Outros sites Medialivre
Notícia

Financiar a produção descentralizada ainda é um desafio

Instituições financeiras não mostram dúvidas sobre importância destes projetos, mas defendem ser preciso encontrar novos modelos. “Temos uma série de restrições complexas para resolver”, aponta responsável do Banco Europeu de Investimento.

30 de Abril de 2024 às 12:04
Gilles Badot, do Banco Europeu de Investimento (BEI) (à esquerda) com Dipak Haria, do fundo BlackRock e Américo Carola, do Millennium bcp.
Gilles Badot, do Banco Europeu de Investimento (BEI) (à esquerda) com Dipak Haria, do fundo BlackRock e Américo Carola, do Millennium bcp.

Ao longo de todo o dia, os diferentes oradores do Be Next – Europe’s Decentralized Energy Innovation Forum identificaram desafios na generalização das soluções de produção descentralizada. Atualmente as soluções de produção descentralizada estão disponíveis para as empresas sem necessidade de investimento inicial, com recurso, por exemplo, a modelos de PPA [contratos de fornecimento de longa duração], mas, um dos desafios continua a ser otimizar o modelo de financiamento, o que serviu de mote para o painel “Financial Models for Decentralized Energy: Investing Without Unbalancing the Books”, que juntou Gilles Badot, do Banco Europeu de Investimento (BEI), Dipak Haria, do fundo BlackRock, e Américo Carola, do Millennium bcp. Para estes responsáveis, a opinião é comum: o modelo de energia descentralizada é importante, mas a forma de o financiar ainda não é a ideal. “Temos uma série de restrições complexas para resolver para criarmos uma solução de financiamento vencedora”, considera o diretor do BEI.



A questão central prende-se com a entrada do consumidor final na equação, algo que até há pouco tempo não acontecia nos projetos de investimento em energia. “O que vemos aqui é uma disrupção no modelo de financiamento, porque estamos a trazer os consumidores que estavam fora deste modelo”, aponta Américo Carola, que refere que “o risco é mais fácil de avaliar quando estamos a falar de contratos entre duas entidades”.

PRODUÇÃO DESCENTRALIZADA SOLAR PODE REPRESENTAR 25% DO CONSUMO DE ELETRICIDADE NA EUROPA.




BANCO EUROPEU DE INVESTIMENTO FINANCIOU RENOVÁVEIS EM MAIS DE 9,3 MIL MILHÕES EM 2023.



Gilles Badot, que assinala que o BEI deixou de investir em projetos relacionados com combustíveis fósseis desde 2019, acredita que no modelo B2C [business to consumer] é importante que os fundos de investimento e outros investidores institucionais tenham os bancos locais como parceiros. São estes agentes que têm “conhecimento do mercado, das empresas e das famílias” e, por consequência, maior capacidade para avaliar o risco envolvido em cada projeto descentralizado e de autoconsumo. A segurança dos ativos financiados e a capacidade de agir em caso de incumprimento são algumas das principais preocupações.


“Um desses modelos de solar residencial é entender o risco de crédito associado à família que está a adquirir ou a alugar os painéis. Por exemplo, se um inquilino deixasse de fazer os pagamentos, conseguiríamos aceder ao telhado?”, questiona Dipak Haria. Gilles Badot compara este tipo de financiamento a um crédito ao consumo, com maturidades mais curtas e sem uma garantia sobre o ativo. “Temos de estabelecer claramente os modelos de financiamento, porque precisamos de financiar sem desequilibrar as contas”, acrescenta Américo Carola.


Investimento empresarial

Para o diretor coordenador da Banca de Investimento do Millennium, os critérios ESG são de “uso comum” na decisão de atribuição de crédito às empresas e a aposta em projetos que visem reduzir as emissões pode beneficiar a avaliação bancária. “Temos de ter a matriz de risco certa, porque quando toca a financiamento temos de estar razoavelmente convencidos de que seremos pagos. Temos de ser capazes de prever cash flows e os vários riscos que os podem impactar”, explica Américo Carola.


Mas há ainda outros riscos que devem ser considerados. Dipak Haria lista a necessidade de ter em conta a parte tecnológica dos projetos, de avaliar o ciclo de vida do armazenamento, mas também dos próprios painéis solares e dos inversores. “Há uma série de riscos que talvez os financiadores tradicionais de infraestrutura ainda não conheçam bem”, acrescenta o líder de Dívida de Infraestrutura do BlackRock.


Do lado do BEI, a aposta nas renováveis e na descarbonização é para continuar. A instituição europeia quer dedicar “pelo menos 50%” da sua atividade à ação climática, algo que tem procurado fazer. Em 2022, o BEI financiou 7,2 mil milhões de euros, um valor que subiu para 9,3 mil milhões em 2023 apenas para projetos de energia renovável. “Estamos a pôr um grande esforço no investimento nas redes e aqui em Portugal, onde assinámos um projeto com a REN, no valor de 450 milhões de euros, para reforçar a rede e permitir a ligação mais fácil a projetos de renováveis”, remata.

Mais notícias