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"Espera-se um regulador construtivo"

O novo enquadramento legal da supervisão da auditoria e de novos procedimentos aplica-se já às contas de 2016, mas Rui Martins, da EY, defende a mudança de legislação que determina a definição de Entidade de Interesse Público, reduzindo assim de forma significativa o número de entidades sujeitas à sua aplicação.

11 de Janeiro de 2017 às 12:13
David Cabral Santos
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O ano de 2016 é o primeiro em que se faz a aplicação efectiva do novo enquadramento legal, por isso tornou-se necessário que as Entidades de Interesse Público (EIP) interiorizassem as suas consequências, nomeadamente o nível de exigência e de responsabilidade "que é maior para todos os intervenientes: as empresas, os órgãos de fiscalização, os auditores e também os reguladores" frisou Rui Martins, partner e assurance leader da EY, na abertura da conferência "Alterações às regras de relato financeiro e auditoria em Portugal: Mais Transparência ou Mais Complexidade?", que se realizou a 13 de dezembro de 2016 no Hotel Pestana Palace em Lisboa.

As novas regras obrigam, por exemplo, à rotação obrigatória do auditor, foram alargados os serviços proibidos aos auditores da entidade e limitados os serviços distintos de auditoria que são permitidos. Além disso implicam a necessidade de uma revisão e um melhor planeamento por parte das entidades e dos órgãos de fiscalização, dos auditores e dos supervisores.


O relatório de auditoria passa a incluir obrigatoriamente informação detalhada sobre matérias relevantes de auditoria, melhorando assim a transparência do relato financeiro com benefício claro para todos os utilizadores. Rui Martins não deixou de salientar que apesar de estar "em curso um processo de adaptação dos agentes e do regulador ao novo enquadramento, é essencial que se avaliem todas as implicações". Em relação ao regulador salientou que "terá um papel importante e que se espera construtivo em todo o processo pela sua natureza e complexidade. Terá que levar o seu tempo sendo importante para todos a partilha de boas práticas".

Rui Martins apelou ainda a uma revisão da legislação. Explicou que Portugal, comparativamente com outros países, "tem um conjunto de EIP muito elevado e de pequena dimensão, nomeadamente fundos e outras entidades ligadas ao sector financeiro. A não revisão desta caracterização acarretará custos insuportáveis e um processo que será muito difícil e complexo a auditoria e controlo destas entidades".

TOME NOTA

O novo enquadramento legal

Regime jurídico de supervisão de auditoria (lei 148/2015, de 9 de Setembro) que define o que são Entidades de Interesse Público, principais destinatários das novas regras, como a emissão do relatório adicional ao órgão de fiscalização, e atribui à CMVM (Comissão de Mercado de Valores Mobiliários) o papel de supervisão de auditoria.

Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas (lei nº140/2015, de 7 de Setembro) que impõe, por exemplo, a rotação de auditor, o limite dos honorários de serviços distintos de auditoria e introduziu as Normas Internacionais de Auditoria (ISA) como o normativo a seguir na realização das revisões legais de contas/auditorias em substituição das anteriores Diretrizes de Revisão e Auditoria (DRA) emitidas pela OROC (Ordem dos Revisores Oficiais de Contas), destacando-se a ISA 701 relativa à comunicação de matérias relevantes de auditoria em auditorias a empresas cotadas. Este novo enquadramento legal vigora desde 1 de Janeiro de 2016 e em Portugal a aplicação dos requisitos previstos na ISA 701 estende-se a todas as Entidades de Interesse Público. Os relatórios de auditoria das restantes entidades passam a partir de 2016 a ter um novo formato, tal como previsto na ISA 700 e na Guia de Aplicação Técnica nº 1 emitida pela OROC.

Este novo enquadramento transpõe a Directiva 2014/56/EU e o Regulamento (UE) nº537/2014, ambos de 16 de abril de 2014, para o ordenamento jurídico português.



"Nenhuma regulação deve ser uma sobrerregulação"

O equilíbrio do regulador é fundamental e, no caso português, a CMVM e os restantes reguladores devem promover uma atitude construtiva, inspirar-se no exemplo de outros reguladores e compreender que é um caminho que se inicia e não se percorre todo num dia.

Este ano teve início uma nova regulação na auditoria que passa a ser da responsabilidade da CMVM (Comissão de Mercado de Valores Mobiliários). Começa uma nova relação entre auditores, órgãos de fiscalização e CMVM e os reguladores de sectores. Para Pedro Fontes Falcão, membro do conselho fiscal da Pharol e director executivo do MBA do INDEG-ISCTE, "este primeiro ano não vai ser simples, mas creio que, se os reguladores tiverem uma atitude construtiva, de não excessiva regulação, de fazer estudos e de apresentar 'benchmark' de situações que existem em outros países e comunicando com os auditores e órgãos de fiscalização, será benéfico para todos". Não defende o excesso de regras e de intervenção.

Alan Johnson, membro do IFAC (International Federation of Accountants) e ex-CFO da Jerónimo Martins, tem uma opinião semelhante. Diz: "façam o que têm a fazer mas suportem a viagem, porque não se faz tudo num dia, tanto mais que a CMVM tem novas responsabilidades que junta a regulação da auditoria à regulação do mercado de capitais, num contexto de grandes mudanças". O actual presidente da Comissão de Controlo Interno do Grupo Jerónimo Martins aconselha a CMVM a inspirar-se no que "outros reguladores têm feito e há bons exemplos na FRC no Reino Unido no que se refere aos relatórios de auditoria. A África do Sul também pode ser um exemplo que optou por uma abordagem progressiva ou o Canadá. Aconselharia a CMVM a conversar com outros reguladores saber o que funciona, o que não resultou, como evitar erros e armadilhas".

A experiência no Reino Unido

Pela experiência da Financial Reporting Council (FRC), regulador de auditoria no Reino Unido, Robert Overend, partner da EY, refere que a regulação em vez de uma acção interventiva deve preferir uma lógica de reforço positivo e de colaboração. "A publicação das 'best practices', claras e em que o regulador exprime o que entende ser a direcção mais correcta, pode influenciar e levar aos comportamentos pretendidos sem ter de ser intrusiva" comunicou Robert Overend. O processo no Reino Unido de introdução dos standards iniciou-se em 2013. Deram-se "significativas mudanças ao longo de três anos nas práticas das auditoras e no papel da FRC" sobretudo porque os "auditores tiveram que começar a explanar mais acerca da sua auditoria".

Em termos gerais trata-se da criação de um ambiente em que os auditores estejam dispostos a experimentar, a fazer de diferentes formas e não estar sujeitos a regras excessivas de regulação. Há um balanceamento entre as exigências das regras e as possibilidades de fazer de uma forma diferente. A atribuição de prémios induziu um aumento da competição entre as auditoras para se atingirem as melhores práticas e foram mais efectivos do que uma atitude punitiva por parte do Regulador, como mostra o relatório da FRC, "Extended auditor's reports-A further review of experience" de janeiro de 2016.

Alan Johnson diz que "nenhuma regulação deve ser uma sobrerregulação. O grande problema é que muitas vezes a sobrerregulação não é clara, concisa sobre as regras e as guidelines que se tornam muito opacas e de difícil interpretação para os auditores". Considera ainda que os reguladores devem "seleccionar os aspectos com os quais não estão satisfeitos e fazer as discussões de forma mais privada possível porque é fundamental não criar situações que minem a robustez e a confiança na auditoria. Isto não implica que o regulador não deva emitir publicamente as suas opiniões e instruções sempre que considere essenciais e fundamentais".

"Na regulação é importante o equilíbrio entre o que pode ser de algum modo intrusivo e não intrusivo para a boa gestão dos órgãos. Mas creio que os reguladores terão um papel construtivo e todos saberão trabalhar em conjunto para bem da empresa e da economia em geral" refere Pedro Fontes Falcão.


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