O setor da construção não tem estado parado, mesmo em momentos de maior crise como o período pandémico ou a recente invasão da Ucrânia pela Rússia. Apesar de se ressentir, o setor tem conseguido reinventar-se e assegurar crescimentos, associando-se cada vez mais às novas tecnologias. Em entrevista ao Negócios em Rede, Manuel Reis Campos, presidente da Confederação Portuguesa da Construção e do Imobiliário (CPCI) e da Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas (AICCOPN), fala desta e de outras realidades.
Como olham atualmente para o setor da construção em Portugal?
Olhamos para o setor com confiança, porque, apesar das dificuldades conjunturais que estamos a enfrentar, sobretudo em resultado da incerteza e das pressões inflacionistas que se vivem à escala mundial, que se iniciaram com a pandemia e foram profundamente agravadas pela guerra na Ucrânia, esta é uma atividade que se tem destacado pela sua resiliência.
As estimativas para a evolução da produção do setor apontam para um crescimento de 5,5% em 2022 após uma variação positiva de 4,3% no ano passado e, recentemente, o Banco de Portugal reviu em baixa a previsão para o PIB, mas prevê um incremento do investimento de 9,2%, acima dos 7,2% previstos anteriormente, e destaca a aceleração significativa "da implementação de projetos financiados por fundos europeus" e um crescimento do investimento residencial de 5,8%.
Que importância tem o PRR para esta área?
O PRR é um instrumento determinante para toda a economia. No que diz respeito, muito concretamente, ao setor, além de uma presença transversal e muito relevante ao nível da concretização dos investimentos que estão previstos, os domínios da habitação e da eficiência energética assumem um particular destaque. Desde logo, a habitação é a componente com maior dimensão individual, representando 1.583 milhões de euros em subvenções e 1.150 milhões em empréstimos. Estão, ainda, previstos 610 milhões de euros para apoiar à eficiência energética de edifícios residenciais, de serviços e da Administração Pública.
Como utilizar a tecnologia para fazer uma gestão mais eficiente dos edifícios e maior rentabilização do investimento?
A inovação e a tecnologia estão a ganhar espaço no setor e a denominada Construção 4.0 é uma realidade que se está gradualmente a impor, porque está precisamente focada na disponibilização de soluções capazes de permitir gerir de forma mais eficiente não apenas o processo construtivo, mas todo o ciclo de vida dos edifícios, com impactos muito relevantes na rentabilização do investimento nos mesmos.
A digitalização e a industrialização da construção permitem obter ganhos de eficiência que são ainda mais importantes no atual contexto de elevadas pressões inflacionistas, bem como possibilitam um acompanhamento permanente dos edifícios e uma intervenção preventiva e, consequentemente, com menores custos.
Há exemplos dessa utilização?
Podem-se apontar exemplos dessa utilização que permitem uma melhor gestão dos edifícios, como o BIM, a sensorização e monitorização, o denominado "big data" e a análise preditiva, entre outros. Hoje, é possível desenvolver modelos que permitem programar intervenções de manutenção tendo em conta as reais condições de utilização dos edifícios e dos equipamentos, ou identificar potenciais riscos, permitindo uma ação atempada, otimizada e capaz de minimizar custos e, consequentemente, melhorar os níveis de rentabilidade.
Existe uma data para a pegada zero (descarbonização)?
A União Europeia assumiu metas ambiciosas, desde logo, para os edifícios de balanço energético quase nulo, apontando para 2030, mas estas obrigações relativamente ao desempenho energético dos edifícios visam, sobretudo, a construção nova e as intervenções profundas de reabilitação.
Ao nível do parque edificado existente, na sua "Estratégia Europeia para uma Vaga de Renovação", a Comissão Europeia estabeleceu também objetivos até 2030: duplicação das taxas atuais de reabilitação energética dos edifícios residenciais e não residenciais, que é atualmente cerca de 1% à escala europeia, pela melhoria do desempenho energético de 35 milhões de edifícios e pela criação de 160 mil empregos "verdes" adicionais no setor da construção.
Conseguem os pequenos proprietários chegar a esta meta?
Os pequenos proprietários são determinantes para que o país possa atingir as metas pretendidas, é um processo que sabemos ser incontornável, mas tem de ser gradualmente implementado e é necessário disponibilizar apoios nesse sentido.
É preciso capacitar as empresas e diferenciar positivamente quem implementa soluções mais eficientes do ponto de vista energético e ambiental, cumpre regras em vigor, como a detenção do certificado ou alvará de construção, e aposta na sua qualificação e na capacidade de resposta aos desafios da sustentabilidade.
Qual a realidade dos edifícios inteligentes em Portugal?
É uma realidade em claro crescimento e temos neste momento, em Portugal, a ser aplicadas tecnologias de topo em diversas áreas. Podem-se indicar alguns exemplos que têm vindo a ser mais utilizados, como os sistemas de controlo de energia, os sistemas solares passivos, a monitorização wireless e equipamento conectado, a realidade aumentada e a virtualização, os modelos preditivos, os materiais de construção avançados e o BIM.
A AICCOPN diz presente
A AICCOPN criou a R.U.-I.S. | Reabilitação Urbana Inteligente e Sustentável, orientada especificamente para a capacitação das empresas e para a sua diferenciação e que atua, também, junto dos donos de obra e do público em geral, no sentido de promover os valores da sustentabilidade e reafirmar a importância de contratar empresas qualificadas. A AICCOPN atribui às empresas que cumprem um referencial de qualidade e legalidade a distinção “Empresa Qualificada R.U.-I.S”.