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OPEP+ num dilema: inflação ou perda de receitas
A OPEP e os seus aliados decidem esta quinta-feira a sua política de produção de crude em agosto. No radar está o maior consumo, o fator Irão e o atraso do “shale” na retoma dos níveis pré-pandemia.
Os países-membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo e os seus 10 aliados – o chamado grupo OPEP+, onde se inclui a Rússia – reúnem-se esta quinta-feira para decidirem o rumo da sua oferta a partir de agosto. Os mercados estão expectantes e os investidores aguardam pelo número que vai ser lançado.
A convicção dominante é a de que a OPEP+ irá aumentar a sua oferta em meio milhão de barris por dia já a partir do próximo mês, que acrescerá aos cerca de dois milhões de barris diários que reentraram no mercado desde o início do ano. Tendo em conta o acentuado corte de produção que foi definido em 2020, por força da queda da procura devido à pandemia, permanecem no subsolo cerca de seis milhões de barris à espera de verem a luz do dia – mas não tudo para já, uma vez que inundar o mercado significaria fazer cair os preços da matéria-prima, algo que não é desejado pelos produtores dependentes destas receitas nem pelas empresas com custos de extração mais elevados, como é o caso do petróleo de xisto (“shale oil”).
Atendendo às pressões dos países importadores, como a Índia, para que os preços não subam muito mais – agravando as pressões inflacionistas –, a OPEP+ tem de tentar encontrar um meio-termo. Ou seja, definir uma oferta adicional que não faça os preços dispararem mas que também não os deixe afundar. E serão 500.000 barris/dia de oferta adicional suficientes para manter um equilíbrio do mercado?
Para Giovanni Staunovo, analista de matérias-primas do UBS, “atendendo ao forte incremento da procura que antevemos para este verão, achamos que o aumento de produção a ser decidido pela OPEP+ será modesto”. “Em nosso entender, a oferta no mercado petrolífero continua a ser insuficiente, uma vez que os aumentos de produção ficam aquém das estimativas de maior consumo nos próximos meses. Por isso mesmo, e dado que os stocks de crude deverão diminuir ainda mais, estimamos que os preços do petróleo continuem a valorizar no terceiro trimestre deste ano”, sublinha o estratego do banco suíço.
Já Ricardo Evangelista, analista sénior da ActivTrades, refere que, “apesar de alguma preocupação face ao aumento de novos casos de covid-19 na região Ásia-Pacífico, que ajuda a explicar a queda no preço do barril em inícios desta semana, a expectativa dominante nos mercados aponta para a continuação do aumento da procura, sobretudo na Europa, EUA e China”. Neste cenário, frisa, “espera-se que os países da OPEP+ se decidam por um aumento dos atuais limites de produção, de forma a evitar uma subida descontrolada dos preços”.
“O consenso geral nos mercados é de que o grupo de países produtores chegará a acordo para aumentar a quota diária em meio milhão de barris durante o mês de agosto. Menos do que isto deverá provocar uma nova escalada nos preços”, diz Ricardo Evangelista.
Reuniões mensais permitem ajustes rápidos
E sobre se o aumento de casos de covid-19, que se está a observar um pouco por todo o mundo, poderá travar uma maior abertura de torneiras por parte da OPEP+, já que começam a ser de novo impostas restrições à circulação em muitas regiões, nomeadamente na Ásia e Europa, Staunovo considera que o facto de o cartel e os seus aliados realizarem agora reuniões mensais – estratégia em vigor desde o início deste ano – “deixa ao grupo flexibilidade suficiente para ajustar a sua política se esta situação se deteriorar”.
Uma vez mais, espera-se que a Arábia Saudita defenda alguma contenção na oferta adicional de crude, ao passo que a Rússia e os Emirados Árabes Unidos deverão mostrar vontade de escoar mais. Na última reunião, o consenso foi alcançado em meia hora, mas porque não havia novas quotas a decidir. Já estavam definidos os níveis de produção de julho, que todos concordaram em manter.
O Irão e o “shale oil”
Um fator que a OPEP+ terá esta quinta-feira em conta é o da possibilidade de o Irão exportar mais crude em caso de restabelecimento do acordo nuclear. Nesse caso, Teerão poderá aumentar a sua produção em 750.000 barris por dia até ao final do ano face ao volume atual, segundo estimativas recentes da Agência Internacional da Energia (AIE). Ainda assim, o impacto deste crude extra vai depender do ritmo do aumento da procura, com o cartel e os seus parceiros a poderem decidir espremer novamente a oferta para compensar.
Também o facto de os produtores de “shale oil” não estarem a conseguir colocar rapidamente mais ouro negro no mercado, devido ao desinvestimento no período da pandemia e à crescente pressão dos acionistas para uma contenção nos gastos – para que haja uma redução nas emissões de carbono mas também para receberem uma maior fatia do bolo das remunerações –, contribuirá para que a OPEP+ continue a ser preponderante para o rumo dos preços nos próximos tempos.
Mas o cenário também pode ser o inverso. Se o Irão regressar em força ao mercado exportador e a produção de petróleo de xisto nos EUA começar a acelerar, no próximo ano poderá haver excesso de oferta. E é com essas incertezas em mente que a OPEP+ deverá ainda debater esta quinta-feira uma extensão do acordo de redução da oferta para lá do prazo definido, que é abril de 2022.
No ano passado, o corte de produção da OPEP+ atingiu um recorde de 9,7 milhões de barris por dia, devido à queda de 8,8 milhões de barris diários da procura em pleno confinamento geral. No mês que agora começa, esse esforço de retirada de petróleo do mercado por parte da OPEP e aliados está reduzido a 5,8 milhões de barris diários. Resta saber que plafond será acertado para agosto. E se a pandemia não volta a deixar mais carros parados e aviões no chão.