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Mercado mantém brilho ténue

Num ano, as transacções na bolsa portuguesa caíram mais de metade.

27 de Setembro de 2016 às 11:30
Reuters
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"Bear market" é a tal expressão, usada e pouco desejável, que remete para a apatia por vezes hibernante de um urso. Em contraponto, à excitação e vigor de um touro, o desejado "bull market". Hoje, os números parecem não enganar. No final do segundo trimestre, na bolsa portuguesa, o volume de ordens executadas "totalizou 13.070,5 milhões de euros". O que, como assinala o relatório da CMVM, corresponde a "menos 21,6% do que no trimestre anterior e menos 51,3% do que em igual período de 2015".

"Além da redução em si, verificamos que as quedas foram maiores entre os investidores não residentes do que entre os residentes, e entre os primeiros, foram os investidores institucionais quem mais se retraiu, o que é um dado preocupante", sustenta André Gouveia, analista financeiro da DECO PROTESTE, a mais importante associação de defesa do consumidor portuguesa.

Visão similar têm outros que prestam atenção diária aos mercados. Economista e analista financeiro, César Borja dirige o site Borja on Stocks. Ao Negócios em Rede é peremptório, lembrando que, "desde o início de 2016, o índice PSI-20 está a descer 14% e está 70% abaixo do seu máximo histórico atingido no ano 2000".

Como o panorama não parece muito animador, "é natural que os investidores nacionais estejam desinteressados", refere César Borja. Agora, "se a performance da economia for positiva, assim como o PSI-20, pode ser que o cenário mude e os investidores portugueses voltem a mostrar interesse", na óptica de Adriano Lopes, um engenheiro informático madeirense, "blogger" no investirnabolsa.pt.

Em causa, estarão diversos factores. "A performance da economia nacional, o medo de termos mais um caso BES ou Banif e melhores oportunidades de investimento noutras bolsas de valores podem ser algumas das causas para o arrefecimento nas operações de mercado", na síntese do "blogger" e investidor, Adriano Lopes.

A esta leitura, Nuno Casimiro, licenciado em Gestão e "blogger" do investidor.pt, acrescenta o reparo de que "são os accionistas os detentores das empresas, mas quem ganha os prémios são os gestores. Quando as coisas correm bem, ganha o Estado, ganha a economia, ganham todos os interessados na organização, quando as coisas correm mal, são os accionistas que sofrem".

Receios

"Gato escaldado" é como começa o conhecido provérbio que talvez possa explicar alguma desconfiança face à bolsa. À portuguesa, principalmente. "Após o descalabro de acções outrora muito populares como as do BES, Portugal Telecom, BCP e Banif, os investidores estão bastante receosos", sustenta o economista César Borja.

As más experiências bolsistas com cotadas continuam, segundo os analistas, a marcar o mercado. "No caso português, não podemos esquecer os acontecimentos recentes, que ditaram perdas totais para os investidores. O caso BES e o caso Banif descredibilizaram muito a bolsa portuguesa", frisa o "blogger" Nuno Casimiro.

No reverso da moeda, há também quem arrisque em apostas menos convencionais. "A falta de liquidez e volatilidade nas acções levou muitos pequenos investidores para produtos financeiros alternativos, como os CFD [Contratos Diferenciais] e os Forex [mercado cambial], que são altamente perniciosos", alerta o analista.

Há pouco dinamismo no mercado português. Para Adriano Lopes, os investidores "estão à procura de acções de empresas com capacidade de crescer nos próximos meses, mas que ao mesmo tempo sejam líderes nos seus sectores de actividade. Procuram valor. Se as acções tiverem dividendos atractivos, ainda melhor em qualquer carteira de investimento".

Por outro lado, lembra o analista, "a subida dos 'yields' das OT [Obrigações do Tesouro] a dez anos (iniciaram o ano nos 2,54% e agora estão nos 3,31%) preocupa os investidores estrangeiros, que consideram a generalidade das empresas portuguesas como bastante endividadas e com risco de problemas de refinanciamento caso as taxas de juro subam muito mais".

Juros

Os juros baixos, afinal, não parecem reflectir-se no mercado bolsista. "Em Portugal, não. Porque as OT a dez anos estão a dar 3,31% ao ano, enquanto as 'bunds' alemãs estão com um 'yield' negativo", frisa César Borja.

Alem deste factor, haverá também uma sedução de muitos investidores por "produtos com um risco superior ao que normalmente corresponderia ao perfil deles", como realça André Gouveia, da DECO PROTESTE.

Tudo porque a baixa dos juros não acarreta consequências inevitáveis. "Este factor aplica-se à generalidade dos mercados, mas depois há realidades geográficas diferentes: em Portugal pode estar a ocorrer algum arrefecimento, dado o pior desempenho do mercado nacional, as perspectivas menos optimistas para economia e a desconfiança em relação aos títulos de alguns sectores", enumera André Gouveia.

"As baixas taxas de juros estão a forçar vários aforradores que se refugiavam em investimentos sem risco e com capital seguro a procurar por novas oportunidades", acha Adriano Lopes. Que podem passar também pela aplicação de dinheiro noutras áreas, na leitura de Nuno Casimiro, o qual lembra que "o imobiliário é considerado como uma alternativa segura para a aplicação de poupanças".

Este fenómeno de risco surge assim como uma outra face da moeda de uma aparentemente maior "ponderação e prudência dos investidores em Portugal". A qual não se deve, segundo André Gouveia, "ao aumento da literacia financeira", que é "um problema já diagnosticado por entidades como o Banco de Portugal e a CMVM".

"Considero que a literacia financeira em Portugal é hoje em dia inferior ao que era quando comecei a estudar os mercados financeiros, em 1996. Há demasiado capital em depósitos bancários e o mercado de capitais está moribundo", afirma de forma peremptória, César Borja.

O fraco conhecimento dos mercados parece, contudo, não ter uma relação directa com a facilidade de acesso à informação. Até porque, se "há uns anos, para se saber a cotação de uma acção era complicado, hoje é tudo mais fácil", considera Nuno Casimiro.

"As opções para investir são cada vez mais. Mas tudo depende do clima económico que se vive e se os investidores consideram oportuno expor as suas poupanças ao risco", defende o "blogger" e gestor de empresas.

De forma directa, também Adriano Lopes considera que "hoje em dia é possível saber praticamente tudo sobre uma empresa, através do computador".

O problema depois, segundo diz, é que "cada investidor tem o seu método de analisar empresas e fazer escolhas". E "investir com conhecimento do mercado é essencial para diminuir o risco".


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