Opinião
A diferença não está só no sotaque
O mercado norte-americano continua a ser um "bicho-de-sete-cabeças" para as empresas de retalho britânicas.
No passado dia 10, o grupo Tesco anunciou que tinha chegado a acordo para a sua saída do mercado americano, vendendo os seus supermercados Fresh and Easy ao veículo de investimento Yucaipa, pertencente ao bilionário Ron Burkle.
Os termos finais do acordo estipularam a venda de 150 das 200 lojas que a cadeia sedeada na Califórnia possuía. A Yucaipa não pagará nada pelas lojas, assumindo apenas o passivo da Fresh and Easy. Para o Tesco, esta transacção ainda terá um custo adicional de 150 milhões de libras, repartidos por um empréstimo de 80 milhões à "nova" empresa e 70 milhões relacionados com os custos do encerramento de 50 lojas e o despedimento de cerca de 1000 trabalhadores.
Contas feitas, o Tesco investiu desde 2007 cerca de mil milhões de libras, num negócio que nunca deu lucros e que em Abril anunciou perdas de outras mil milhões de libras. Com este falhanço, juntou-se à lista de retalhistas britânicos que fizeram a sua entrada neste mercado e viram o "sonho americano" transformar-se rapidamente em pesadelo, onde estão incluídos os supermercados Sainsbury e Marks and Spencer, a livraria WH Smith, e os retalhistas electrónicos Dixons e HMV.
Contudo, nem todas as empresas europeias de retalho que procuraram o mercado dos Estados Unidos falharam. Há casos de sucesso, como o ALDI e o Trader Joe’s, ambos pertencentes à mesma família alemã, que contam actualmente com mais de 1500 lojas. O triunfo destes retalhistas pode ser visto como um incentivo para que outras empresas europeias apostem no mercado do retalho norte-americano como forma de crescimento. Empresas essas onde se podem incluir as portuguesas Jerónimo Martins e SONAE. Será que um dia encontraremos uma das "nossas" cadeias em território norte-americano? Ou será descabido pensar em tal coisa?
No final, podemos concluir que ter sucesso neste mercado não é algo impossível. O que fica é a impressão que o insucesso no mercado retalhista norte-americano é cada vez mais uma característica das empresas britânicas. Talvez se deva a uma falsa percepção de que as características são as mesmas e que aquilo que os consumidores dos Estados Unidos querem encontrar nas lojas é o mesmo que os consumidores do Reino Unido procuram. A principal ideia que o Tesco e as outras empresas britânicas devem reter é que apesar das semelhanças culturais existentes, a diferença não está só no sotaque.
* Membro do Nova Investment Club