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Opinião
09 de Agosto de 2007 às 13:59

Imbróglios polacos

Quer a coligação de Jaroslaw Kaczynski sobreviva ou naufrague nos rigores de Agosto, são de mau augúrio para as negociações europeias as sucessivas convulsões do executivo polaco e a possibilidade de uma eleição antecipada no Outono.

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A decisão de demitir a 9 de Julho, por suspeitas de corrupção, Andrzej Lepper, vice-primeiro ministro e ministro da Agricultura, colocou Jaroslaw Kaczynski de novo em rota de colisão com os parceiros de extrema-direita: o Partido da Auto-Defesa e a Liga das Famílias Polacas.

Lepper, chefe do Partido da Auto-Defesa, declarou, no fim-de-semana, que colocava à disposição do chefe do governo os cargos dos seus militantes que tutelam os Ministérios do Trabalho e da Construção.

O líder de extrema-direita, dizendo-se alvo de calúnias e perseguições, não anunciou expressamente a demissão dos ministros do Partido da Auto-Defesa, de forma a obrigar Jaroslaw Kaczynski a assumir a responsabilidade pela dissolução da coligação na eventualidade de proceder às exonerações.

A partir de 22 de Agosto, no recomeço dos trabalhos do Parlamento, os 56 deputados do Partido da Auto-Defesa manifestar-se-ão, igualmente, indisponíveis para apoiar o governo que ficará, assim, sem maioria para aprovar o orçamento do Estado.
 
Eleições antecipadas

O Partido da Lei e da Justiça de Jaroslaw Kaczynski conta apenas com 155 dos 460 deputados do Sjem e não pretende repetir a experiência de governo minoritário a que se viu obrigado a recorrer após a vitória nas eleições de Setembro de 2005.

O presidente Lech Kaczynski, padrinho da coligação que em Maio de 2006 substituiu os apoios parlamentares pontuais da extrema-direita por uma participação no executivo, tal como o seu gémeo considera inviável reverter a uma opção de governo minoritário e está disposto a antecipar as eleições previstas para 2009.

A Liga das Famílias Polacas, que conta com 34 deputados, definiu, por sua vez, como condição para manter o partido no executivo a substituição de Jaroslaw Kaczynski, concedendo que o Partido da Lei e da Justiça possa nomear outro primeiro-ministro.

Roman Giertych, o homofóbico líder da Liga, que é vice-primeiro-ministro e tutela a pasta da Educação, parece ter assim decidido arriscar novas eleições para travar a sangria da sua base eleitoral.

As exigências da Liga para aumentos dos salários do professorado e o retorno ao executivo do seu militante Daniel Pawlowiec, vice-ministro para a Integração Europeia demitido o mês passado após acusar a chefe da diplomacia de Varsóvia Anna Fotyga de cedências gravosas nas negociações de Bruxelas, estão também talhadas para inviabilizar qualquer acordo.

Já em Setembro do ano passado, quatro meses após a formação da coligação, o executivo de Jaroslaw Kaczynski esteve à beira do colapso quando Lepper foi demitido por exigir um reforço de dez por cento do orçamento do Estado e por discordar do envio de mais tropas polacas para o Afeganistão.

A discórdia acabou por se resolver em poucas semanas por não convir nem aos populistas de Kaczynski, nem aos dois parceiros de extrema-direita, uma eleição antecipada, mas, presentemente, o chefe do governo está apostado em subir a parada.

Uma disputa à direita

Desde que assumiu a chefia do governo, em Julho do ano passado, Jaroslaw Kaczynski tudo tem feito para secar os apoios dos seus parceiros de governo.

A retórica nacionalista e ultraconservadora de criação de uma “Quarta República” em ruptura com os compromissos do centro-direita e da esquerda que asseguraram a transição pós-comunista, garantiram ao Partido da Lei e da Justiça uma vantagem significativa nas hostes populistas e de extrema-direita.

O Partido da Auto-Defesa, 11 por cento dos votos em 2005, e a Liga das Famílias, 8 por cento há dois anos, caíram significativamente nas sondagens e poderão ter mesmo dificuldade em conseguir ultrapassar a barreira dos 5 por cento para obter representação parlamentar.

As sondagens realizadas antes da última crise na coligação indicavam, no entanto, que será difícil para o Partido de Kaczynski repetir o êxito de 2005.

Na votação desse ano, o Partido Lei e Justiça obteve 27 por cento dos escrutínios, mas os estudos de opinião creditavam-no no mês passado com apenas 22 por cento das intenções de voto.

Uma sondagem, efectuada a 20-22 de Julho e publicada no jornal Rzeczpospolita, dava uma maioria de 34 por cento para a Plataforma Cívica, o partido de centro-direita e orientação democrata-cristã que, em 2005, ficou em segundo lugar com 24 por cento dos escrutínios.

A Plataforma Cívica, liderada por Donald Tusk, derrotado por Lech Kaczynski na segunda volta nas presidenciais de Outubro de 2005, surge como o partido mais bem colocado para eventuais ganhos em eleições antecipadas.

Possíveis avanços da Aliança Democrática de Esquerda, que há dois anos se viu arredada do poder quando a sua votação caiu para apenas 11 por cento, não chegarão para impedir que a Plataforma Cívica surja como o partido ‘pivot’ de futuras coligações governamentais.

Compasso de espera europeu

Na eventualidade, muito previsível, de a coligação de Kaczynski implodir e o parlamento ser dissolvido, estará criada uma situação em que Varsóvia se verá reduzida a um governo de gestão, dificultando tremendamente as negociações para a reforma institucional da União Europeia.

Uma recomposição da coligação obrigaria a concessões tais à extrema-direita que arruinaria qualquer esforço de contenção orçamental e reabriria as hostilidades entre Varsóvia e a maioria dos parceiros da União Europeia.

Uma coligação de Kaczynski com a Plataforma Cívica não apresenta, neste momento, qualquer interesse para a direita moderada que está em alta nas intenções de voto.

Uma campanha em que Bruxelas, a Alemanha, a Rússia e outros demónios, serão apresentados ao eleitorado como bodes expiatórios dos males da Polónia tão pouco se recomenda na fase final de negociação da reforma institucional da União Europeia.

A cimeira de Mafra entre UE e Rússia, marcada para 26 de Outubro, que já se apresentava espinhosa, nada terá a ganhar com o exacerbar das tensões internas na Polónia.

Se das eleições polacas sair alguma solução política que exclua os populistas de direita e a extrema-direita da área governamental, apesar de Lech Kaczysnki se manter na presidência, a maioria dos parceiros europeus dará um suspiro de alívio, mas é ainda demasiado cedo para contemplar a hipótese optimista.

Uma campanha eleitoral na Polónia em que os populistas de Kaczynski e a extrema-direita vão dar tudo por tudo para se manterem na área do poder não será coisa bonita de se ver.

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