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Princípios estáveis atenuam excesso de regulamentação

Para Paulo Costa Martins, “a atual regulamentação é complexa, muitas vezes demasiado complexa, e às vezes desafia a lógica”, mas assenta em princípios que normalmente são estáveis.

21 de Outubro de 2019 às 19:00
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Paulo Costa Martins é advogado desde 1990 e sócio da Cuatrecasas desde 2016 e é especialista na área financeira e mercado de capitais e membro da direção do OPCR - Observatório Português de Compliance e Regulatório. Não acredita que o volume e a complexidade da atual regulação financeira se "se altere no curto prazo".

Quais são as vantagens da atual regulação e quais foram as principais mudanças provocadas pela pressão regulatória?
A atual regulamentação é complexa, muitas vezes demasiado complexa, e às vezes desafia a lógica. Contudo, se deixarmos a superfície e mergulharmos nas bases em que assenta essa regulamentação percebemos que os princípios, normalmente, são estáveis. E isto é o mais relevante para quem trabalha na área. Independente do excesso da regulamentação, que os princípios em que a mesma assenta se mantenham estáveis.

O tsunami regulatório dos últimos anos sobre os setores financeiros é o novo normal ou caminha-se para a bonança e está-se em vias de estabilização?
Quando iniciei a minha carreira, em 1999, o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras tinha 241 artigos, hoje tem mais do dobro, na altura eram 39 páginas em Diário da República, hoje são 147. A 1ª e 2ª Diretivas Bancárias tinham juntas 40 artigos. A atual CRD IV (Capital Requirements Directive) e o CRR (Capital Requirements Regulation) têm 686 artigos. Não creio que esta tendência se altere no curto prazo.

As fintechs deviam ser objeto da mesma regulação que os bancos incumbentes ou seria fatal para a inovação?
Tem havido um entendimento mais ou menos explícito que a regulamentação das fintech pode prejudicar o desenvolvimento destas novas entidades, muitas delas start-ups. Por outro lado, não parece desejável que uma mesma atividade possa ter uma diferente regulação e supervisão e haja um tratamento preferencial a determinados players face a outros no mesmo mercado. Os reguladores têm um papel essencial na obtenção do equilíbrio necessário, percebendo as fintech, que são realidades muito díspares, com estruturas descentralizadas, muitas de pequena dimensão, de forma aberta e transparente, e simultaneamente mapeando e avaliando os riscos associados a estas novas entidades, nomeadamente os de estabilidade financeira.

Quais são os principais desafios futuros na área da regulação bancária e financeira? Qual poderá ser o impacto da conclusão da união bancária?
O primeiro pilar da união bancária, o Mecanismo Único de Supervisão, já está operacional e funciona bem. Os outros dois, o Mecanismo Único de Resolução e o Fundo de Garantia de Depósitos comum, ainda estão em curso, sendo que o objetivo do Mecanismo Único de Resolução é de estar dotado com 55 mil milhões de euros até 2024, valor que virá das contribuições dos bancos. Acresce que os bancos estão hoje sujeitos a requisitos de capital muito exigentes e num futuro próximo com a BRRD2 (Bank Recovery and Resolution Directive) esses requisitos vão aumentar. Os requisitos de capital, juntamente com a forte pressão dos supervisores no sentido de redução dos riscos de crédito e liquidez, está a resultar numa mudança genética do modelo de negócio de alguns bancos comerciais transformando-os em meras plataformas de distribuição de produtos de terceiros.

Qual poderá ser a importância da reg-techs e da tecnologia como resposta às exigências de regulação?
As reg-techs podem funcionar em dois planos distintos, o que explica a sua importância. Primeiro, na introdução de decisões de negócio totalmente automatizadas, por exemplo a identificação de um cliente na abertura de uma conta bancária (KYC). Num segundo plano, como uma ferramenta de suporte dos compliance officers, mas não os substituindo, nomeadamente na deteção de riscos de compliance e regulatórios. Se implementadas corretamente, as reg-techs permitem a redução de custos e de duplicação de trabalho e simultaneamente uma melhor compreensão do risco pelo compliance officer.
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