Notícia
“Vivemos num mundo inquietantemente novo”
Defendendo que “a grande falha” no Compromisso para o Crescimento Verde – cujas metas e medidas o VER analisa nesta edição – “reside no esquecimento da inevitável articulação entre a crise em que continuamos mergulhados e a viabilidade da proposta, nomeadamente ao nível do financiamento”, Viriato Soromenho-Marques acredita que a mesma “requereria mais recursos. Provavelmente do pacote que Juncker prometeu para combater o desemprego”. Para o professor e especialista em Ambiente e Política, “a actual desordem (política) europeia é incapaz de garantir” um investimento sério nesta área. Mas “Portugal não pode cruzar os braços”
A proposta de Compromisso para o Crescimento Verde sublinha a importância de estabelecer uma "visão pós-troika de desenvolvimento a prazo", que abranja um ciclo de investimentos em áreas estratégicas como a economia verde. Em que medida será aproveitado o novo ciclo de fundos comunitários, e como é que encara o potencial deste sector para gerar emprego e crescimento sustentável, face ao estado real do País?
Confesso que não gosto da moda internacional do "crescimento verde". Perdemos com essa fórmula o rigor que ganhámos em décadas de discussão sobre as diferenças económicas e filosóficas entre desenvolvimento sustentável (que incorpora a necessidade de mudança de paradigma) e crescimento (que se concentra apenas na reprodução do capital, esquecendo os custos e externalidades ambientais). Mas confessada essa divergência conceptual, parece-me que o documento governamental vai na direcção correcta, tendo uma fundamentação, no essencial, correcta.
"Portugal é um dos países europeus mais vulneráveis aos efeitos das alterações climáticas"
Trata-se claramente do contributo pessoal de Jorge Moreira da Silva, alguém com um passado de mérito e competência firmada na área do ambiente e da energia. Importa não esquecer, contudo, que este governo está longe de acompanhar o entusiasmo deste ministro (que, aliás, só nele entrou em Julho de 2013) com as questões ambientais. Importa não esquecer que em Fevereiro de 2013 este governo reduziu as metas de produção de electricidade renovável para 2020. Elas passaram de 6,8 para 5,3 GW (na eólica), e de 1,5 para 0,55 GW (na solar).
A grande falha deste documento reside no esquecimento da inevitável articulação entre a crise europeia em que continuamos mergulhados e a viabilidade desta proposta, nomeadamente ao nível do financiamento. O Pacote financeiro 2014-2020 não me parece suficiente. O País vai continuar sufocado pelo serviço da dívida.
As empresas estão descapitalizadas, e a banca nacional está mais preocupada em manter-se a flutuar do que em providenciar à economia real recursos de que carece para si própria. A viabilidade desta estratégia requereria mais recursos europeus, provavelmente do pacote de 300 mil milhões de euros que Juncker prometeu para combater o desemprego em toda a Europa, mas que ainda está ao nível da promessa…
De que modo permitirá esta "aposta estratégica e prioritária" contribuir para combater a crise climática; resolver os problemas estruturais que limitam o elevado potencial dos recursos naturais em Portugal; e explorar as oportunidades económicas que resultam do aumento da procura de bens e serviços verdes, como anunciou o Governo?
Portugal é um dos países europeus mais vulneráveis aos efeitos destruidores das alterações climáticas. Por isso, em primeiro lugar, uma boa política ambiental é uma prioridade em termos de segurança nacional. Por outro lado, este programa contribui para a melhoria da nossa balança comercial e para o desenvolvimento de tecnologias e patentes nacionais (com respectivas exportações) na área da electricidade de origem renovável. Apesar de corresponder apenas a 21% da energia final consumida, a verdade é que Portugal é hoje um dos dez países do mundo com maior produção eléctrica a partir das renováveis.
"Muitos dos ataques a esta proposta têm sido movidos por puro sectarismo. Mas o governo terá de prestar contas"
Em 2013, 58,3% da electricidade teve origem em recursos endógenos renováveis (hídrica, eólica e solar). Em 2013, as renováveis terão contribuído para diminuir um milhão de toneladas em emissões de GEE, tendo também permitido um alívio de 850 milhões de euros na importação de combustíveis fósseis.
Enquanto especialista nas áreas ambiental e política, parecem-lhe exequíveis as metas de crescimento do VAB "verde" e de duplicação dos postos de trabalho "verdes" para 2020 e 2030, anunciadas pelo Ministro do Ambiente na apresentação do documento?
Diria até que algumas das estimativas numéricas, em vez de serem visionárias, podem mesmo ser consideradas conservadoras. O crescimento de 31% para 40% da incorporação das energias renováveis no consumo final de energia entre 2020 e 2030 parece-me modesto. O mesmo para o incremento dos empregos na área ambiental no mesmo período (de 95 mil para 140 mil). Num contexto de renovação do entusiasmo no projecto europeu, o crescimento destes indicadores poderá ser muitíssimo mais rápido.
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