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Moreira Rato atribui subida dos juros da dívida portuguesa a problemas na banca
O ex-presidente do IGCP defende, num artigo de opinião no Público, que uma das principais causas para o aumento dos juros da dívida portuguesa é o sector bancário. A possibilidade do fim das compras de dívida do BCE também tem penalizado o custo da dívida.
Uma das principais justificações para a escalada recente dos juros da dívida pública portuguesa reside nos problemas do sector bancário português. Essa é, para João Moreira Rato, presidente da Agência de Gestão da Tesouraria e Dívida Pública (IGCP) entre 2012 e 2014, uma das explicações para o aumento dos juros portugueses, que esta manhã estão a negociar a 4,07% na maturidade a 10 anos, um valor que compara com os 0,39% da Alemanha, 2,18% da Itália e 1,68% de Espanha.
O que significa que os spreads, esta manhã, eram de 368 pontos base face à Alemanha, de 189 pontos base face a Itália e de 239 pontos base face a Itália.
Num artigo de opinião publicado esta terça-feira no Público, Moreira Rato começa por analisar a evolução do diferencial das taxas de juro entre Portugal e a Alemanha, bem como o "spread" face às obrigações de Itália, que, com a Grécia, é classificado como um dos países com maior percepção de risco na Zona Euro. "Olhando para a evolução do acréscimo de juro face à Alemanha, este transaccionou num largo intervalo de 2% a 2,7% desde Março de 2014, depois de as emissões realizadas em Janeiro e Fevereiro de 2014 o terem trazido de níveis próximos de 4%", começa por dizer.
Depois, seguiu-se o anúncio, por parte do BCE, de que iria começar a comprar dívida pública dos países da Zona Euro – conhecido como "quantitative easing". Aí, o diferencial baixou para "mínimos entre Fevereiro e Maio de 2015". Depois, o spread entre os dois países voltou "para um intervalo entre 1,8% e 2,5%" de onde só se afastou "duravelmente a partir de Janeiro de 2016". E, a partir do início do ano passado, as taxas dos dois países começaram a transaccionar "num maior diferencial de 3 a 3,7% (onde se encontra actualmente)".
E o que é que aconteceu em Janeiro de 2016 para provocar essa escalada do spread? João Moreira Rato diz que foi nesse mês, "depois da decisão de transferência de obrigações do Novo Banco para o BES", que "o enfoque dos investidores passa a ser na saúde do sistema financeiro".
O problema da solidez da banca também se colocou em Itália. Mas, apesar disso, "o diferencial de juros entre Portugal e a Itália a partir de Janeiro de 2016 e até ao Outono desse ano segue um padrão similar ao da Alemanha", nota Moreira Rato. "Até Fevereiro de 2016, o diferencial" face aos transalpinos "tinha-se mantido em geral abaixo de 1%, disparando para 2,3% em Fevereiro de 2016 e estando agora a transaccionar a 1,8%".
Itália com maior capacidade para resolver problemas sem ajuda
E por que é que só Portugal está a ser castigado nos custos da dívida? "Provavelmente porque a Itália é vista como tendo mais capacidade para resolver os seus problemas bancários sem ajudas externas", argumenta, lembrando que Roma tem um "nível de dívida pública similar, mas de dívida externa e privada bastante mais baixos".
Moreira Rato diz que são três os factores que fazem a dívida portuguesa subir mais do que as outras. "Identificamos três factores determinantes nesta subida dos juros de Portugal relativamente a outros soberanos na Zona Euro: os bancos, o esgotamento e eventual remoção das políticas de compras do BCE e o início de um ciclo de subida de juros nos EUA".
João Moreira Rato, que é actualmente consultor financeiro, aplaude a forma como o IGCP está a gerir as colocações de dívida. "O IGCP continua a fazer um bom trabalho e a jogar em antecipação. A emissão com que começou o ano de 2017 voltou a aumentar a almofada de liquidez que o Estado tem vindo a manter", que permite "ir fazendo face aos pagamentos sem estar dependentes dos mercados" e "aproveitar os melhores momentos para executar a sua estratégia e evitando bater à porta dos investidores em condições de mercado desfavoráveis".
2018 pode ser um ano preocupante
As necessidades de financiamento para 2017, de 21,1 mil milhões de euros. Com a dívida que já foi colocada, a almofada que existe e a "continuação expectável de colocações de dívida por leilão e de produtos de retalho" será garantido "facilmente o resto de 2017". Mas em 2018 o caso muda de figura.
"Em 2018 pode não ser tão evidente, principalmente se o ano não começar com uma almofada de liquidez tão ampla e o BCE deixar de comprar dívida pública, como parece provável". Há ainda outra tendência que pode ser nefasta. "É também preocupante que os investidores institucionais tenham aproveitado a presença compradora do BCE para reduzir posições nas nossas obrigações (este efeito não se aplica só a nós). E 2019, 2020 e sobretudo 2021 são anos bastante mais complicados", antecipa.
"Por isso é necessário voltar a atrair os investidores institucionais estrangeiros. As condições de mercado podem não ajudar, mas para os atrair é preciso demonstrar que as obrigações portuguesas são uma oportunidade de investimento interessante. Penso que para tal é necessário, mas pode não ser suficiente, que Portugal tenha um plano credível de redução de dívida pública a prazo", sugere.
Mas há boas notícias: as contas públicas estão a evoluir de forma positiva. "Na situação em que está a nossa economia, esse plano parece bastante exequível". É necessário, contudo, "fazer um esforço adicional de consolidação das contas públicas, passando o saldo primário (sem contar os juros da dívida pública) de 2,2% do PIB para 2,8%". E com "um crescimento real do PIB da ordem dos 1,5% e um deflator de 1,5%", ou seja, 3% de crescimento nominal do PIB, "a dívida pública pode diminuir dois pontos percentuais por ano".
Numa nota de análise publicada há uma semana, a Natixis concluía que "não há características fundamentais em Portugal que possam explicar o elevado nível das taxas de juro de longo prazo. Por isso, pode ser um caso ou de efeito da dimensão da dívida ou um equilíbrio" do mercado.