Opinião
Ucrânia: a instabilidade como método de negócio
Desde Outubro de 2004, a Ucrânia já passou por uma eleição presidencial fraudulenta, a contestação nas ruas, outra votação para afastar o candidato do regime, a entronização de Viktor Yushchenko como chefe de Estado, e duas eleições legislativas inconclus
Os resultados das eleições de domingo em nada alteraram a situação, apesar do partido da antiga primeira-ministra Yulia Tymoshenko ter aumentado em quase dez por cento a sua votação, e o país continua cindido em dois blocos.
Uma eleição sinuosa
A causa próxima das eleições explica muita coisa.
Em Abril, Viktor Yanukovich levou 11 deputados do partido Nossa Ucrânia do presidente Yushchenko a juntarem-se à sua coligação governamental. A dissidência parlamentar colocou o primeiro-ministro perto de conseguir uma maioria de dois terços para bloquear eventuais vetos presidenciais.
Yushchenko ripostou e dissolveu o parlamento, mas uma queixa ao Tribunal Constitucional levou o presidente a rever a sua decisão. Um posterior acordo político entre Yushchenko e Yanukovich redundou na demissão de 150 deputados da oposição de forma a provocar eleições antecipadas que o presidente convocou através de decretos promulgados em Junho e Agosto.
A convocação das eleições foi, no entanto, contestada pelo Partido Socialista, aliado de Yanukovich, aguardando-se ainda uma decisão do Tribunal Constitucional. Dado o Partido Socialista estar em risco de não conseguir os necessários 3 por cento de votos expressos para obter representação parlamentar é de esperar que prossiga a contestação legal.
Do confronto eleitoral sobressaem no imediato a relativa perda de influência do Presidente Yushchenko, que viu os seus poderes reduzidos na revisão constitucional de 2006, a boa sina de Yulia Tymoshenko, ultrapassando as reticências provocadas pelos seus nove meses de governo em 2005, e a persistência do Bloco da Regiões de Yanukovich, sobretudo nas regiões russófonas do sul e leste da Ucrânia.
A partir de agora todas as coligações são possíveis e altamente instáveis.
Yanukovich pode manter-se no poder se contar com o apoio dos comunistas e do bloco centrista do antigo presidente do parlamento Volodymyr Lytvyn.
Tymoshenko tem a forte possibilidade de retomar a chefia do governo, como parceira principal numa coligação com Yushchenko.
Um impasse lucrativo
A relação de forças não permite reformas drásticas e as pressões da Rússia obstam a que Tymoshenko cumpra a sua antiga promessa de rever os contratos de importações de gás natural. Uma eventual aproximação à NATO e o encetar contactos com Bruxelas para uma longínqua negociação de adesão à União Europeia não provocam discussão de maior em Kiev, desde que os interesses russos (e o possível estatuto do russo como segunda língua oficial) sejam precavidos.
A Rússia continua a ser o principal parceiro comercial da Ucrânia e a modernização das obsoletas empresas industriais ainda marca passo, apesar de um crescimento económico superior a 6 por cento, ter proporcionado a estabilidade necessária à elite de negócios que controla o país.
Assim sendo é perfeitamente natural que os principais grupos económicos e financeiros dividam os seus apoios pelos dois blocos políticos.
Do lado de Yanukovitch encontram-se Rinat Akhmetov, o maior potentado do país, e Victor Pintchuk que fez fortuna quando o seu sogro Leonid Kuchma foi presidente.
Tymoshenko é apoiada Konstantin Jevago, presente na banca, nos sectores mineiros e imobiliários, e Igor Kolomoisky que tem interesses da siderurgia aos media.
Yushenkho conta com o financiamento de Piotr Porochenko, do grupo Ukrprominvest, e de empresário industrial Vitali Gaiduk.
Além de a maioria dos oligarcas ucranianos se fazerem eleger para o parlamento de Kiev, a sua influência sobre as estruturas de decisão política é decisiva e não por acaso a Ucrânia surge na listagem de 2007 da Transparency International em 118º lugar num conjunto de 179 países, ainda assim um pouco menos mal do que as vizinhas Rússia (143º) e Belarus (150º).
A cotação em bolsa das principais empresas ucranianas não registou qualquer alteração significativa no rescaldo do esperado impasse eleitoral.
Os grupos económicos e financeiros já jogaram os seus interesses e agora aguardam pela nova ronda de privatizações.
Na Ucrânia, a política anda em conluios muito pouco transparentes com os oligarcas da finança e da indústria.
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