Uma das medidas que a Ordem dos Advogados (OA) adoptou para fazer frente aos diversos desafios que se apresentam ao sector foi criar a iniciativa designada "Bastonato de Proximidade", que consiste numa série de encontros com os advogados de todo o país, para se inteirar dos problemas locais da profissão. Pela voz do bastonário da OA, Guilherme Figueiredo, o "Bastonato de Proximidade" é um encontro "afectuoso" entre o bastonário e os colegas para os ouvir sobre o que os preocupa e sobre os problemas da justiça.
Guilherme Figueiredo acrescenta que estes encontros servem igualmente "para os colegas ouvirem da parte do bastonário o que tem sido a actividade da Ordem e o que são as preocupações institucionais, o trabalho que tem sido desenvolvido e as preocupações daí decorrentes". "O que se trata é de dialogar, de conversar, de aproximar. A aproximação que determina também a transparência. Porque, como todos sabemos, o poder traz muitas vezes atrás de si o isolamento e isso é o pior que pode suceder a qualquer instituição. Deveremos tentar por todos os meios combater o isolamento do poder. É isso e não mais do que isso – diálogo", sistematiza.
Noutras circunstâncias, o bastonário da OA havia também explicado à agência Lusa considerar "absolutamente necessário" que seja feita esta radiografia dos problemas da advocacia em todo o país, de forma "transparente" e captando "a sensibilidade" e a opinião destes profissionais da justiça, por forma a criar uma "relação mais próxima" entre a Ordem e a classe.
Além dos problemas específicos da advocacia em cada uma das zonas do país, Guilherme Figueiredo admitiu que irá aproveitar o périplo para se inteirar de outras dificuldades relacionadas com o funcionamento e as carências dos tribunais, estando previstos encontros com os administradores destas instituições.
Guilherme Figueiredo diz estar consciente das dificuldades que os advogados do interior atravessam, numa altura em que "a classe média tem enormes dificuldades para contratar um advogado" e pagar as custas judiciais. E revelou que outra das preocupações que tem prende-se com o mau funcionamento dos tribunais administrativos e fiscais, assim como dos tribunais de comércio.
Note-se que as próximas deslocações que o bastonário da OA fará no âmbito do "Bastonato de Proximidade" serão a 13 de Novembro, na Covilhã, e 4 de Dezembro, em Portalegre.
Advogados generalistas e especialistas
Entre os vários desafios do sector está o futuro incerto dos advogados generalistas. Segundo o "Guia do Mercado Laboral de 2017" da consultora Hays, para responder da melhor forma possível às necessidades dos clientes, muitas sociedades de advogados recrutam advogados especialistas em matérias específicas e não advogados generalistas, como no passado.
Também o sector empresarial tem apostado no reforço ou criação de advogados internos para a resolução dos problemas diários. Não obstante, a maioria destas empresas mantém a parceria com sociedades de advogados para a resolução de questões mais complexas. Este contexto empresarial tem-se revelado particularmente aliciante para profissionais de sociedades, que muitas vezes se mostram receptivos a assumir novos projectos em departamentos jurídicos no cliente final.
A procura de advogados para este mercado é exigente e têm-se focado em características muito específicas como as "soft skills", a média de curso ou pós-graduação, ou formação académica adicional que possa constituir uma mais-valia.
Delação premiada
Tema bastante discutido hoje no mundo da justiça é a chamada delação premiada, que se encontra em vigor no Brasil e que já levou a várias detenções em diferentes investigações, inclusive na mediática operação Lava Jato, que investiga crimes de lavagem de dinheiro, corrupção activa e passiva, gestão fraudulenta, entre outros, e que tem como réus altas figuras do meio político e empresarial brasileiro.
Guilherme Figueiredo já afirmou que a OA está contra a introdução na legislação penal portuguesa da figura jurídica da delação premiada, em moldes semelhantes aos que vigoram no Brasil. Segundo o bastonário da OA, a delação premiada "comporta sérios riscos para a segurança e a certeza jurídica", havendo já conhecimento de situações no Brasil em que se chegou à conclusão de que as delações eram "falsas".
Em declarações à agência Lusa num passado recente, Guilherme Figueiredo reconhece que existe dificuldade em investigar alguma criminalidade mais complexa, não obstante, "todos os meios não justificam os fins" e a delação premiada também pode levar a erros judiciários "graves". Para o bastonário da OA, o quadro legal português actual "não é susceptível de abrigar a figura da delação premiada" como no Brasil e recorda que o ordenamento jurídico nacional já prevê a "especial atenuação da pena" para quem colabore com a justiça e os investigadores.
O bastonário lembrou que o penalista Figueiredo Dias entende que a legislação portuguesa já permite "acordos de sentença entre o arguido e o Ministério Público", embora o tema se preste a discussão. Ou seja: já existem várias virtualidades que podem ser exploradas para compensar quem colabore com a justiça.
Seja como for, a OA está a trabalhar numa proposta de lei que possa ser uma alternativa à delação premiada. "Para que não se fique com a ideia de que somos contra a delação premiada, mas não apresentamos nada em alternativa", justificou Guilherme Figueiredo, numa entrevista concedida, há dias, ao Jornal de Negócios.