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Miguel Pina e Cunha: Ninguém aprende a gerir sem gerir

A gestão não é uma ciência, nem uma arte, é uma prática: aprende-se praticando e reflectindo sobre o que se pratica. "É um exercício inteligente e sensato de tomadas de decisão", afirma António Horta Osório, CEO do Lloyd's Bank.

27 de Maio de 2015 às 11:40
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Miguel Pina e Cunha, professor na Nova Business School: os gestores devem experimentar, testar e melhorar. 


Fraca qualidade de gestão e ausência de separação clara entre gestão e propriedade, deficiente organização interna e ausência de visão estratégica, ausência de escala e elevada fragmentação, referiu Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, numa conferência 6 de Outubro de 2014.

Este requisitório colocava a gestão portuguesa sob suspeita, mas afinal como é que se aprende a ser gestor? "Aprende-se de várias maneiras: praticando, pensando no que se pratica e educando-nos a nós e aos outros. Na parte da educação aprendemos nas escolas, lendo e procurando evidência científica. É comum os médicos lerem revistas científicas. Talvez os gestores possam fazer o mesmo. E podem viajar, estar atentos e ser criativos. Experimentar, testar e melhorar" refere Miguel Pina e Cunha, professor na Nova Business School. Soledade Carvalho Duarte, managing partner da Invesco Transearch, concorda que se aprende "com a aquisição de um conjunto de técnicas, experiências e práticas que se adquirem quer nas escolas de gestão quer pela exposição às boas práticas de algumas empresas, integrando-as no dia-a-dia de trabalho".

Em resumo, ninguém aprende a gerir sem gerir. Numa análise ao processo de formação de gestores numa empresa brasileira a Braskem, maior produtora de resinas termoplástica das Américas. Nesse inquérito a maioria considerava que tinha aprendido sobretudo na actuação como "dono do negócio" e na relação líder-liderado, seguindo-se depois a partilha de experiências entre os pares e superiores e finalmente os programas de formação.

Os gestores nascem ou fazem-se?
"Na verdade, a gestão é uma prática: aprende-se praticando e reflectindo sobre o que se pratica. A noção de 'reflexive practitioner', do Donald Schon pode ser útil para compreender esta matéria" reforça Miguel Pina e Cunha. Como adianta o investigador e docente, há uma certa dialéctica entre a prática e o conhecimento. Por isso, "da mesma forma que a experiência não substitui o conhecimento sistemático, também este não pode ser substituído por aquela.

A prática é particularmente poderosa para estimular o conhecimento tácito. A formação serve para explicitar, pensar, questionar, adquirir conhecimento explícito. De novo: ambos relevam" sentencia Miguel Pina e Cunha. A executive search, Soledade Carvalho Duarte, acentua a necessidade de o gestor estar atento aos sinais à sua volta e do mundo. Refere que "esta aprendizagem é contínua e será tanto mais frutuosa quanto a capacidade para absorver conhecimentos e os contrastar com a prática do dia-a-dia. Um gestor fará tanto melhor o seu trabalho quanto mais for capaz de fazer uma leitura atenta do meio onde está inserido, adaptar e ajustar o seu 'modus operandi'. Não ter medo de assumir que errou e que tem de corrigir a trajectória; aconselhar-se com quem tem uma vivência dos temas de gestão mais madura e, fundamentalmente, saber ouvir".

Aprender a ser gestor é uma experiência transformadora e um processo de aprendizagem difícil e desgastante com poucos atalhos e nenhuma solução rápida. Até porque normalmente se passa de instrumentista a chefe de orquestra e esta transformação não é fácil.

Como escreveu Linda Hill em "Aprender a Ser Gestor", "os gestores em início de carreira têm de desaprender as atitudes profundamente enraizadas que desenvolveram quando eram responsáveis apenas pelo próprio desempenho". Normalmente implica, segundo a professora na Harvard Business School, "que os indivíduos se empenhem em cada um dos três tipos fundamentais de aprendizagem: aprender algo de novo (desenvolvimento de competências técnicas, humanas e cognitivas necessárias para aprenderem a ser gestores eficazes), alterar a sua mentalidade e mudar-se a si próprio".

O gestor António Horta Osório, CEO do Lloyd's Bank, escreveu uma vez, dirigindo-se aos jovens gestores que "a gestão não é uma ciência, nem uma arte, é um exercício inteligente e sensato de tomadas de decisão, sempre com informação incompleta (ao contrário dos exames na universidade), que terás de fazer ao percorrer o teu próprio caminho, e em que chegarás mais longe se te esforçares mais e se estiveres sempre mais bem preparado".


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Aprendiz de tudo, mestre de nada

Existe a crença de que gestão e liderança não podem ser aprendidas. E de que são coisas diferentes. A gestão lida com a complexidade e a liderança com a mudança.

É importante saber o que é ser gestor. Richard Barker, que foi director de MBA da Cambridge University, definiu o gestor como "pau para toda a obra" ou, seguindo o ditado espanhol, "aprendiz de tudo, mestre de nada", referindo que a função do "gestor é geral, variável e indefinível". Henry Minztberg fez um trabalho em 1973 sobre o quotidiano dos gestores que deu origem ao livro "The Nature of Managerial Work" e em 2003 voltou ao tema em "Managing". Como referiu numa entrevista à revista brasileira Época, "em 1973, descrevi a gestão como algo muito agitado, com muitas interrupções, actividades muito breves e muito orientadas à acção. Vemos a mesma coisa hoje, embora o e-mail torne a situação pior. Ele pode levar alguns gestores para a beira do abismo, porque perdem o controlo. Mas a natureza do trabalho não mudou."

Existe a crença de que a gestão, mas sobretudo a liderança não pode ser aprendida. Confunde-se liderança com carisma em que os líderes das empresas são pessoas extraordinárias com talentos inatos como estrelas que caminham sobre a água, mas como diz Rosabeth Moss Kanter se olharmos bem vemos as colunas de pedra a segurar o indivíduo como as experiências passadas e os mentores. Porém, por exemplo, para Belmiro de Azevedo, "a gestão nada tem de misterioso. É uma arte simples, que se reduz a bom senso, mais boa formação, mais boa informação. E, sobretudo, o que conta é o bom senso".

A diferença entre liderança e gestão foi de certo modo gerada por Peter Drucker, o pai do management moderno, quando disse que "os gestores fazem as coisas bem enquanto os líderes fazem as coisas certas." A abordagem de John Kotter permite que se olhe para a liderança e a gestão como dois sistemas distintos e complementares de acção, que tem a sua própria função e actividades características. A gestão lida com a complexidade, a liderança com a mudança. É esta a dificuldade da gestão. 

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