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Subida dos juros não ameaça “rating” da S&P
A Standard & Poor’s poderá pronunciar-se esta sexta-feira sobre Portugal. A expectativa dos analistas contactados pelo Negócios é de que tudo permanecerá igual, apesar da recente subida dos juros e da elevada dívida pública. Mas Portugal terá de começar a reduzir esse fardo.
A agência de notação financeira Standard & Poor’s (S&P) tem agendada para esta sexta-feira uma possível mexida no “rating” da dívida soberana de Portugal, mas, de acordo com os analistas questionados pelo Negócios, deverá voltar a ficar tudo na mesma, tal como sucedeu em setembro do ano passado. Nessa altura, a S&P manteve a classificação da República em BBB, que corresponde a dois níveis acima de lixo – penúltimo nível da categoria de investimento de qualidade –, bem como o “outlook” (perspetiva para a evolução da qualidade da dívida soberana) estável.
Filipe Garcia, economista da IMF – Informação de Mercados Financeiros, crê que nem o “rating” nem a perspetiva deverão ser alterados. “Poderá haver comentários de cautela relativamente à subida do rácio dívida/PIB e à eventual continuidade da subida dos juros em mercado secundário; mas, por outro lado, também se deverá chamar a atenção para a relativa contenção financeira dos gastos públicos, para a almofada financeira que o Tesouro tem criado, para o alisamento do perfil da dívida e para as indicações de política monetária que o BCE tem vindo a dar”, sublinha, considerando que a opinião da agência também deverá ter em conta o que saiu da reunião de quinta-feira do BCE.
O analista-chefe do departamento de mercados do Danske Bank, Jens Peter Sørensen, partilha da mesma opinião. “Atendendo a que Portugal está com um ‘outlook’ estável, duvido de que a S&P altere o ‘rating’”, diz ao Negócios. Além do mais, prevê também que a perspetiva se mantenha no atual patamar, “não obstante o país ter sido atingido por uma segunda onda do coronavírus e o facto de haver alguma especulação em torno de um panorama económico incerto”.
Para o economista da IMF, “a subida recente dos juros soberanos, para já, não é um problema, porque os países estão ‘todos no mesmo barco’ e os juros soberanos estão a níveis muito baixos. De momento, o serviço da dívida é comportável e há apoio político a nível europeu para se ter dívida acima do desejável”.
Em seu entender, “o problema virá a seguir quando os juros subirem e a dívida permanecer muito alta – porque o país continuará a crescer a ritmos muito moderados”. “E, principalmente, será criticado por outros países endividados”.
Nessa altura, diz Filipe Garcia, “será importante continuar a manter a imagem de ‘bom aluno’ e invocar o argumento da manutenção no euro, que foi o que na crise da dívida anterior permitiu ao BCE e ao Eurogrupo encontrar caminhos que evitassem a rutura financeira”.
O suporte dos juros baixos
Já Jens Peter Sørensen frisa que, apesar dos recentes reveses de Portugal, continua a esperar-se que o rácio da dívida face ao PIB diminua em 2021, face ao ano passado. E, por outro lado, “existe o suporte dado pelo contexto de baixos juros da dívida, atendendo ao programa de flexibilização quantitativa do BCE, se bem que as ‘yields’ tenham subido”. Apesar do aumento dos juros que entretanto se verificou, o custo geral de financiamento continua num nível bastante baixo, destaca Sørensen.
O analista dinamarquês salienta que há também o suporte do programa SURE [instrumento temporário europeu de apoio ao emprego] e que “o Governo português dispõe de um amortecedor orçamental significativo – pelo que só tem de vender cerca de 10 mil milhões de euros em dívida pública até ao resto do ano”.
“Se a isto juntarmos a flexibilização quantitativa, então pouco resta para o mercado, pelo que os custos de financiamento vão permanecer baixos, o que deixará inalterados o ‘rating’ e o ‘outlook’”, perspetiva o analista do Danske Bank.
Filipe Garcia considera que Portugal sairá mais fraco desta crise pandémica, do ponto de vista económico-financeiro. “A vantagem é que não está sozinho. Além da Grécia, Portugal tem agora a companhia de Itália (quase 150% dívida/PIB), mas também de Espanha, França, Bélgica e Chipre acima dos 100%. Haverá muita pressão por parte destes países para manter os juros baixos e tolerância para elevados níveis de dívida pública, ou mesmo para propor alternativas mais originais – como a transformação de parte da dívida em dívida perpétua”, sublinha.
Os outros periféricos da Zona Euro
A última vez que a S&P procedeu a mexidas na avaliação à qualidade da dívida portuguesa foi em abril do ano passado – quando cortou inesperadamente o “outlook”, de positivo para estável.
E noutros países periféricos da Zona Euro? No que diz respeito à Grécia, Espanha e Itália, em 2020, procedeu a uma única mexida – e nunca no “rating”. No caso de Atenas, em abril, a S&P desceu a perspetiva de positiva para estável e manteve a notação em BB-, que corresponde ao terceiro nível de lixo. A dívida helénica é, aliás, a única da periferia do euro que ainda não está classificada como investimento de qualidade.
Já Espanha viu o seu “outlook” ser cortado em setembro, de estável para negativo, mas a nota manteve-se em A (sexto nível de investimento de qualidade, o que significa que o país apresenta uma forte capacidade de reembolso).
Quanto a Itália, em outubro a agência melhorou para estável o seu “outlook”, que estava negativo desde outubro de 2018. A notação, por seu lado, manteve-se igual à de Portugal, em BBB.