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19 de Maio de 2014 às 14:05

Os banqueiros de Kermit

Kermit, a sapo da Rua Sésamo (mais conhecido por Cocas), um dia lamentou "não ser fácil ser-se verde". Hoje este sentimento é surpreendentemente relevante para a economia global – mas tornar-se verde é que é o problema.

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Em Setembro do ano passado, o Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas alertou que se o mundo mantiver as actuais políticas, as temperaturas globais podem subir mais de 4ºC – muito para além da subida de 2ºC definida como "segura". Isto levou, em Janeiro, o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, a desafiar os líderes políticos, económicos e financeiros a intensificar os seus esforços para atingir um novo acordo global sobre segurança ambiental até 2015.

 

Porém os importantes acordos de alto-nível deverão resultar em pouco, a menos que sejam apoiados por investimento considerável em áreas como redes inteligentes, armazenamento energético e renováveis. Na verdade, a Agência Internacional de Energia estima que perto de 1 bilião de dólares de investimento será necessário anualmente, entre hoje e 2050, para colocar a economia mundial numa posição mais sustentável.

 

Apesar de parecer muito dinheiro, é somente o equivalente a 1% do PIB mundial e menos de 0,3% dos activos financeiros globais. Além disso, desde 2007 os principais bancos centrais provaram que podem reforçar os seus balanços em mais de 1 bilião de dólares anualmente sem impulsionarem a inflação. Por outras palavras, o mundo consegue suportar a transição para uma economia verde.

 

Apesar disso, no ano passado o investimento verde atingiu apenas 254 mil milhões de dólares – o que implicou uma queda anual de quase 750 mil milhões de dólares. Para suprir esta lacuna, os governos dos países mais desenvolvidos estão a alavancar os seus fundos públicos limitados para catalisar o investimento do sector privado. Ao mesmo tempo, os países em vias de desenvolvimento estão a aumentar rapidamente as suas contribuições para financiamento verde, com financiamentos domésticos para energias limpas em países exteriores à OCDE a ultrapassarem os níveis de 2008 dos países da OCDE.

 

Porém o problema continua a ser a actual estrutura dos mercados que os incapacita de se ajustarem às mudanças climáticas. Aquilo que é verdadeiramente necessário não é dinheiro, mas vontade política para corrigir as deficiências dos mercados, provocando mudanças fundamentais nas métricas, instituições e políticas que influenciam a forma como os investidores avaliam as actividades económicas.

 

Um projecto verde é financiável apenas se puder garantir uma clara visão dos seus reais custos e benefícios. O retorno do capital privado (lucros e perdas), mais o retorno ao nível do capital "social", tem de ser positivo. A actual métrica para o PIB ignora as externalidades negativas das actividades privadas relacionadas com combustíveis baseados em recursos fósseis, derivando em poluição avassaladora e grande desperdício de recursos naturais não-renováveis. Sem contabilizar os custos totais, algumas das piores actividades continuarão a ser tremendamente rentáveis.

 

Uma transição, com sucesso, para uma economia verde vai exigir um novo conjunto de métricas. As boas notícias é que alguns governos já começaram a estabelecer 'custos sombra' para as emissões de CO2. Nos Estados Unidos o "custo social" do carbono foi aumentado de 24 dólares para 37 dólares por tonelada emitida. Publicitar os níveis de partículas-finas (designadas de PM2.5) foi fundamental para a mobilização e difusão do apoio público chinês para o tratamento da poluição do ar. Métricas semelhantes estão agora a ser utilizadas para medir outras formas de destruição do capital natural, como a desflorestação, a descoloração de recifes marinhos, a descarga de águas residuais e a degradação dos solos.

 

Uma vez que estas métricas estejam estabelecidas, necessitam ser incorporadas nas normas internacionais de contabilidade das demonstrações financeiras públicas e privadas. Algumas empresas já emitem relatórios anuais com total detalhe sobre o impacto social e ambiental das suas actividades e irão, eventualmente, avançar em direcção a relatórios totalmente integrados.

 

Mas conseguir mudanças reais vai exigir mais do que persuasão moral. Os legisladores têm de tirar partido da total panóplia de instrumentos à sua disposição, incluindo legislação, orientações, impostos, incentivos e consciencialização da sociedade acerca dos custos da inoperância. Os reguladores financeiros em economias emergentes como o Bangladesh e a China já deram um passo na direcção certa, introduzindo regras para promover a inclusão financeira. As directrizes bancárias sobre créditos verdes na China instam as instituições financeiras a considerar os riscos ambientais nas suas carteiras de crédito.

 

Finalmente é necessária uma discussão honesta sobre os méritos – e limites – das actuais políticas monetárias e regulação financeira. Os subsídios dos bancos centrais como ‘quantitative easing’ e taxas de juro próximas de zero deviam ter aumentado a oferta de financiamento a baixos-custos de projectos verdes. Em vez disso, impulsionaram os lucros de instituições financeiras cada vez maiores, condicionando os créditos para as pequenas e médias empresas e para os projectos a longo prazo.

 

Ironicamente a regulação que visa incrementar a estabilidade financeira tende a premiar o curto-prazo (maior liquidez), acrescentando riscos e custos aos projectos de longo-prazo – a maioria dos investimentos verdes. Os reguladores têm de reconhecer que se a economia real é insustentável, não bastam reformas bancárias para proteger a subsistência das pessoas, quanto mais o sistema financeiro. Acrescentar a exigência de 0,5% de investimento verde seria suficiente para cobrir a lacuna anual de financiamento.

 

A crise global financeira ocorreu porque ignorámos as externalidades – preços-sombra e instituições – permitindo que a instabilidade e a desigualdade proliferassem. Construir um futuro mais estável e sustentável requer políticas, preços e incentivos adequados. Não será fácil, tal como disse Kermit, mas o risco é o de, se não agirmos, sermos cozidos antes de ficar verdes.

 

Andrew Sheng é um ilustre investigador do Fung Global Institute e membro do Conselho Consultivo para Finanças Sustentáveis do Programa das Nações Unidas para o Ambiente (UNEP)

 

Direitos de Autor: Project Syndicate, 2014.
www.project-syndicate.org 

Tradução: David Santiago

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