ano, a despesa em inovação e desenvolvimento, equivalente a 2,2% do PIB, estará a aproximar-se dos níveis dos países avançados.

 

Com base nestas tendências - e assumindo uma taxa de participação laboral constante – a taxa de crescimento potencial da China na próxima década deve situar-se em torno de 6,9-7,6%, com média de 7,27%. Pode ser muito menor do que a taxa de crescimento média de 9,4% entre 1988 e 2013, mas é mais do que suficiente para os padrões globais. Se esta é a "nova normalidade" da China, ainda provocará inveja ao resto do mundo.

 

Yao Yang é reitor da Escola Nacional de Desenvolvimento e director do Centro de Pesquisa Económica da China, da Universidade de Pequim.

 

Direitos de autor: Project Syndicate, 2014.
www.project-syndicate.org

 

Tradução: Rita Faria

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