Opinião
O efeito Pinóquio no governo
A fábula de Pinóquio está cheia de ensinamentos políticos nestes tempos das "fake news". Sonhei que Marcelo era o carpinteiro Gepetto, que Costa era Pinóquio e que o papel de Grilo falante estava reservado para José Magalhães.
Back to basics
Nunca confio numa pessoa por aquilo que ela proclama, mas sim pelos actos que pratica.
Ann Radcliffe
O efeito Pinóquio no governo
A fábula de Pinóquio está cheia de ensinamentos políticos nestes tempos das "fake news". Sonhei que Marcelo era o carpinteiro Gepetto, que Costa era Pinóquio e que o papel de Grilo falante estava reservado para José Magalhães. Cá para mim, o Gepetto da actualidade portuguesa deixa Pinóquio à vontade nas suas brincadeiras: o Governo prometeu que os contribuintes não iriam pagar mais para salvar bancos e está-se a ver o que acontece; Pedro Marques, que era mesmo o maior descendente de Pinóquio do Governo, foi mandado espalhar mentiras no território natural da ilusão que é a União Europeia; João Galamba, seu rival directo no campeonato dos jovens Pinóquios, já está num ministério. E Costa superintende em tudo, sempre com transbordante imaginação e uma cativação orçamental na mão. Para a história ficar completa, José de Magalhães, assume com galhardia o papel de Grilo falante. Magalhães descobriu que o maior perigo das campanhas eleitorais que se sucedem este ano reside no proliferar das "fake news" e propõe-se, no Parlamento, tomar medidas para as combater. Aguardo para ver como irá ensinar Costa, Marques e Galamba a evitarem que os narizes lhes cresçam. Este Grilo vai ter muito que fazer com Pinóquios assim debaixo da sua alçada, à solta pelos ministérios e pela sua própria bancada parlamentar. É que, em matéria de "fake news", o Governo não tem rival.
Dixit
"Ele tinha imensas namoradas."
Fernanda Tadeu
Mulher de António Costa, falando sobre ele, enquanto o marido cozinhava cataplana de peixe no programa de Cristina Ferreira.
Semanada
• No Porto, há senhorios que pressionam os inquilinos, sobretudo os mais idosos, para abandonarem as suas casas, usando métodos que vão de ameaças até cortes de água • o juiz Neto de Moura anunciou ir processar os seus críticos, aproveitando a isenção de taxas de justiça de que pode beneficiar • Tomás Correia pôs em acta que será o Montepio a pagar as multas que lhe foram aplicadas pelo Banco de Portugal, no valor de 1,25 milhões de euros • o Palácio Foz foi utilizado gratuitamente pela Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros para uma festa de Carnaval na qual os colaboradores do primeiro-ministro usaram disfarces - uma mascarou-se de Che Guevara e outro de Donald Trump; no ano passado, o PIB cresceu 2,1%, quando a estimativa do Governo era 2,3% • em 2017, a produtividade caiu 0,2% • nos primeiros dois meses do ano, foi apreendida quase tanta cocaína como no total do ano passado e Portugal está a tornar-se numa das portas de entrada da droga na Europa • os apoios dados pelo Estado aos bancos já atingem um montante de 1.800 euros por cada português • a Escola Básica Patrício Prazeres, em Lisboa, tem 29% de alunos estrangeiros de 22 nacionalidades e há turmas em que são a maioria e têm melhores notas • um coronel que liderou os comandos na altura em que morreram dois instruendos, em 2017, é arguido por falsificação de provas relacionadas com o caso • até à data, não houve ninguém a pedir apoio à linha de crédito criada pelo Governo para ajudar na limpeza de matas e o prazo termina no próximo dia 15.
A paixão das viagens
Tenho um fascínio por literatura de viagens e um dos livros que mais me marcou foi "O Grande Bazar Ferroviário", de Paul Theroux, originalmente editado em 1975 e que, por cá, foi editado em 2008. A Quetzal, que já havia feito a primeira edição portuguesa, lançou agora uma nova colecção, "Terra Incógnita", e escolheu reeditar a obra de Theroux. O formato é próximo do livro de bolso, bom para levar em viagem. O bom livro de viagens não é um roteiro turístico, esse é o princípio inspirador do escritor. Num segundo prefácio a esta sua obra, publicado nesta edição, Theroux conta como o livro nasceu e demarca-se de uma escrita sobre férias e confortos, preferindo contar verdadeiras viagens e relatando o passar do tempo, incluindo os atrasos e os transtornos. "O Grande Bazar Ferroviário" é o relato emocionante que Paul Theroux faz da sua viagem de comboio entre a Europa e a Ásia: "O livro de viagens em que estava vagamente a pensar tinha algo a ver com comboios, mas não fazia ideia de para onde queria ir - a minha ideia era simplesmente uma longa viagem solitária." Partiu de Londres a 19 de setembro de 1973 e lá regressou quatro meses depois, tendo viajado no Expresso do Oriente, ido até Teerão, depois Deli, Kuala Lumpur ou o Transiberiano. Uma aventura que Theroux partilha, descrevendo lugares, culturas e as pessoas que conheceu ao longo dos milhares de quilómetros que percorreu. Como diz Francisco José Viegas na introdução a esta nova edição, "num mundo assim, como ele está, os livros de Theroux continuam a expor o mistério prodigioso de conhecer os outros".
Perguntar não ofende
Que terá acontecido na vida do juiz Neto de Moura que o levou a fazer as considerações que fez e a tomar as decisões que tomou? Com que situações marcantes terá sido pessoalmente confrontado? Em que é que um trauma psicológico pode condicionar a decisão de um juiz?
O olhar de África
Uma das melhores exposições que podem ser vistas em Lisboa está na Galeria Underdogs (Rua Fernando Palha, Armazém 56, em Marvila). "Nha Fala" é o título da exposição que integra 19 marcantes fotografias do guineense Abdel Queta Tavares - onde a influência de nomes incontornáveis da fotografia africana como Seydou Keita ou Malick Sidibé são notórias. "Nha Fala" significa "Minha Voz" em crioulo - e neste caso significa a forma como Abdel Queta Tavares encena o que vê, interpretando personagens e tornando o vulgar em único e indo além das influências em que se poderá ter inspirado. Os preços das obras expostas variam entre os 600 e os 5000 euros. Outras sugestões: no Pavilhão 31, localizado no parque da saúde que funciona onde era o Hospital Júlio de Matos, vive um espaço que concilia a mostra de obras de artistas consagrados com aulas de artes plásticas aos utentes do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa. "Arte de Furtar/ Furto na Arte" inclui obras de Ana Pérez Quiroga, João Louro, José Luís Neto, José Maçãs de Carvalho, Claudia Fischer, Pedro Cabral Santo e Sara e André, entre outros. Na Pequena Galeria (Avenida 24 de Julho 4C), Pauliana Valente Pimentel mostra "A Vida É Feita de Likes", um mero registo do seu quotidiano pessoal feito em Instagram.
O novo pimba
Nunca fui fã do Festival da Eurovisão e não sou dos que acham que aquilo é coisa que valha a pena. Sou mais dos que acham que aquilo tudo é uma foleirice que raras vezes adiantou alguma coisa à música e deixou sons que perdurassem. Também não embandeirei em arco com a cosmética aplicada ao Festival RTP da Canção há uns anos e dedico-lhe pensamentos idênticos aos que acima escrevi sobre a Eurovisão. No caso português, reconheço alguns méritos, sobretudo a Simone de Oliveira há uns anos largos e a Salvador Sobral há pouco tempo. Na generalidade, nestes certames, pratica-se má música, péssima música pop sem imaginação e cheia de pastiches. Este ano, já percebi que existe alguma emoção em torno de Conan Osíris e pessoas que estimo até o acham semelhante a António Variações. Para mim, este novo cançonetista é o contrário do que Variações foi: é um amalgamado de cópias provenientes de diversas origens, é uma construção plastificada, é uma demonstração de falta de talento e de originalidade construída sobre um cenário falso. Fala-se muito de "fake news" - Conan Osíris é "fake music making fake news", uma espécie de banda sonora da mentira. E é a prova de que na vida tudo se transforma - o pimba também.
O olhar de Luísa
Uma das pessoas que melhor tem fotografado os protagonistas das noites lisboetas, nas mais diversas áreas, ao longo das últimas décadas, é Luísa Ferreira. O seu trabalho, no entanto, vai muito para além disto - como se viu recentemente na Galeria Monumental com a exposição "Branco" ou, noutro género, em "Há Quanto Tempo Trabalha Aqui?", sobre lojas históricas de Lisboa. Mas, voltando às pessoas e às noites, Luísa Ferreira tem sido sempre uma persistente observadora de quem foi passando em casas como o Frágil e o Lux, com o acesso que Manuel Reis lhe proporcionou e que ela soube sempre respeitar e enquadrar - são imagens que retratam o espírito do tempo e as mudanças que o mesmo tempo provoca. Desta vez, Luísa Ferreira veio mostrar como olha para quem habita os palcos e, para assinalar o aniversário do Teatro do Bairro (Rua Luz Soriano 63), montou uma mostra de imagens que fez ao longo dos anos e que animaram a festa do referido aniversário. Mas vão poder ser vistas por todos aqueles que lá forem ver a nova produção da companhia, "Terror E Miséria no III Reich", de Bertolt Brecht, que estreia no próximo dia 20 - uma escolha, aliás, oportuna para os tempos que correm.
As imagens que encontrarão nas paredes do Teatro do Bairro integraram a exposição "Ouro Azul", que Luísa Ferreira teve em 1996 na Mitra e também uma outra que mostrou no Teatro Viriato, em Viseu, em 2002, e incluem um conjunto de provas de contacto de trabalhos que fez à volta do teatro e da noite onde ele se desenha.