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Pandemia ameaça império imobiliário de 22 mil milhões do dono do Chrysler
Em pouco mais de duas décadas, René Benko passou de um jovem que não concluiu o ensino secundário e que fazia renovações de sótãos na Áustria a um magnata ao comando de um império imobiliário global de 22 mil milhões de dólares.
Em Nova Iorque, é dono do icónico Chrysler Building. Em Viena, do luxuoso Park Hyatt Hotel. Em Berlim, do amplo armazém de lojas KaDeWe.
A ascensão de Benko foi impulsionada por uma aposta de que o valor dos seus imóveis só pode ir numa direção: para cima. A estratégia do empresário de 43 anos tem como base a teoria de que apenas a Igreja Católica e a Rainha de Inglaterra se podem orgulhar de um portefólio comparável de locais exclusivos, como ele gosta de dizer aos empregados.
Os valores totais dos ativos na sua unidade principal - a Signa Prime Selection - devem ter aumentado cerca de 10% em 2020, abrindo caminho para mais um ano de bons resultados, segundo fontes próximas das finanças do grupo. Em contraste, a pandemia obriga outras gestoras imobiliárias a reduzirem o valor estimado de muitas lojas, centros comerciais e hotéis centrais.
Uma análise de centenas de documentos regulatórios austríacos - como relatórios anuais e de reuniões de acionistas a portas fechadas - e entrevistas com dezenas de pessoas com conhecimento das operações de Benko oferecem um vislumbre sem precedentes da estrutura da sua rede e revelam o quanto o seu negócio depende de que os valores dos ativos continuem a subir.
Mesmo uma mera estagnação no valor contabilístico das suas propriedades poderia impactar os lucros, enquanto uma queda pioraria as métricas financeiras que são essenciais para o seu financiamento.
O crescimento do mercado imobiliário na última década sustentou a capacidade da empresa de captar recursos e pagar dividendos aos investidores, ajudando a atrair companhias como a Madison International Realty, de Nova Iorque, a família Peugeot, de França, e a seguradora alemã R+V Versicherung.
Mas, com os confinamentos da pandemia a deixarem grandes cidades com lojas e hotéis vazios, esse modelo corre o risco de colidir com as forças do mercado.
"Mesmo imóveis de retalho bem-posicionados em excelentes localizações centrais devem ter perdido um certo valor" no ano passado, disse Jakub Caithaml, analista do setor imobiliário da corretora tcheca Wood & Co., que cobre gestoras imobiliárias austríacas, mas não a Signa Prime, que não é cotada. "Sem surpresa, o mesmo se aplica a hotéis de primeira classe".
Para as empresas de Benko, a reviravolta no mercado coincide com o maior escrutínio de agências reguladoras do setor financeiro. Os reguladores perceberam o papel cada vez mais importante do seu império nos empréstimos imobiliários austríacos.
Em 2019, a Autoridade do Mercado Financeiro (FMA, na sigla em inglês) do país expressou preocupação sobre a exposição do Raiffeisen Bank International depois da participação do banco num empréstimo sindicado à Signa Prime, segundo mensagens de email entre funcionários da FMA vistas pela Bloomberg News. Tanto o banco como o regulador não quiseram comentar.
No início do mês, o Conselho de Estabilidade do Mercado Financeiro do país começou a monitorizar "riscos sistémicos decorrentes do financiamento de imóveis comerciais muito de perto", porque alguns setores, especialmente os relacionados ao retalho e turismo, foram "atingidos de forma particularmente dura pela pandemia", disse em comunicado.
Benko cresceu num pequeno apartamento em Innsbruck, onde a mãe trabalhava numa creche e o pai numa concessionária de serviços públicos municipal. Ainda no ensino secundário, o empresário vendia apólices de seguro e outros serviços financeiros para a AWD Holding e entrou no ramo imobiliário ajudando a transformar sótãos empoeirados em espaços habitáveis. Faltou a tantas aulas que não conseguiu fazer os exames finais.