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11 de Setembro de 2012 às 23:30

Carácter de excepção da Europa

E há consenso quanto à ideia de que a estabilidade e prosperidade da União Europeia exigem que o mercado único e as reformas estruturais se implementem nos 27 Estados-membros. A sugerida união bancária ajudaria a separar a capacidade creditícia dos bancos comerciais da dos seus governos. Mas isto não é suficiente.

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A criação da união económica e monetária da Europa é única na História dos Estados soberanos. A Zona Euro constitui uma "sociedade de Estados" de natureza inteiramente nova, que transcende o tradicional conceito westfaliano de soberania.

Tal como as pessoas numa sociedade, os países da Zona Euro são independentes e interdependentes. Podem ter efeitos entre si, tanto positiva como negativamente. A boa governação requer que cada Estado-membro e as instituições da União Europeia cumpram as suas responsabilidades. Acima de tudo, a união económica e monetária significa simplesmente isto: duas uniões, uma monetária e uma económica.

A união monetária da Europa tem funcionado excepcionalmente bem. Desde o lançamento do euro, em 1999, a estabilidade de preços tem sido uma constante e mantém-se agora nos 17 países membros para 332 milhões de pessoas, com uma inflação média anual de apenas 2,03% - melhor do que o registo da Alemanha entre 1955 e 1999. Além disso, a Zona Euro criou 14,5 milhões de novos empregos desde 1999, contra 8,5-9 milhões nos Estados Unidos. Não quero com isto dizer que a Europa não tem um sério problema de desemprego; mas não há uma óbvia inferioridade na Europa: todas as economias avançadas têm de promover a criação de emprego.

Da mesma forma, em termos consolidados, a conta corrente da Zona Euro está equilibrada, o seu rácio dívida/PIB é bastante inferior ao japonês, e o défice anual das suas finanças públicas está bastante abaixo do que se verifica nos EUA, Japão e Reino Unido.

Assim, o euro per se não explica por que motivo é que a Zona Euro se tornou o homem doente da economia global. Para compreendermos isso, temos de ter em conta a debilidade da união económica europeia.

Antes de mais, o Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), destinado a garantir políticas orçamentais sólidas na Zona Euro, nunca foi correctamente implementado. Pelo contrário, em 2003 e 2004, a França, Itália e Alemanha tentaram debilita-lo. A Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e os países de pequena e média dimensão da Zona Euro evitaram que o PEC fosse desmantelado, mas o seu espírito ficou seriamente comprometido.

Por outro lado, a governação na Zona Euro não incluiu a monitorização e a supervisão dos indicadores de competitividade – tendências nos preços e custos nominais nos Estados-membros, bem como desequilíbrios externos dos países dentro da Zona Euro. (Em 2005, muito antes da crise, apelei, em nome do Conselho do BCE, à adequada supervisão de inúmeros indicadores nacionais, incluindo os custos laborais unitários).

Uma terceira fonte de debilidade esteve no facto de não terem sido previstas ferramentas para a gestão de crises aquando da implementação do euro. Para grande parte do mundo, naquele momento, a "negligência benigna" estava na ordem do dia, especialmente nas economias avançadas.

Por último, a elevada correlação entre a capacidade creditícia dos bancos comerciais de um determinado país e a do seu governo cria uma fonte adicional de vulnerabilidade, que é extremamente prejudicial na Zona Euro.

Felizmente, houve grandes progressos, incluindo significativas melhorias no PEC e a introdução do controlo dos indicadores de competitividade e dos desequilíbrios nacionais. Foram apresentadas novas ferramentas para a gestão de crises. E há consenso quanto à ideia de que a estabilidade e prosperidade da União Europeia exigem que o mercado único e as reformas estruturais se implementem nos 27 Estados-membros. A sugerida união bancária ajudaria a separar a capacidade creditícia dos bancos comerciais da dos seus governos.

Mas isto não é suficiente. Em vez de multarem os países que transgridem as regras e que ignoram as recomendações, como seria suposto acontecer com o PEC, o facto é que a Comissão Europeia, o Conselho Europeu e – isto é essencial – o Parlamento Europeu deveriam decidir directamente sobre as medidas a implementar de imediato no país em questão. As políticas orçamentais e outras políticas económicas deveriam ser sujeitas à activação de uma "federação por excepção" na Zona Euro.

A ideia de que partilhar uma moeda única significa também aceitar limites à soberania orçamental não é nova. Uma "federação por excepção" simplesmente recorda as consequências lógicas da ineficácia das multas previstas no âmbito do PEC, e é totalmente coerente com o conceito de subsidiariedade que tem sido aplicado desde a introdução do Pacto de Estabilidade e Crescimento: desde que as políticas económicas nacionais estejam de harmonia com aquilo que está estabelecido, não há sanções.

Talvez o elemento mais importante da "federação por excepção" seja o seu forte enraizamento democrático. A sua activação ficaria sujeita a um processo completamente democrático de tomada de decisões, com uma clara atribuição das responsabilidades políticas. Mais precisamente, as decisões de implementação das medidas propostas pela Comissão – e já aprovadas pelo Conselho – necessitariam de uma aprovação por maioria por parte do Parlamento Europeu – ou seja, os representantes eleitos entre os membros da Zona Euro.

Nestas circunstâncias excepcionais, o Parlamento do país em questão teria a oportunidade de explicar ao Parlamento Europeu por que motivo não podia implementar as recomendações propostas, ao mesmo tempo que o PE poderia explicar por que razão é que a estabilidade e a prosperidade da Zona Euro estariam em jogo. Mas a última palavra pertenceria ao Parlamento Europeu.

No passado, propus a criação de um Ministério das Finanças da Zona Euro, que seria responsável pela activação da federação económica e orçamental quando e onde fosse necessário, e pela gestão das novas ferramentas de gestão de crise, como o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE). Seria também responsável pela supervisão da união bancária e representaria a Zona Euro em todas as instituições financeiras e agrupamentos informais internacionais.

Mas, mais importante ainda, a "federação por excepção" acabaria por deixar de ser uma excepção. O ministro das Finanças seria membro do futuro poder executivo da UE, de par com os restantes ministros responsáveis por outros departamentos federais.

Sob esta perspectiva, a Comissão Europeia pressagia um futuro governo democrático europeu, tal como foi sugerido pelo ministro alemão das Finanças, Wolfgang Schäuble, que propôs instituir um presidente eleito. O Conselho Europeu, entretanto, parece antecipar a futura câmara alta do Parlamento Europeu, com a câmara baixa já eleita por todos os cidadãos da União Europeia.

Estou plenamente consciente da audácia daquilo que estou a propor. Mas os europeus devem aprender as lições do passado recente. Temos de clarificar a natureza daquilo que pode ser feito para garantir que a governação é tão democrática e eficaz como aquilo que é exigido pelas circunstâncias.

Project Syndicate, 2012.
www.project-syndicate.org

Tradução: Carla Pedro

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