Opinião
Os romeiros
«Romeiro, romeiro! Quem és tu?» O romeiro, apontando com o bordão para o retrato de D. João de Portugal: «Ninguém.»
Anda meio mundo a discutir «A Paixão...» de Mel Gibson e meio Portugal a discutir «...a lucidez» de Saramago. Afinal não estamos mortos.
Afinal, reagimos aos estímulos para além das mensagens minimal-repetitivas das figuras televisivas.
Afinal, pode estar errado quem diz que os «agentes culturais» (as aspas pedem desculpa pelo termo, «artistas» podia soar escarnecedor, sabe-se lá porquê) já não provocam a discussão, a polémica, a pedrada que move a evolução.
Os fantasmas nacionais, as crises de identidade, o sebastianismo, os medos de desejo não estão apenas latentes. Há esperança.
No final, o que conta é a qualidade intrínseca das «obras», convenientemente promovida junto do público. Já não é herético na «cultura» falar de princípios de gestão capitalista: não basta que os «produtos» sejam bons, é necessário que o público saiba que eles existam.
Um exemplo de quem está de fora do vespeiro: é isso que parece estar a acontecer no Teatro Nacional de São João, no Porto, onde encenações de Hamlet, Frei Luís de Sousa ou Inês de Castro (não propriamente temas populares como Amália ou outros Rossios) esgotam salas dias a fio, com reposições, exportações e gerações de públicos jovens, que regressam e regressaram.
Há esperança. Mas esperança não significa redenção. Talvez nem haja sequer safa ao pessimismo.
Mas há agentes e reagentes, projectos de elites para romper como Almada rompeu, que construam e que destruam. Será herético desejar que assim seja também nas empresas?
Afinal, o conservadorismo dá taxas de rentabilidade pouco acima da inflação...