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Estaleiros navais: “98% dos trabalhadores da melhor empresa de soldadura da Holanda são portugueses. Nós temos falta de mão-de-obra qualificada”
Num debate sobre o estado do setor, todos os estaleiros navais portugueses se queixaram da falta de mão-de-obra qualificada. Mais: “Por 20 pessoas que são formadas, conseguimos apenas reter uma”, lamentou um gestor da Lisnave.
"O que me deixa triste é saber que na melhor empresa de soldadura da Holanda, 98% dos seus trabalhadores são portugueses. E estamos a discutir que temos falta de mão-de-obra qualificada", atirou Jorge Martins, fundador da Neptune Devotion, empresa com estaleiros navais em Aveiro.
Jorge Martins, que abandonou há quase quatro anos o cargo de CEO da multinacional de consultoria e tecnologia Capgemini Portugal para se dedicar à personalização de embarcações de recreio ou desporto até 55 pés, falava num debate sobre o presente e o futuro da indústria naval nacional, no âmbito da Porto Maritime Week, uma iniciativa promovida pelo Transportes & Negócios e que decorre até amanhã, na cidade Invicta.
Com a construção naval portuguesa a registar um crescimento da faturação de 26% em 2020 face ao ano anterior, para cerca de 250 milhões de euros, o setor debate-se com alguns desafios pertinentes, como "a falta de mão-de-obra qualificada, o envelhecimento da força de trabalho e das infraestruturas fabris, a regulamentação desatualizada e o impacto das questões ambientais, a concorrência dos países com baixos custos de produção e as regras da concorrência internacionais desleais", relatou o Transportes & Negócios.
"Para nós os grandes desafios são a escassez de mão-de-obra qualificada, alguns custos de contexto que continuamos a ter e o aumento do custo das matérias-primas, muito por culpa das disrupções que estão a acontecer no setor do ‘shipping’", sinalizou Francisco Barbosa, diretor-geral da Navaltagus, estaleiros do grupo ETE, ao que qual também pertence a Navalrocha.
"Estamos a procurar novos nichos de mercado para nos reposicionarmos e crescermos mais, mas sabemos que a competição é grande, principalmente na área da construção naval, com a concorrência dos estaleiros turcos, que possuem mão-de-obra qualificada muito mais barata", afirmou o mesmo gestor.
Luís Braga, diretor comercial da Lisnave, também referiu que as grandes dificuldades com que a empresa portuguesa se depara estão relacionadas com a falta de mão-de-obra qualificada e a concorrência dos estaleiros, que conseguem praticar preços mais baixos.
"Para quem a Lisnave perde mais reparações é para a Turquia. Mas depois existe um outro tipo de concorrência de que não se fala tanto. A Lisnave poderá ser, atualmente, quem mais forma mão-de-obra qualificada no país e as pessoas depois de terem o certificado na mão emigram para locais onde são mais bem pagas, nomeadamente para a Holanda. Tentamos ter uma retenção na área da formação e recrutamento para termos mais pessoas qualificadas e de preferência portuguesas, mas a verdade é que por 20 pessoas que são formadas, conseguimos apenas reter uma", lamentou.
"A maior parte dos clientes optam apenas pela solução mais barata e por isso é que escolhem os estaleiros do Médio Oriente, como os da Turquia", rematou.
"Também temos o mesmo problema da Lisnave ao nível da formação de quadros técnicos", afirmou Vítor Figueiredo, administrador da West Sea, a empresa que corporiza a indústria naval do grupo Martifer.
"Mas esta não é só uma questão de remuneração - há outros fatores, como a progressão na carreira, entre outros", ressalvou Figueiredo.