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Alterações propostas por Bruxelas arriscam complicar (ainda mais) regras orçamentais

Simplificar as regras europeias é um dos objetivos da revisão proposta por Bruxelas, mas ao centrar a discussão num indicador cujo cálculo não é linear pode complicar, ainda mais, as coisas. O alerta foi deixado numa conferência em Lisboa.

A Comissão Europeia propõe redirecionar dez mil milhões de euros do React-EU que ainda estão disponíveis.
Yves Herman/Reuters
21 de Novembro de 2022 às 16:03
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As alterações às regras orçamentais europeias propostas pela Comissão Europeia podem complicar ainda mais a sua aplicação, por centrarem o objetivo de redução da dívida num limiar da despesa, que contém, no seu cálculo, uma componente não observável. O alerta foi deixado por vários economistas numa conferência em Lisboa.


Há quase duas semanas, a Comissão Europeia apresentou uma proposta para a revisão das regras europeias: embora mantenha a meta dos 3% do défice e dos 60% da dívida, elimina a obrigatoriedade da redução anual de 1/20 da dívida que excede esse limite. Esta era uma regra considerada complexa e exigente, e que os países não estavam, na sua generalidade, a cumprir.

Além disso, dá um prazo de quatro anos para os países mais endividados definirem uma trajetória de redução da dívida, com base num plano definido pelos próprios Estados-membros mas que parte de regras comuns e que têm como elemento central um teto para a evolução da despesa pública. 


É este indicador - a despesa primária líquida - que pode vir a complicar as coisas, alertaram peritos em finanças públicas das principais instituições económicas portuguesas, num 'workshop' promovido pela representação da Comissão Europeia em Portugal. Mas vamos por partes: a Comissão Europeia define, na sua comunicação, a despesa primária líquida como a despesa retirando os encargos com juros, com financiamento comunitário, retirando-lhe também a componente cíclica de subsídios de desemprego e as medidas discricionárias do lado da receita.


Carlos Marinheiro, vogal não executivo do Conselho das Finanças Públicas (CFP), alerta para dois elementos que trazem "complexidade ao índice", apesar de a despesa pública ser observável. Por um lado, a despesa com subsídios de desemprego que depende do ciclo económico, que o economista da Universidade de Coimbra  considera ser uma "componente não observável". Por outro, o cálculo das medidas discriconárias. "Como é calculado e por quem?", começou por questionar Carlos Marinheiro no evento que decorreu esta segunda-feira, 21 de novembro, em Lisboa. 


"De momento só a comissão calcula e com grandes diferenças face aos cálculos dos Estados-membros", disse o vogal não executivo do CFP (embora falando em nome próprio). "Não é simples", frisou. 


Também Cláudia Braz, coordenadora da área de finanças públicas do Banco de Portugal, alertou para a "complexidade" do indicador, considerando que é "muito complicado" de calcular.


"É difícil avaliar concretamente o que a proposta implica", lamentou. A economista deu depois o exemplo de França para dizer que não bastará ao governo francês ter um défice abaixo de 3% para conseguir reduzir a sua dívida nos próximos anos. 


Por sua vez, Ricardo Paes Mamede, professor de economia do ISCTE, concluiu que esta proposta "não cumpre os objetivos de simplificação" a que a Comissão se tinha proposto. E lamentou que, na comunicação apresentada há duas semanas, o executivo comunitário fale em sistema das pensões. "Arrepia-me", disse o economista, receando que exista, com esta proposta uma "tendência maior" para as instituições europeias (Comissão e Conselho) avaliem políticas sem terem mandato para isso. 


O entendimento da Comissão Europeia é que a despesa primária líquida é observável, embora admita que há "valores não objetivos" no indicador. Fonte europeia mostrou disponibilidade de Bruxelas para "conversar" sobre o tema, frisando ainda assim que as diferenças de cálculo entre governos e executivo comunitário não é assim tão grande. 

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