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A muralha de aço

Ainda não sabem o que esperar do novo líder do PSD: se ele vai usar a força da ameaça, ou só ameaça com a força do seu poder.

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As pateadas são o sal dos espectáculos de ópera. São um direito, a que nem escapou a divina Maria Callas, a quem arremessaram ovos no Scala de Milão. No Parlamento português, versão mais enfezada do Scala, não se costumam patear sopranos e barítonos políticos. Seja por receio, seja por caridade. A prestação de Fernando Negrão no debate com o Governo exemplificou este dilema: teve elogios governamentais e palmas pífias dos deputados do PSD. Mas, após este momento de frio siberiano, Negrão e os deputados reuniram-se, aparentemente olhos nos olhos, e disseram tudo o que lhes ia na alma. A "catarse", na expressão de Negrão, deve ter sido uma espécie de cerimónia vudu, com todo o tipo de tremuras, convulsões e experiências paranormais. Mas, segundo o líder parlamentar, o resultado foi positivo: Belzebu foi expulso das almas penadas e agora o grupo está unido à volta dos superiores interesses do partido. Ou seja, colou-se o que estava esfrangalhado, mas não foi informado qual a qualidade da cola utilizada. Se cola tudo ou se só cala emoções mais fortes.

 

Como se sabe, na política e noutras coisas, os acordos firmam-se quando os custos (seja a gestão, seja as consequências) dos desacordos são superiores ao benefício de os manter. Esta equação deve ter estado presente na mente dos deputados do PSD, por muito que detestem Rui Rio e tenham uma atitude de santa paciência com Fernando Negrão. Ainda não sabem o que esperar do novo líder do PSD: se ele vai usar a força da ameaça, ou só ameaça com a força do seu poder. Não se sabe se Rio segue os princípios que sempre deram a vitória a Angela Merkel: a dilação, a inacção e a dúvida antes de actuar, esperando sempre até ao último minuto. Este jogo político, sabe-se, é sempre perigoso porque imprevisível. Negrão pode hoje pedir desculpas, os deputados podem calar o seu desdém, mas esta é uma paz aparente. Da reunião não saiu uma versão eufórica do velho hino de 1975: "Força, força, companheiro Vasco/Nós seremos a muralha de aço." Na altura, isso não resultou. Agora também não vai resultar.

 

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