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Desilusões

Infelizmente, tenho que confessar que não me parece que a Alemanha tenha uma resposta para a crise do euro, nem razoável do ponto de vista político, nem com hipóteses de sucesso no plano técnico. Merkel quer que o ajustamento dentro da zona do euro seja todo realizado pelos países do Sul.

Havia muita gente que tinha grandes ilusões sobre as eleições alemãs e parece que receberam várias desilusões. Em primeiro lugar, a chanceler estava de tal forma em sintonia com povo alemão que quase conseguiu uma dificílima maioria absoluta, registada pela última vez em 1957, quando o chanceler Adenauer também se opunha a "experiências".

 

Em segundo lugar, parece que deverá formar de novo coligação com o segundo maior partido. Quando esta coligação ocorreu anteriormente, entre 2005 e 2009, foram precisos mais de dois meses de negociações para se chegar a acordo. Neste momento, não deverá ser mais fácil estabelecer os termos do novo governo. Há quem ainda albergue algumas ilusões de que o SPD poderá aliviar a posição alemã. Mas é preciso não esquecer que no único debate televisivo entre os líderes dos dois principais partidos, o líder dos sociais-democratas acusou Merkel de já ter criado uma união de transferências, o que não é verdade.

 

O que é verdade é que desde a reunificação alemã, ocorrida em 1990, que os alemães ocidentais fizeram um união de transferências com o leste alemão e a factura desta união foi muito mais pesada do que lhes tinha sido anunciado e já dura à mais de duas décadas. Ao fim de todo este tempo, instalou-se uma fadiga de solidariedade em relação ao leste alemão, pelo que a disponibilidade do eleitorado germânico para embarcar numa dose muito superior de ajuda, deste vez não para uma parte da Alemanha, mas para todo o Sul da Europa é nula.

 

Por isso, o mais provável é que o novo governo alemão, de grande coligação, siga uma linha semelhante à actualmente seguida. Em consequência disso, já ninguém poderá dizer que Angela Merkel é que não quer ou não faz, vai ter que se passar a perceber que é a Alemanha que não quer.

 

Infelizmente, tenho que confessar que não me parece que a Alemanha tenha uma resposta para a crise do euro, nem razoável do ponto de vista político, nem com hipóteses de sucesso no plano técnico. Merkel quer que o ajustamento dentro da zona do euro seja todo realizado pelos países do Sul, o que não é razoável, porque os excessos de despesa do Sul só aconteceram devido à imprudência dos empréstimos concedidos pelo Norte. Se houve erros de parte a parte, a factura também deve ser partilhada.

 

Mas mesmo que a solução da chanceler fosse politicamente razoável, ela é insuficiente do ponto de vista técnico, porque os ajustamentos conjunturais e estruturais no Sul não corrigem os problemas de arquitectura do euro e estes ela não quer resolver.

 

Isto conduz-nos a uma outra consequência das eleições: o sucesso eleitoral do partido antieuro Alternativa para a Alemanha, que ficou a três décimas de ter assento no Bundestag. Este partido foi criado em 2013 e conseguiu um resultado muito bom, não devendo ficar calado, antes constituindo um foco de perturbação. Até porque no próximo ano há eleições europeias (onde não se aplica o mínimo de 5%) e eleições na Saxónia, Turíngia e Brandeburgo e no passado domingo este partido teve mais de 5% em todos estes estados.

 

Nota: As opiniões expressas no texto são da exclusiva responsabilidade do autor

 

Investigador do Nova Finance Center, Nova School of Business and Economics

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