Outros sites Medialivre
Notícias em Destaque
Notícia

Residentes não habituais: apenas boas intenções?

Os últimos meses têm sido pródigos em alterações de natureza fiscal, cujo impacto na vida das empresas e dos cidadãos não poderá deixar de considerar-se significativo. Entre a produção legislativa recente, inclui-se um regime aplicável a residentes fiscais não...

25 de Março de 2010 às 14:41
  • ...
O regime para residentes fiscais não habituais visava atrair quadros para Portugal, através de um regime competitivo. Mas há muitos obstáculos pelo caminho.

Os últimos meses têm sido pródigos em alterações de natureza fiscal, cujo impacto na vida das empresas e dos cidadãos não poderá deixar de considerar-se significativo. Entre a produção legislativa recente, inclui-se um regime aplicável a residentes fiscais não habituais (RNH) em sede de IRS, aprovado através do Decreto-Lei nº 249/2009, de 23 de Setembro.

Este regime, inovador no contexto da legislação fiscal portuguesa, constitui um factor de estímulo da competitividade fiscal internacional do país, visando, nomeadamente, atrair mão-de-obra qualificada e iniciativa empresarial externa em actividades consideradas como de "elevado valor acrescentado", como pólos de excelência tecnológica e centros de serviços partilhados. Aos contribuintes que desenvolvam estas actividades, decidiu o legislador conferir um tratamento fiscal benéfico, traduzido na tributação a uma taxa fixa de 20% do rendimento das categorias A e B de IRS obtido em actividades relevantes, conforme Portaria recentemente publicada.

Adicionalmente, os RNH poderão beneficiar de isenção de tributação de rendimentos de fonte estrangeira, verificadas algumas condições, muito genericamente: tributação ou possibilidade de tributação no estado da fonte do rendimento.

As características do regime sugerem que o mesmo poderá igualmente ser um factor de atracção de contribuintes de elevados rendimentos ("ultra" e "high net worth individuals"), com resultados positivos na deslocação de centros de decisão para Portugal e na aquisição de imobiliário em zonas privilegiadas, como Lisboa, Porto, Algarve e Madeira.

O regime é aplicável ao ano de 2009 e seguintes, dele podendo beneficiar as pessoas singulares que, qualificando como residentes fiscais em Portugal num dado ano, não tenham sido tributadas como tal em qualquer um dos cinco anos anteriores.

Porém, subsistem até à data diversas dificuldades, as quais, na prática, impossibilitam a aplicação do regime. Desde logo, em relação ao ano de 2009, atento o facto de as declarações de IRS não preverem a opção pelo regime. Por outro lado, relativamente aos contribuintes que possam adquirir este estatuto em 2010, continua a não ser possível o seu registo (directo) como RNH junto das autoridades fiscais. Estes factos não poderão deixar de causar alguma perplexidade, atenta a relevância do regime.

Dada a sua juventude, o regime suscita igualmente outras questões, nomeadamente no que se refere às actividades de "elevado valor acrescentado". A nosso ver, serão de ponderar alterações à redacção actual da tabela de actividades, nomeadamente no que se refere aos "investidores, administradores e gestores", a quem são impostas condições de aplicação do regime que entendemos excessivamente restritivas. Parece-nos, igualmente, justificar-se a inclusão de outras actividades na tabela, que correspondam a desígnios estratégicos do país e que a primeira versão da tabela não contemplou. São os casos, por exemplo, do turismo e da actividade de actuários.

Pelas suas características, o regime dos RNH pode, efectivamente, configurar um importante mecanismo de reforço da competitividade fiscal externa portuguesa e de captação de receita tributária adicional que, de outro modo, não seria obtida. Deste ponto de vista, o regime pode assumir particular importância num momento em que, sob a pressão orçamental, é anunciada a intenção de eliminar o actual tratamento favorável em IRS das mais-valias bolsistas, até agora um aspecto bastante competitivo do nosso sistema fiscal.

Urge, assim, o esclarecimento de um conjunto de questões que possibilitem que o regime "saia do papel", fazendo justiça às elevadas expectativas que a sua publicação veio criar.



Tome nota



1. O Decreto-Lei nº 249/2009 veio aprovar um regime fiscal em sede de IRS aplicável a residentes não habituais (RNH);
2. Qualificam para o regime, os contribuintes que sejam considerados como residentes fiscais em Portugal em 2009 ou nos anos seguintes, não tendo sido tributados como tal em qualquer um dos cinco anos anteriores;
3. O regime prevê a tributação a uma taxa fixa de 20% dos rendimentos do trabalho dependente ou independente em actividades de "elevado valor acrescentado", bem como a isenção de tributação de rendimentos de fonte estrangeira, verificadas algumas condições;
4. Na prática, é ainda difícil proceder ao registo junto da Administração Fiscal da qualidade de RNH ou entregar a declaração de IRS para 2009 como tal, pelo que a aplicação do regime é, para já, desnecessariamente onerosa;
5. Subsiste um conjunto de questões quanto à aplicação do regime, nomeadamente quanto às actividades consideradas como de "elevado valor acrescentado";
6. Estando a efectiva aplicação do regime dependente da clarificação dos aspectos referidos, espera-se que possa vir a ter lugar o mais brevemente possível.





Ver comentários
Outras Notícias
Publicidade
C•Studio