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20 de Março de 2017 às 19:52

Operação Carne Fraca 

Vilões e monstros são conceitos que se misturam quando olhamos o mundo pela lente da narrativa. Mas não querem dizer exatamente o mesmo.

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Na Idade Média, o vilão era um servo de uma casta mais próxima do senhor feudal. O vilão tinha regalias, menos deveres. Não gozava da simpatia de quem estava abaixo nem do respeito de quem estava acima. Lutava para subir (e não cair) na pirâmide social. Com o tempo tornou-se sinónimo de alguém ardiloso, invejoso, ressentido, ressabiado, cheio de esquemas.

 

Já os monstros são as representações fantásticas do mal. A Hidra de Lerna, por exemplo, era um monstro dono de um veneno tão poderoso que matava homens apenas com o seu hálito. Quando Hércules cortava a cabeça da Hidra surgiam duas no lugar.

 

Darth Vader, segundo um levantamento do American Film Institute, é considerado o maior vilão do cinema de todos os tempos. Na literatura, temos Drácula, Iago (de "Otelo, o Mouro de Veneza") ou Mr. Hyde, o asqueroso outro lado da moeda do Dr. Jekyll.

 

Desde tempos ancestrais que monstros e vilões frequentam as nossas vidas, transformando os nossos sonhos em pesadelos.

 

Mas, creio, os vilões que mais assustam as sociedades modernas são os corporativos.

Tememos ser devorados por hidras e dragões mascarados de empresas.

 

Na semana passada, estourou (mais) um grande escândalo no Brasil. Numa mega-ação (intitulada Carne Fraca) deflagrada pela polícia federal brasileira, as duas maiores empresas de carne do mundo (os frigoríficos JBS e BRF) viram-se expostas numa trama terrível, envolvendo venda de produto adulterado e fora do prazo de validade.

 

Foi um vexame de dimensões monumentais, as duas empresa caíram (JBS: 11% e BRF: 7,5%) na bolsa de valores, acumulando prejuízos de centenas de milhões de dólares.

 

Pior: a mancha de reputação está a ganhar uma dimensão nunca vista. Muito porque as administrações dessas empresas não perceberam que, ao investir em reforçar a visibilidade das suas marcas, sem zelar pela qualidade dos seus produtos, estariam a dar tiros nos próprios pés.

Diferente do que acontece em Portugal, o setor de carnes no Brasil tornou-se na última década em grande anunciantes. Criou-se até a carne de vaca de marca, o talho que vende carne Friboi (da JBS).

 

O slogan da Friboi é "Carne confiável tem nome". O simpático ator Tony Ramos é a personalidade que dava a cara pela marca. É fácil imaginar a quantidade de memes que surgiram a detonar o marketing da empresa. Hoje em dia, mesmo sem motivos é fácil transformar uma empresa em vilã. Com motivos, então...

 

Parte da nossa atração pela figura tem a ver com o facto de que o vilão é tão vital numa narrativa quanto o herói. Rebatizados de Antagonista e Protagonista, são dos seus embates que surge a energia que move qualquer história. Quanto melhor o vilão, maior será a nossa torcida pelo mocinho.

 

O vilão é aquele que nos quer mal. No limite, nos quer matar de uma maneira cruel e indigna. Vendendo carne podre, por exemplo.

 

Ou como diria o meu Tio Olavo: "Pela boca morre o boi, digo, o peixe".

 

Publicitário e Storyteller

 

Artigo em conformidade com o novo Acordo Ortográfico 

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