Os Açores acolhem desde hoje e até 15 de outubro o 28º Congresso Mundial da ISTO dedicado ao Turismo Sustentável. Este congresso realiza-se no âmbito duma organização que existe há mais de meio século e que reúne os cinco continentes, a ISTO (International Social Tourism Organisation) que integra organizações que desenvolvem atividades de turismo solidário e sustentável, ou seja que desenvolvem um turismo para todos, preservando e potenciando as diversidades culturais e ambientais dos territórios.
A maior parte das organizações que integra a ISTO nasceu nos princípios do século XX, com as associações humanistas, sindicais e republicanas, que associaram as lutas pela redução do tempo de trabalho e pela igualdade de oportunidade ao lazer e à cultura para os operários e os pensionistas.
O congresso realiza-se nos Açores por dois motivos: as características da região e do seu turismo, que tem na natureza uma causa determinante, e pela disponibilidade do Governo Regional em apoiar a iniciativa. A isto alia-se o facto da Inatel ocupar a Administração e a Vice-Presidência da organização, e ter duas unidades hoteleiras na Região (Flores e Graciosa), para além de delegações em S. Miguel, Terceira e Faial, aliando sempre a sua intervenção hoteleira e de turismo à promoção dos agentes culturais, desportivos e sociais do território. Para falar do Congresso e dos desafios do turismo sustentável, falamos com Francisco Madelino, presidente da Fundação Inatel.
Qual é a importância de promover um turismo sustentável?
O turismo é fruto das vitórias das sociedades liberais no mundo após a Segunda Guerra mundial. Sem facilidades de vistos às deslocações das pessoas entre países, inerentes à promoção da circulação menos restrita de pessoas, associadas muito à livre circulação crescente do comércio internacional, o Turismo não se tinha tornado uma das principais atividades económicas do mundo. Antes deste período era negligenciável, salvo alguns casos nacionais, e os movimentos muito limitados. Após a Segunda Guerra mundial cresceu exponencialmente. A esta variável política associou-se o desenvolvimento tecnológico, baixando os preços dos custos de deslocação e transporte e mais recentemente a variável digital. Contudo, a massificação do turismo coloca problemas de preservação ambiental, deixando em muitos casos uma pegada ecológica muito negativa e ameaçando territórios e as suas formas diversas de vida, havendo aqui uma espécie de autofagia em que a diferença atrai e a massificação mata o que atrai. Daí a importância do Turismo Sustentável, aquele que não destrói, nem o planeta e os habitats dos territórios, e que envolve as comunidades onde os turistas se deslocam.
Quais são os objetivos do 28º Congresso Mundial da ISTO?
Os objetivos deste congresso são, sobretudo, dar a conhecer os Açores a estas organizações, que fazem da natureza e da diversidade ambiental e cultural, sem as destruir, a sua causa primeira, envolvendo todas as gerações, e mostrar ao País e ao Mundo a dimensão e importância social deste trabalho. Para isso, a reflexão vai-se orientar em torno destes temas e da divulgação de boas experiências internacionais, de turismo sénior, de jovens, de cultura, de natureza, de desporto com Natureza, sempre orientado para envolver e participar nos territórios que recebem este turismo, e sempre com objetivos de solidariedade e sociais, não apenas nestas "economias externas" (ambiente, cultura, gastronomia local, etc.), mas também numa dimensão social, promover a igualdade de oportunidades ao turismo para todos, sem destruir o planeta, mas também intergeracional, numa sociedade que vive cada vez mais para a promoção agressiva da juventude eterna.
Quais os principais temas que vão ser abordados no congresso?
Os temas são vários, sempre no contexto atrás referido. O papel da economia social e solidária na sustentabilidade social e ambiental do turismo. De que forma a inovação nas práticas pode ajudar o Turismo Sustentável a privilegiar a Inserção Social. Como preservar as regiões e a sua diferença e torná-las mais atrativas para os turistas, como desenvolver a interatividade entre quem recebe e quem chega, reduzindo os impactos negativos sobre as comunidades locais. Como contribuir para um trabalho digno na defesa de maior qualidade para o setor.
No seu entender, Portugal promove um turismo sustentável?
Nas últimas décadas sim. A política pública tem colocado esta variável no centro, em todas as dimensões do turismo. O Turismo de Portugal tem tido aqui um papel determinante.
Os Açores são reconhecidos e premiados pela estratégia que implementaram de turismo sustentável no arquipélago. Que boas práticas podem ser replicadas em Portugal e em outras geografias do exemplo açoriano?
Os Açores aprenderam com as más experiências da massificação do turismo em Portugal nos anos sessenta e setenta. O seu Turismo é orientado para preservar a sua riqueza natural e cultural e orientado paras públicos e países que privilegiam esta vertente, sejam os nórdicos, sejam da América do Norte. Neste sentido, observando os territórios, sobretudo as Costas alentejana e vicentina, e seja no interior, de Trás-os-Montes ao Alentejo, o seu exemplo é uma inspiração e grandes projetos estão a ser desenvolvidos nestas regiões, pelo que importa trocar boas práticas.
Que políticas sociais podem ser promovidas para criar um turismo inclusivo?
A política pública, quando há falhas de mercado (no caso, grupos sociais que por várias razões não viajam), é determinante, dinamizando essa procura, sobretudo quando ela não é solvente no mercado, mas apoiando as ofertas que nascem, e que são dificilmente rentáveis pela forte sazonalidade. Desde os benefícios fiscais aos apoios ao investimento, mas sobretudo ao apoio à procura destes públicos, inseridos em intervenções de inclusão social especificas, as políticas sociais são determinantes. O caso das termas é internacionalmente exemplar, ou dos apoios como o 55+, que a Inatel promove, apoiada pelo FSE, são bons exemplos.
Que papel deve ter o turismo no desenvolvimento das comunidades e dos territórios? O que deve fazer de uma forma integrada e participativa?
Cada vez mais o turismo vive de experiências e das emoções únicas que elas promovem. Ser diferente é a principal fonte de atração. Na cultura, muito, nos territórios e na sua natureza, também muito, na gastronomia, na sociabilidade das comunidades com os turistas, está muito, hoje, e mais no futuro, a principal caraterística competitiva turística dos locais. O turismo tem de estar associado a quem faz cultura, economia e preserva a natureza desses territórios. Destruindo-os, destrói-se a si próprio.
Que papel desempenha a Fundação Inatel na promoção de um turismo sustentável?
A Fundação sempre os fez nos seus 87 anos de existência. As associações culturais e humanistas estão ligadas a nós desde sempre sobretudo no interior, na ruralidade, nos bairros operários das cidades, os nossos hotéis, antes Centros de Férias, existem em territórios que só a Fundação os consegue manter (Graciosa, Linhares da Beira, Entre-os-Rios, são exemplos), as comunidades rurais são aquelas que mantêm e combatem a desertificação do interior e preservam a Natureza. Os turistas vão porque há cultura, gastronomia, vida no Portugal rural. Essas associações desportivas, etnográficas, humanistas, bandas filarmónicas, etc., turismo e lazer para todos, que são mais de duas mil as que fazem parte da rede Inatel, tiveram sempre na Inatel o parceiro presente, e continuaram a ter, mesmo em tempos que a ideia de turismo sustentável e da importância da diferenças e dos diálogos interculturais e intergeracionais eram menos potenciados na atividade turística. E não só. Politicamente relevantes, quando os nacionalismos xenófobos e a guerra estão presentes. Sem interação entre povos, cada um aceitando o outro, não há paz, nem turismo, nem planeta.