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O "bad boy" das finanças brasileiras agora é um criador de gado bilionário

Dantas foi preso por tentativa de suborno, ficou brevemente na cadeia e o seu fundo foi obrigado a abrir mão temporariamente de alguns activos. Uma década depois, Dantas está a apostar num regresso triunfal – como criador de gado e especulador de propriedades rurais.

Reuters
17 de Junho de 2017 às 15:00
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Daniel Dantas foi considerado o "bad boy" do sector financeiro brasileiro por muito tempo.

Perspicaz, agressivo e veterano de lutas judiciais, foi motivo de revolta nacional quando comprou a Brasil Telecom na década de 1990 e depois se desentendeu publicamente com seus sócios do Citigroup durante anos. Mais tarde, envolvido num escândalo de corrupção em 2008, Dantas foi preso por tentativa de suborno, ficou brevemente na cadeia e o seu fundo foi obrigado a abrir mão temporariamente de alguns activos.

 

Uma década depois, Dantas está a apostar num regresso triunfal – como criador de gado, especulador de propriedades rurais e minerador.

 

E Dantas nem come carne. Segundo pessoas com conhecimento do assunto, o Opportunity Fund do qual é cofundador, tem mais terras - aproximadamente 500.000 hectares – do que qualquer outra empresa no Brasil e estuda abrir o capital do negócio. Em paralelo, Dantas está a avaliar mais investimentos na área da inteligência artificial.

 

As coisas estão a correr tão bem que Dantas entrou pela primeira vez no Bloomberg Billionaires Index. Uma nova análise indica que o património do investidor já atingiu 1,8 mil milhões de dólares.

 

Dantas, que mantém os seus activos em entidades complexas, preferiu não fazer comentários sobre a sua fortuna. Junto com a irmã Verônica e o sócio de longa data Dório Ferman, Dantas controla fundos que gerem 26 mil milhões de reais (8 mil milhões de dólares) em activos, mais do dobro do que tinha quando foi preso há uma década atrás. O montante inclui aproximadamente 4,5 mil milhões de reais que foram desbloqueados em Julho do ano passado, depois da justiça brasileira ter anulado a Operação Satiagraha e a pena de 10 anos de Dantas.

 

Mas, como sempre, Dantas não fica longe da polémica. Cerca de 700 pessoas estão acampadas em terras do Opportunity exigindo direito de propriedade. A divisão pecuária do fundo é acusada de criar gado ilegalmente em fazendas embargadas, que foram desmatadas de forma ilícita antes de serem adquiridas pelo fundo, o que a instituição nega.

 

Até certo ponto, Dantas pode dar-se ao luxo de ser tão ousado porque saiu ileso da Operação Lava Jato. Agora já não enfrenta a pressão do Partido dos Trabalhadores.

 

"Dantas está a aproveitar o momento de fragilidade do PT", disse Sergio Lazzarini, professor do Insper, em São Paulo. "Mas não tem santo nesta história."

O fundo de Dantas tem mais terras - aproximadamente 500.000 hectares – do que qualquer outra empresa no Brasil
O fundo de Dantas tem mais terras - aproximadamente 500.000 hectares – do que qualquer outra empresa no Brasil Bloomberg

 

Clã ilustre

 

Dantas vem de uma tradicional família de magnatas e políticos. O avô do seu avô, Cícero Dantas Martins, foi criador de gado com título de nobre que dá nome a uma cidade na Bahia.

 

Depois de administrar dinheiro para um banqueiro no Rio de Janeiro, Dantas, que tem PhD em Economia, juntou-se a Ferman para fundar o Opportunity Fund, em 1994.

 

Ficou rico e ganhou fama como empresário "malandro" durante a onda de privatizações da década de 1990. Também entrou em diversas polémicas com os seus sócios.

 

O Opportunity Fund liderou um consórcio que incluía a Telecom Italia e o Citibank para comprar a Brasil Telecom. O Opportunity e a Telecom Italia entraram em conflito e depois aconteceu o mesmo com o Citi. Em 2008, processado pelo Citi, saiu da Brasil Telecom (que mais tarde seria transformada na Oi).

 

Virar a mesa

 

As coisas pioraram muito naquele ano com a Operação Satiagraha. Dantas foi preso duas vezes e ficou na cadeia alguns dias por tentar subornar um polícia para manter o seu nome fora de uma investigação, além de outras acusações. Demorou alguns anos e diversas manobras jurídicas, mas Dantas conseguiu que o processo fosse anulado.

 

O principal delegado do caso, Protógenes Queiroz, após um período como deputado federal pelo PCdoB, vive na Suíça onde luta contra uma ordem de prisão para cumprir uma pena de dois anos por violação de sigilo.

 

Em 2015, o Supremo Tribunal Federal manteve uma decisão anterior de anular a Operação Satiagraha, após o habeas corpus para libertação de Dantas ter sido criticado por 45 promotores como uma "descarada afronta às instituições democráticas’’ brasileiras e atacado por mais de 130 juízes por ignorar regras processuais, segundo cartas publicadas na imprensa.

 

Dantas também fez uma ofensiva contra o Citi. Num processo movido na justiça federal em Nova Iorque, alegou que o banco conspirou com autoridades brasileiras para ficar com a sua participação na Brasil Telecom há uma década. Alega que foi punido por resistir a pedidos por dinheiro de campanha. No pedido para anular a queixa, o Citi afirmou que Dantas está a tentar requentar acusações antigas sem ter provas.

 

Crescimento dos negócios

 

Enquanto isso, os seus negócios crescem. Há três anos, a mina Baratinha, detida pelo Opportunity, entrou em operação em Minas Gerais e agora produz cerca de 2 milhões de toneladas de minério de ferro por ano, gerando um fluxo de caixa que está a financiar outros oito projectos de exploração, que abrangem ouro, fosfatos, minerais raros e água mineral, de acordo com uma pessoa que pediu anonimato por não ter autorização para falar sobre o assunto.

 

No Pará, outro empreendimento do Opportunity que está em franca expansão é a Agropecuária Santa Bárbara Xinguara. Mais de duas dezenas de fazendas da Santa Bárbara que foram bloqueadas anteriormente na Satiagraha foram libertadas pela justiça a partir de 2012. Numa visita recente, um dos executivos levou quase uma hora para cruzar uma das fazendas de camião, onde os vaqueiros usam camisetas com o slogan do fundo: "Atitude de dono’’.

 

Preocupações com segurança

 

Membros do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ocupam duas fazendas da Santa Bárbara
Membros do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ocupam duas fazendas da Santa Bárbara Bloomberg

Mas a polémica persegue Dantas. Membros do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ocupam duas fazendas da Santa Bárbara há nove anos e um executivo da empresa recusou-se a visitar o local para evitar conflitos. A área lembra uma zona de guerra, com escombros queimados de uma fábrica, um laboratório de genética e escritórios. Os militantes protestam contra a distribuição de terras no Brasil, onde 1% dos fazendeiros são donos de metade do território agrícola.

"Há tanto concentrado nas mãos de poucos como Dantas", disse Pedro Pereira da Silva, que já trabalhou como empregado de mesa e hoje é um dos 700 acampados numa fazenda da Santa Barbara. "É financeiramente impossível para nós."

 

A Santa Bárbara está a negociar a venda de duas fazendas ao governo, para serem ocupadas pelos sem-terra. O preço potencial de venda — aproximadamente 100 milhões de reais — é mais do dobro do que a Santa Bárbara pagou originalmente há uma década. Não é tanto quanto Dantas pedia, considerando a inflação, mas pelo menos o criador de gado vegetariano poderá livrar-se de outra briga.

 

Título original em inglês: Bad Boy of Brazil Finance Is Now a Cattle-Ranching Billionaire

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