Opinião
Esperar resultados diferentes fazendo sempre igual
Se Portugal não crescer 4%/ano, as taxas de juro não estabilizarem em 4.5% e o saldo primário não rondar 3.2% do PIB, a dívida pública não regressará a 85% do PIB em 2030 como o FMI vaticina. Perante este cenário, emerge a discussão da renegociação de dívida, seguida de uma multiplicidade de exemplos
A dinâmica da dívida pública depende, fundamentalmente, de três factores: a taxa de juro, o crescimento económico e o saldo público primário (receitas – despesas excluindo juros). Em 2012, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), a dívida pública atingirá 119.1% do Produto Interno Bruto (PIB), observando um máximo histórico de 123.7% do PIB em 2013. O posterior declínio da dívida baseia-se num cenário de longo prazo com taxas de juros superiores a 4.5%. Em 2010, atingiu-se a taxa mínima histórica de 3.6% para um prazo médio de 5.8 anos; mas, em 2011, subiram para 4.3%. Este ano, a taxa de juro voltou a reduzir-se para 4.1% e a maturidade média a aumentar (7 anos) devido ao apoio financeiro internacional. A taxa média dos empréstimos oficiais até Outubro último encontrava-se em 3.6% para uma maturidade média de 11 anos.
Em termos de crescimento económico, o FMI apresenta uma projecção de crescimento médio nominal de longo prazo de 4% (real: 2%, que compara com cerca de 0.4% entre 2002 e 2011). O nível de taxas de juro superior a 4.5% obriga, então, à obtenção de um saldo primário de 3.2% do PIB. A sustentabilidade da dívida pública exige receitas públicas em excesso das despesas (sem juros) de 3.2 p.p. do PIB. Este facto é inédito, pelo menos desde 1974.
Em 2007 (antes da crise financeira), a despesa primária portuguesa situava-se em 41.4% do PIB, em linha com a média da área do euro (43.1%). Contudo, desde 1995, havia registado um incremento de 5.1 p.p. do PIB que compara com uma queda de 4.6 p.p. do PIB na UEM. O acréscimo das prestações sociais em Portugal nesse período correspondeu a 4 p.p. do PIB. As receitas públicas, também em 2007, em Portugal, atingiam 41% do PIB que compara com 45.4% na UEM. Novamente, entre 1995 e 2007, a variação das receitas totais em Portugal ascendeu a 4.6 p.p. do PIB face à estabilidade na área do euro. Na comparação europeia, destaca-se sobretudo a evolução contracorrente das contas públicas portuguesas, em parte pelo fortalecimento do Estado Social e pelo envelhecimento da população. Mais recentemente, se, no que concerne à despesa, relevam os avanços com a reforma da Segurança Social de 2007, importa não esquecer que a população portuguesa com mais de 60 anos passou de 14% do total em 1971 para 25% em 2011. Pelo lado da receita, saliente-se que, de acordo com dados da Autoridade Tributária (2010), constata-se que, cerca de 5% dos agregados que prestam declarações de rendimento (18% do rendimento bruto declarado) assumem 35% do valor liquidado de IRS. Para estes agregados, estima-se um rendimento bruto médio mensal de 5500 euros.
Se Portugal não crescer 4%/ano, as taxas de juro não estabilizarem em 4.5% e o saldo primário não rondar 3.2% do PIB, a dívida pública não regressará a 85% do PIB em 2030 como o FMI vaticina. Perante este cenário, emerge a discussão da renegociação de dívida, seguida de uma multiplicidade de exemplos. Da América Latina, surgem bons exemplos, como o Uruguai ou o Brasil, e maus exemplos, como a Argentina. O que os distingue? A existência de pré-condições para o sucesso: um nível de crescimento económico sustentavelmente superior à taxa de juro paga e um saldo primário estruturalmente positivo. Na Grécia ou Islândia, a preponderância destes factores para o sucesso é evidente. Sem os países alterarem o seu funcionamento, evoluindo da matriz do passado, rompendo atavismos, com ou sem renegociação de dívida, não conseguirão avançar. Uma lição das recentes crises de dívida foi a vontade própria inequívoca de superar a crise, ganhando flexibilidade e abertura à concorrência, fazendo as coisas de uma forma diferente.