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Futuro do urbanismo em Portugal poderá passar pelas cidades de 15 minutos

Em declarações à agência Lusa, dois investigadores portugueses sublinharam que, no último ano, as pessoas foram impulsionadas a recorrer ao comércio e outros serviços mais próximos, a uma distância de circulação a pé ou em bicicleta.

Miguel Baltazar/Negócios
20 de Março de 2021 às 11:04
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Especialistas em Geografia Humana perspetivam que o futuro pós-pandemia do urbanismo em Portugal poderá passar pelo conceito de 'cidade de 15 minutos', que aposta numa cultura de proximidade, em que as pessoas têm acesso rápido aos serviços essenciais sem usar automóvel.

Em declarações à agência Lusa, dois investigadores portugueses sublinharam que, no último ano, as pessoas foram impulsionadas a recorrer ao comércio e outros serviços mais próximos, a uma distância de circulação a pé ou em bicicleta.

"A cidade dos 15 minutos é: todas as pessoas - todos os residentes nas cidades - devem poder ter acesso a equipamentos, comércio e serviços essenciais até uma distância a andar a pé de 15 minutos", explicou João Ferrão, doutorado em Geografia Humana e investigador coordenador aposentado do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa.

De acordo com o especialista, que foi secretário de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades, o novo conceito de cidade de proximidade foi idealizado por um académico franco-colombiano, Carlos Moreno, e pretende terminar com a fragmentação dos grandes centros urbanos, em que muitas atividades estão dependentes de viagens longas em viatura própria ou de transporte público.

"Tem a ver com a ótica do planeamento urbano e com quem intervém nesse planeamento urbano, que são basicamente as autarquias. Há exemplos muito interessantes, [...] mas há muito essa ideia de cidade de 15 minutos, que é olhar para cidade com uma visão oposta à cidade da mobilidade, em que as pessoas circulam muito -- moram num sítio, trabalham no outro, vão fazer compras no outro", referiu, lembrando o exemplo de Carlos Moreno, que ajudou a presidente da Câmara de Paris, Anne Hidalgo, a aplicar o conceito na capital francesa.

Para João Ferrão, este novo ideal de cidade, que foi desenvolvido pela cidade de Paris durante a pandemia, propõe um esquema de vida comunitária e de micromobilidade como se se passasse a viver numa nova aldeia ou vila.

"Estes espaços são abertos, porque todos nós hoje vivemos mesmo nos vários mundos virtuais. Não é a velha vila com uma muralha à volta, não há muralha nenhuma, o que há é a possibilidade do ponto de vista da oportunidade das pessoas. O que há é a possibilidade de a pessoa, andando até 15 minutos, encontrar nesse raio -- o raio dos 15 minutos a pé -- aquilo que é essencial", indicou.

Também o professor da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa João Seixas considerou que a pandemia "veio colocar uma nova camada de questões às pressões e às problemáticas e até às ansiedades que já vinham de trás", e que poderá "haver uma revalorização de uma proximidade com muita diversidade humana".

"A biodiversidade também é muito importante nos habitats da Humanidade. Esta possibilidade de usos mais diversos à pequena escala em cada bairro pode aplicar-se também às mais pequenas escalas, desde a escala de uma rua até a uma escala, por exemplo, dos equipamentos, uma escola, uma universidade, uma estação do metropolitano, teatros, centros de saúde até - podem multiplicar-se em diferentes tipos de atividade. O urbanismo deixa de ser gerido por critérios meramente monofuncionais", analisou.

Neste contexto, esses espaços podem ter, além dos seus usos específicos e originais, atividades de acolhimento e agregação de comunidades.

Segundo João Seixas, mestre em Geografia Humana e doutorado em Geografia, a União Europeia já está a preparar "há muito tempo", com consultores e especialistas, a adoção do conceito da cidade de 15 minutos noutros países.

"É um urbanismo que já não é apenas de gestão do espaço do território, mas é também do tempo, do tempo dos quotidianos, do tempo dos fins de semana, dos tempos dos meses, [do tempo] das pessoas. Isto é uma verdadeira revolução silenciosa, mas com um enorme impacto para o nosso futuro, porque pode, de facto, fazer com que haja efeitos profundíssimos, desde logo nas questões ecológicas", frisou.

Alertando para a urgência de as cidades tratarem das estratégias para o futuro, João Seixas ressalvou que "é muito importante" as sociedades desenvolverem o sentido de comunidade e que haverá "ganhos na ecologia absolutamente extraordinários", porque as pessoas não vão precisar de se deslocar de uma forma muito distante, reduzindo-se as emissões poluentes.

"Mesmo que as pessoas estejam mais frágeis, menos capacitadas ou com menos posses próprias, se tivermos um sentido de bairro e de comunidade há outro tipo de segurança, outro de tipo de resiliência muitíssimo significativo", assegurou.

Os dois primeiros casos de pessoas infetadas em Portugal com o novo coronavírus foram anunciados em 02 de março de 2020, enquanto a primeira morte associada à covid-19 foi comunicada ao país em 16 de março. No dia 19, entrou em vigor o primeiro período de estado de emergência, que previa o confinamento obrigatório, restrições à circulação em Portugal continental e suspensão de atividade em diversas áreas.
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