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Fernando Neves de Almeida, presidente da Boyden Portugal, acredita que em qualquer área "os melhores são escassos".
Os bons gestores jogam damas enquanto os grandes gestores praticam xadrez, dizia Marcus Buckingham, num artigo de 2005 da Harvard Business Review. Explicava que no jogo de damas as peças são uniformes e movem-se da mesma maneira, são intermutáveis. Exigem um plano e coordenação de movimentos mas as pedras movem-se ao mesmo ritmo e em caminhos paralelos. No xadrez, os movimentos das peças são mais complexos, não podendo ser mexidas sem se conhecer a regra como cada peça se move. Tem de se pensar como cada jogada se repercute nas outras peças e no jogo e, por isso, tem de ter planos coordenados.
A gestão é muitas vezes vista como uma questão de talento do CEO mas há quem refira que a gestão é um conceito mais amplo do que simplesmente a soma dos átomos de capital humano do empreendedor e dos funcionários, chamando a atenção para a cultura de organização das empresas.
As competências dos gestores (e claro de todos os trabalhadores) são importantes para o desempenho da empresa e são o factor que, por vezes, faz a diferença entre as empresas bem geridas e as outras.
Mesmo sabendo-se que uma boa orquestra se faz de bons músicos, o maestro também é importante. Hoje o "check list" exigido do bom gestor implica múltiplas competências. Como refere Mariana Branquinho, partner da Heidrick & Struggles, "falamos de pessoas que têm que ser adaptáveis, resilientes, flexíveis, humildes, que saibam comunicar, demonstrando capacidade de escuta, transparência, autenticidade, entre outras".
Mariana Branquinho refere que, hoje, "a essência do perfil do CEO é a mesma, independentemente da geografia", o que se procura são "pessoas com capacidade de ter um pensamento sistémico (incorporando as várias dimensões da organização e do meio envolvente), capacidade para aceitar e gerir a mudança, capaz de ser humano e autêntico, sentindo-se confortável num meio que é complexo, incerto e que está em constante mudança". Por outro lado, refere que "o que é diferente em Portugal é a escala e complexidade das organizações, que é menor quando comparadas com outros mercados. Como resultado, em Portugal, um CEO acaba por ter que 'tocar' mais instrumentos, e por isso talvez ter de ser mais polivalente, mas a essência do perfil é semelhante".
Estas exigências fazem do grande gestor uma raridade. É aqui que surge a questão de senso comum da guerra pelo talento, e que nos anos 1990 a Mckinsey colocou na ordem do dia. "Se os grandes gestores parecem escassos é porque o talento requerido para o ser é uma coisa rara. Uma pesquisa da Gallup revela que só uma em cada dez pessoas tem talento para gerir" referia-se no artigo "Why Good Managers Are So Rare" (Porque são raros os bons gestores), de Randall Beck e James Harter, publicado na Harvard Business Review em Março de 2014.
Por isso ,Fernando Neves de Almeida utiliza uma analogia: "tal como há relativamente poucas pessoas com dotes artísticos, por exemplo, ou desportivos, também para se ser bom na gestão requer um tipo específico de talentos, que não está igualmente distribuído pela população em geral. Em qualquer actividade, os melhores são escassos. Por isso são os melhores".
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O colapso de gestores não é o fim da gestão
Há bons gestores em Portugal, mas tem de haver melhor governo de sociedades e deixar que a meritocracia prevaleça na contratação.
O passado recente em Portugal devorou gestores considerados dos melhores entre os melhores. Eram as estrelas como Zeinal Bava (PT), os carismáticos como Jorge Jardim Gonçalves (BCP) ou Ricardo Salgado (BES) ou promessas como Joaquim Goes (BES) ou Pacheco de Melo (PT). Saíram pela porta pequena com as empresas a sofrerem consequências duras de alguns dos atribuídos actos de gestão.
Será que os tempos exigem um outro tipo de gestores? Para Fernando Neves de Almeida, "managing partner" da Boyden a falha, nestas organizações, foi de "corporate governance": "as competências de um gestor de hoje são as mesmas que sempre foram: visão estratégica, disciplina e capacidade de organização, inteligência emocional e lealdade aos 'stakeholders'".
Nem sempre os gestores são colocados nas organização que deles necessitam.
Esta queda dos gestores estrela, que mostra e desvenda uma espécie de capitalismo compadrio, pode colocar em causa a forma como se mede e premeia o mérito dos gestores, e, por outro lado, pode contribuir para mudar o paradigma do gestor herói para um outro em que se privilegie o predomínio das equipas de gestão. Fernando Neves de Almeida discorda da visão e refere que estes acontecimentos alertam mais "para a necessidade cada vez maior de um cultura de mérito versus cultura de compadrio e para uma maior necessidade de recrutamento profissional, à semelhança do que acontece nos países mais desenvolvidos".
Porém, como assinala Marcus Buckhingam a gestão raramente é o gesto de um predestinado: "estratégias bem-sucedidas, tácticas, negociações e operações numa empresa não são o produto de alguém sozinho sentado num gabinete". Claro que depois surgem descritas como "a minha ideia", a "minha visão", de que é exemplo a secção da Harvard Business Review, "How I Did It" (como eu fiz).
Alguma literatura refere que a gestão em Portugal é de fraca qualidade. Os estudos de Nicholas Bloom (Universidade de Standford), John Van Reenen (London School of Economics) e outros autores, como "Management Practices Across Firms and Countries", de 2012, ou "The New Empirical Economics of Management", de 2014, sustentam essa tese. Os rácios da qualidade de gestão estão abaixo de países como os Estados Unidos, a Alemanha, o Japão, a Suécia, o Canadá mas também a Polónia, o México ou a Irlanda, embora ligeiramente acima da Espanha e da Grécia.
As principais fragilidades estão na gestão de incentivos das empresas, seguida da gestão de objectivos de curto e médio prazo enquanto na monitorização de desempenho, os gestores portugueses se situam na média.
Fernando Neves de Almeida defende que há muitos bons gestores em Portugal. É a defesa do seu negócio: "a prova é que a Boyden e outros concorrentes do nosso sector colocam anualmente várias centenas de bons gestores que fazem a diferença nos locais onde são colocados". Mas também tem a sua ponta de verdade quando alude mais uma vez a uma espécie de capitalismo de compadrio. Assinala que, por vezes, "por interesses que vão para além da lógica da meritocracia e da economia de mercado, não são colocados nas organizações que deles necessitam".
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Os CEO globais
"Como é que os executivos desenvolvem as competências necessários para liderar num mundo tão volátil?" é a questão chave no estudo CEO Report da Heidrick & Struggles e da Universidade de Oxford, com entrevistas a 150 CEO de todo o mundo, cinco dos quais em Portugal. Numa altura em que se fala cada vez mais da sustentabilidade do negócio, um dos CEO refere que Michael Porter costumava falar em vantagem competitiva sustentável só que hoje em dia não há nada sustentável mas continua a ter de encontrar-se a vantagem competitiva.
Da análise e da reflexão resultaram algumas mutações que serão cruciais para os futuros CEO. "Todas são relevantes, mas talvez a primeira seja a mais desafiante: 'leading at the intersection of outside and inside', ou seja, gerir o equilíbrio entre a ambição da companhia e as expectativas dos 'stakeholders'", assinala Pedro Rocha Melo, partner da Heidrick & Struggles. Como se refere no estudo, os CEO têm não só de ser mais conscientes do mundo exterior e da sua influência, mas sobretudo têm de entender "como interagir, influenciar e comunicar". Relacionado ainda com o poder da mudança alguns dos gestores falam do impacto das inovações tecnológicas, nomeadamente a ascensão das redes sociais, que criam um sentido de urgência e de pressão por maior transparência.
O perfil de um CEO em Portugal ou em outra geografia não é diferente.
Uma conclusão do estudo é que "não há uma grande diferença entre o perfil de um CEO em Portugal ou em outra geografia" sublinha Mariana Branquinho, partner da Heidrick & Struggles. Uma diferença interessante que o estudo revelou é a de que existe um CEO que é o dono e fundador da sua empresa versus o CEO executivo que desenvolveu a sua carreira em várias organizações, "nomeadamente no que respeita à capacidade de tomar risco", assinala Mariana Branquinho.