Opinião
Além da Grécia
Impotentes para impor reformas ou negociar nova reestruturação da dívida, o centro-direita e extrema-esquerda mantêm a Grécia num impasse desde o colapso da alternância entre conservadores e socialistas, base do sistema partidário e do clientelismo de estado criado após a queda da Junta Militar em 1974.
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Os dois escrutínios de 2012, que alcandoraram o "Syriza" a segunda maior força política, deixam antever para a próxima votação a possibilidade de frágeis coligações hegemonizadas pela "Nova Democracia" ou a eventualidade da heteróclita frente de esquerda radical formar governo com pequenos partidos populistas oriundos das alas socialistas e liberais.
A margem de manobra é escassa porque na impossibilidade de se financiar nos mercados para assegurar pagamentos devidos em 2015, Atenas precisa da almofada de segurança do BCE.
A Grécia terá de levar a bom porto as conversações com a UE e o FMI para conclusão em Fevereiro do segundo plano de ajuda de modo a receber uma prestação de 1,8 mil milhões de euros e obter a concessão de mais 10 mil milhões de euros do "Fundo Europeu de Estabilidade".
A devastação
A troika avançou desde 2010 com 240 mil milhões de euros para evitar a bancarrota grega, credores privados aceitaram perdas de 53,5% a 70% e perdoaram mais de 100 mil milhões de euros, passando a deter apenas 27% da dívida, mas a purga de austeridade não gerou ganhos de produtividade ou maior competitividade e deixou um terço da população na pobreza.
Um crescimento de 0,6% em 2014 depois de seis anos de recessão ou um excedente orçamental de 3% do PIB (excluindo serviço de dívida) vão a par de indicadores devastadores: contracção da economia na ordem dos 25% desde 2009, desemprego nos 27% e superior a 50% entre os jovens.
A dívida pública, 177% do PIB, é insustentável, mas negociar moratórias ou perdões parciais implica transferir custos para os demais estados da eurozona, o BCE e o "Mecanismo Europeu de Estabilidade".
Se à direita ou pelo lado da esquerda radical não forem apresentadas contrapartidas credíveis, designadamente através da concretização de privatizações, reforma fiscal e reestruturação da administração pública, os credores (estados e instituições internacionais) dificilmente poderão continuar a financiar a Grécia.
Contágio político
Um perdão parcial da dívida (cujo serviço equivale a 5% do PIB grego) e/ou desagravamento de limitações orçamentais é também dificilmente negociável porque terá de ter em conta compromissos diversos de equilíbrio orçamental de estados como a França ou a situação de países fortemente endividados como a Itália, Portugal ou Chipre.
Entre a anemia económica e a deflação, pesam-se os riscos políticos e financeiros de sustentar a fundo perdido por tempo indeterminado a manutenção da Grécia no euro ou optar pela sua exclusão.
As eleições britânicas de Maio, passíveis de levarem a um referendo sobre a permanência do Reino Unidos na UE em caso de vitória conservadora, complicam, igualmente, a negociação de concessões financeiras a Atenas por parte dos demais 18 estados do euro.
Alexis Tsipras pretende uma renegociação nos moldes da conferência internacional de Londres de 1953 sobre a dívida da República Federal Alemã, mas a geopolítica de 2015 é bem diferente e a estratégia de intervenção do BCE para compra de dívida pública arrisca ser posta em causa por nova crise grega.
A troco de coisa nenhuma
Na Alemanha, cuja metade ocidental beneficiou efectivamente do Plano Marshal e do perdão das dívidas contraídas após a I Guerra Mundial (reduzidas para menos de metade: 15 mil milhões de marcos a pagar em 30 anos), prevalece a ortodoxia de superavit da balança de pagamentos e equilíbrio orçamental, que agrava as assimetrias da Zona Euro.
Angela Merkel terá, contudo, de levar em contas as objecções dos aliados sociais-democratas -- predispostos a negociar compromissos com futuros governos em Atenas a troco de garantias de não agravamento de défices orçamentais -- sem abrir caminho à propaganda anti-euro da "Alternativa para a Alemanha".
Para a "Frente Nacional" de Marine Le Pen a exclusão da Grécia ou cedências dos parceiros do euro redundarão em qualquer caso em trunfo político contra conservadores e socialistas.
Por dois anos e meio o governo de Antonis Samaras procrastinou e iludiu decisões difíceis, mas, chegada a 2015, a Grécia, dividida entre conservadores e a esquerda radical, está em vias de confirmar a falta de condições políticas internas para acordar com os parceiros do euro um programa para manutenção do país na moeda única.
Jornalista