Opinião
07 de Fevereiro de 2012 às 23:30
Descubra as diferenças
Portugal não é a Grécia. Mas uma verdade proclamada aos quatro ventos pode não ser suficiente para evitar um desastre se a Grécia não quiser ser mais parecida com Portugal.
Portugal não é a Grécia. Mas uma verdade proclamada aos quatro ventos pode não ser suficiente para evitar um desastre se a Grécia não quiser ser mais parecida com Portugal. E hoje parece ser o dia decisivo para que o primeiro país da Zona Euro a ser alvo de uma operação de resgate mostre, entre o euro e o caos, para que lado quer guinar.
Pode discutir-se se Portugal precisava de ajuda, se a devia ter pedido mais cedo ou se podia ter negociado um pacote de medidas diferente daquele com que se comprometeu. O que parece ser menos controverso é que o País se tem esforçado, desde o arranque das negociações com a troika, para ser levado a sério e cumprir o que ficou escrito em troca do apoio financeiro que lhe está a ser prestado. Esta é uma primeira, e essencial, diferença entre os comportamentos da Grécia e de Portugal em todo o processo.
Tal como sucede agora no caso grego, também Portugal se viu na contingência de ter de negociar a salvação da bancarrota em período pré--eleitoral. Realizou a tarefa com um Governo mandatado para o fazer, ferido de morte em matéria de credibilidade política, mas confortado pelo apoio que lhe foi fornecido pela Presidência da República e pelos dois partidos da oposição que estavam em posição de dar, ao acordo que viesse a ser assinado, as garantias de estabilidade e fiabilidade exigidas pelos credores.
Na Grécia, os três partidos que são fundamentais para que o País possa aceder ao novo pacote de ajuda não se entendem. Negoceiam, protestam, discordam e fornecem aos seus parceiros europeus e aos mercados financeiros o retrato de um navio que se afunda nas águas pantanosas da irresponsabilidade. Os políticos pedem mais tempo, apenas para desperdiçarem ainda mais tempo, com o objectivo prioritário de encontrarem uma forma de sacudirem as culpas pela austeridade que vão ter de anunciar e aplicar. Com euro ou sem ele.
Tudo isto já seria suficiente para se poder arrumar Portugal e a Grécia em prateleiras diversas. Mas há mais. Uma boa parte das medidas com que Atenas se comprometeu quando obteve a primeira ajuda ficaram esquecidas pelo caminho e sobrou a austeridade inconsequente. Em Lisboa, os meses mais recentes têm revelado um cenário passível de ser apreciado, criticado e escrutinado mas, ainda assim, diferente. Duas operações de privatização foram concretizadas, o arrendamento urbano e a legislação laboral foram objecto de propostas de mudança e está em discussão a reforma do mapa judiciário.
O paraíso está garantido? Não. Mas estes são sinais de que o espectáculo grego não é um modelo de comportamento. Transmitem a mensagem de que há determinação para provar que Portugal merecerá ser ajudado enquanto a ajuda for necessária e coloca Portugal a caminho do estatuto de credor de confiança suficiente para poder rever aspectos do acordo com a troika que prejudicam mais a economia do que ajudam.
É o caso evidente do forte travão que se tem verificado no crédito. Em parte, resulta da quebra na actividade. Mas também é produto da correcção apressada da relação entre depósitos e crédito a que os bancos estão obrigados. A questão torna-se mais grave quando o sector empresarial do Estado continua a apresentar necessidades de financiamento elevadas e que precisam de ser limpas. O caso da Carris é exemplar. Os recursos que gera não chegam para pagar os encargos da dívida.
Tudo somado, o resultado é dramático. O dinheiro de que as empresas saudáveis precisam para sustentarem a tesouraria e projectos de crescimento é cada vez mais escasso. E o pouco que há, é tragado pelos alçapões abertos pelo "monstro". A troika parece estar disposta a avaliar a situação. Se Portugal fosse a Grécia, talvez não tivesse a mesma abertura.
joaosilva@negocios.pt
Pode discutir-se se Portugal precisava de ajuda, se a devia ter pedido mais cedo ou se podia ter negociado um pacote de medidas diferente daquele com que se comprometeu. O que parece ser menos controverso é que o País se tem esforçado, desde o arranque das negociações com a troika, para ser levado a sério e cumprir o que ficou escrito em troca do apoio financeiro que lhe está a ser prestado. Esta é uma primeira, e essencial, diferença entre os comportamentos da Grécia e de Portugal em todo o processo.
Na Grécia, os três partidos que são fundamentais para que o País possa aceder ao novo pacote de ajuda não se entendem. Negoceiam, protestam, discordam e fornecem aos seus parceiros europeus e aos mercados financeiros o retrato de um navio que se afunda nas águas pantanosas da irresponsabilidade. Os políticos pedem mais tempo, apenas para desperdiçarem ainda mais tempo, com o objectivo prioritário de encontrarem uma forma de sacudirem as culpas pela austeridade que vão ter de anunciar e aplicar. Com euro ou sem ele.
Tudo isto já seria suficiente para se poder arrumar Portugal e a Grécia em prateleiras diversas. Mas há mais. Uma boa parte das medidas com que Atenas se comprometeu quando obteve a primeira ajuda ficaram esquecidas pelo caminho e sobrou a austeridade inconsequente. Em Lisboa, os meses mais recentes têm revelado um cenário passível de ser apreciado, criticado e escrutinado mas, ainda assim, diferente. Duas operações de privatização foram concretizadas, o arrendamento urbano e a legislação laboral foram objecto de propostas de mudança e está em discussão a reforma do mapa judiciário.
O paraíso está garantido? Não. Mas estes são sinais de que o espectáculo grego não é um modelo de comportamento. Transmitem a mensagem de que há determinação para provar que Portugal merecerá ser ajudado enquanto a ajuda for necessária e coloca Portugal a caminho do estatuto de credor de confiança suficiente para poder rever aspectos do acordo com a troika que prejudicam mais a economia do que ajudam.
É o caso evidente do forte travão que se tem verificado no crédito. Em parte, resulta da quebra na actividade. Mas também é produto da correcção apressada da relação entre depósitos e crédito a que os bancos estão obrigados. A questão torna-se mais grave quando o sector empresarial do Estado continua a apresentar necessidades de financiamento elevadas e que precisam de ser limpas. O caso da Carris é exemplar. Os recursos que gera não chegam para pagar os encargos da dívida.
Tudo somado, o resultado é dramático. O dinheiro de que as empresas saudáveis precisam para sustentarem a tesouraria e projectos de crescimento é cada vez mais escasso. E o pouco que há, é tragado pelos alçapões abertos pelo "monstro". A troika parece estar disposta a avaliar a situação. Se Portugal fosse a Grécia, talvez não tivesse a mesma abertura.
joaosilva@negocios.pt
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