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Opinião
25 de Maio de 2018 às 13:00

Folha de assentos

Atravessámos a semana celebrando a vida e a lucidez de Eduardo Lourenço. «Só temos passado à nossa disposição. É com ele que imaginamos o futuro» - dizia por alturas da Expo'98. Uma inspiração que abriu, mais uma vez, Portugal ao mundo. Celebração e memória num tempo pintado com a ironia de Júlio Pomar.

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respostas. Mais um congresso socialista sem liderança para escolher, importaria que daí saísse mais do que a consagração de António Costa. Já se anunciou que se olhará para o futuro, o que faz todo o sentido, até porque há eleições na vigência dos novos mandatos. Como chegar lá? Que fazer, que mudar, para que o País seja sustentável e possa resistir a percalços internos e externos? Que ideias para as questões mais críticas do nosso tempo: envelhecimento, demografia, saúde, desigualdades, alterações climáticas, crescimento, digital… Que compromissos políticos construir até às eleições? Que ideias para uma Europa em transformação? São muitos os problemas e desafios. Talvez o molde congressista não seja o mais adequado para grandes aprofundamentos, mas seria estranho que a discussão lhe passe ao lado. Tão estranho como não fazer o balanço desta solução política que tornou possível este Governo ou ignorar os erros de governações passadas, mas que conduziram a suspeições e acusações graves no presente. Um balanço e perspectivas que exigem respostas aos erros, aos problemas e às desconfianças em aberto. 

desassombro. A morte costuma arredondar as arestas dos homens. Não é o caso de António Arnaut. O desassombro, a determinação e a clareza guiaram-no até ao fim. Não foi de adaptações e flexibilidades. Sabia o que queria e não se esforçou por ser conveniente. Por isso, não é preciso ornamentar as palavras e a memória. Advogado, militou na Acção Socialista Portuguesa desde 1966 e depois foi um dos fundadores do PS, na Alemanha. Em 78, ministro dos Assuntos Sociais, surpreendeu os seus pares ao assinar o despacho que deu origem ao Serviço Nacional de Saúde. "Foi uma decisão monumental. Apanhei-me ministro sem querer, tinha a caneta na mão e escrevi aquele despacho", diria muitos anos depois aos autores da sua biografia. Rapidamente se desiludiu da actividade partidária. "Deixei a política activa por ter sentido, dolorosamente, que o contorcionismo e a flexibilidade de carácter eram a cartilha dominante". Nunca deixou a política e a acção cívica. Foi um exemplo. Ergueu a voz quando foi preciso, mas sem contorcionismo. Até ao fim, zelou pela saúde pública e deixou um alerta: "É preciso reconduzir o SNS à sua matriz constitucional e humanista". Saibamos honrar a sua memória. 

expo. 20 anos depois, a Exposição Internacional de Lisboa deixou marcas fortes na cidade e no País. Olhou os oceanos a partir do Tejo e recuperou uma vasta área degradada. Criou infraestruturas de grande qualidade e, sobretudo, abriu a cidade ao mundo. Não se limitou a acrescentar pavilhões efémeros, fê-lo de forma sustentada, deixando futuro para a cidade. Construiu urbe, cosmopolita, que todos sentiram e sentem como sua. Dos espaços verdes à comunhão com o rio, do Oceanário ao Pavilhão do Conhecimento, ficou muito para o nosso usufruto. Mas a Expo foi mais do que isso. Foi uma abertura aos outros, à diversidade, um ambiente de modernidade e um orgulho, que caíram fundo em todos os que por lá passaram. Não foi por acaso que, no último dia da Exposição, muitos deixaram lágrimas na despedida. Não foi por acaso que o saber adquirido foi requisitado mundo fora. 20 anos passados, a cidade ganhou ali 30 mil moradores e outros tantos empregos. Houve negócios duvidosos, atrasos, demissões, mas o balanço foi largamente positivo. Os portugueses gostaram de ser rever na Expo.

itália. Sopram ventos preocupantes na Europa. Não é novidade, mas, como notou Teresa de Sousa (Público), em Itália atingiu-se um novo patamar na crise que atravessa a Europa. O populismo de esquerda entendeu-se com a extrema-direita nacionalista num país fundador da CEE e do Euro, membro do G7 e da NATO. O Movimento 5 Estrelas e a Liga são muito críticos do projecto europeu. Estão de acordo no repatriamento de meio milhão de imigrantes, no bloqueio aos desembarques, na promessa de rendimentos básicos generalizados e no olhar para a Rússia como parceiro privilegiado. O descrédito de governações sucessivas, a falência de partidos históricos e o vazio entretanto criado, abriram espaço a velhos e novos demagogos. Até Berlusconi foi reabilitado. A economia e as finanças italianas já conheceram melhores dias. Apesar dos desvarios, é conhecida a resiliência dos italianos e, também por isso, não virá aí necessariamente o descalabro. Mas há muito ressentimento, frustração e amargura acumulados, que abriram portas a populismos e nacionalismos. Áustria, Hungria, Polónia, República Checa e agora a Itália estão a desafiar as democracias e a Europa, como a conhecemos nas últimas décadas. A caminho do Brexit, as notícias não podiam ser mais assustadoras. 

venezuela. Nicolás Maduro está apostado em levar a Venezuela à ruína absoluta. Manipulou as regras constitucionais e as eleições, limitou as liberdades, prendeu oposicionistas, desrespeitou o estado de direito e privou os seus compatriotas de dignidade e sustento. As eleições de domingo foram fraudulentas, interna e externamente reconhecidas como tal. Quase metade dos eleitores não votaram, apesar das cadernetas patrióticas com dinheiro. Não foi a primeira vez que Maduro sabotou a ordem democrática. Em 2015, depois de uma derrota nas legislativas, esvaziou os seus poderes e preparou o terreno para perpetuar o chavismo sem Chaves. Ao mesmo tempo que aumentou a repressão cresceu o isolamento internacional. Muitos tentam fugir à desgraça e procuram refúgio noutros países. Degradaram-se muito as condições de sobrevivência. Basta olhar para o desemprego, que atinge um terço da população, ou para a inflação que este ano andará pelos 13 mil % ao ano! Pior é difícil, mas Maduro está a fazer por isso. 

alto. O Bairro Alto de Lisboa foi e é bairro de muitas artes e mesteres. Também foi o bairro dos jornais. O jornalista e professor Paulo Martins contabilizou 600 títulos que aí foram publicados. Hoje, de papel, resta apenas A Bola. Contar histórias da longa história dos jornais no Bairro Alto foi o empreendimento a que se propôs Paulo Martins. O resultado é "O Bairro dos Jornais" (Quetzal), que acaba de ser publicado e constitui a mais completa obra sobre uma fatia importante da memória da imprensa portuguesa. Appio Sottomayor, no prefácio, chama-lhe "bíblia da Imprensa na sua pátria do Bairro Alto". Pelas redações que aí se instalaram passaram muitas intrigas e conspirações. Diz o autor: "Foram cercadas, invadidas pela polícia, atacadas por turbas de populares, inclusive à bomba. Entre os jornalistas, quantas vezes militantes de causas, forjaram-se solidariedades capazes de se sobreporem a opções políticas. Mas também germinaram zangas dirimidas em duelos ou que redundaram na criação de publicações rivais". Muita da nossa história foi escrita no Bairro Alto. Que não se perca! 


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