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Só 5% das empresas portuguesas têm capacidade para investir em cultura

O estatuto dos benefícios fiscais relativo ao mecenato cultural “não é atrativo para as empresas”, alertou o fiscalista Luís León numa mesa-redonda organizada pelo Museu Nacional de Arte Contemporânea e pela State of the Art com o tema “A importância da Cultura para a Economia”. Apenas as empresas que faturam acima de 1,6 milhões de euros por ano conseguem usufruir do limite da dedução em sede de IRC.

Mariline Alves
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Só um grupo restrito de empresas pode usufruir da totalidade da dedução em sede de IRC ao abrigo da lei do mecenato cultural. Para isso, é preciso faturar pelo menos 1,6 milhões de euros por ano, o que corresponde a um universo que não chega às 30 mil empresas, ou seja, pouco mais de 5% do tecido empresarial português.

As contas são do fiscalista Luís León, que esta segunda-feira foi um dos oradores da mesa redonda organizada pelo Museu Nacional de Arte Contemporânea (MNAC) em parceria com a agência de ativação de marketing cultural State of the Art (SOTA), subordinada ao tema "A importância da Cultura para a Economia", da qual o Negócios é "media partner".  




O co-fundador da consultora ILYA deu o exemplo de um investimento de 10 mil euros. Nesse caso a empresa terá direito a uma dedução fiscal entre os 3 mil e quatro mil euros. Por isso, concluiu, "não é a via fiscal que atrai o mecenato". 

Para o inventivo fiscal ser "eficaz" deveria ser feita uma mudança na lei no sentido de acabar com as majorações e permitir que o valor que as empresas entregam ao mecenato cultural fosse abatido diretamente no valor do imposto a pagar, defende. "Isso obviamente teria de ter limites", mas seria o empresário a decidir onde aplicar o dinheiro. Poderia escolher entre "recuperar património, financiar um museu ou contribuir para despesa pública".

Álvaro Beleza, presidente coordenador da SEDES referiu por sua vez que Portugal tem tido um crescimento económico anémico "que não lhe permite ter capital para investir" na cultura, por isso precisa de "captar investimento estrangeiro".



Os agentes culturais devem procurar parceiros. Até porque, se é verdade "Portugal descobriu o mundo e começou a globalização" agora é o mundo que "está a descobrir Portugal". E é preciso tirar partido desse fenómeno também neste setor.

Maria Miguel Ferreira, economista no Ministério da Cultura, admitiu que "o regime do mecenato cultural não é aquele que gostaríamos de ter mas é já um passo nessa direção". A técnica responsável pela captação de investimento estrangeiro através da fundação da Startup Portugal, relembrou que "está em vigor um regime fiscal extraordinário para o mecenato cultural" cujas majorações fiscais podem ir até aos 160%.

Já este ano foram aprovadas novas regras para o mecenato cultural e passaram a ser elegíveis para receber donativos as entidades privadas com fins lucrativos, tais como empresas de organização de festivais ou de eventos culturais, galerias, editoras, entre outras empresas que operam no setor. Além disso, foi criado um regime excecional que aumenta os benefícios fiscais para os mecenas que apoiem a conservação de património e a programação museológica, que aumenta quando estes projetos se realizem no interior do país.   

Hoje "temos muitas empresas privadas que estão a organizar cultura em Portugal", garantiu a economista.

Os benefícios não fiscais

António Monteiro, presidente da Fundação Millennium bcp, um dos grandes mecenas do país, sublinhou que cada vez mais as empresas e os bancos percebem que investir na cultura lhes "dá bom nome". Isto porque "as pessoas têm mais confiança numa instituição que está a dar um retorno à sociedade".

Por outro lado, acrescentou, "a cultura é hoje um fator de enorme desenvolvimento económico" através do turismo que atrai. Já não podemos ter apenas "sol e praia" para oferecer a quem nos visita, precisamos de "uma oferta diversificada, que nos faça competir com aqueles países que têm o mesmo género de oferta, no sul da Europa e no norte de África", alertou.



Sofia Tenreiro, CEO do SBC Venture Capital, um fundo fechado de "private equity", referiu a necessidade de ligar os artistas às empresas. Numa altura em que é preciso pensar "fora da caixa", "o plano estratégico das empresas tem de ser repensado e precisamos de artistas que nos ajudem a abrir os horizontes". Ambos vão beneficiar com essa ligação, defende.

Não basta dar dinheiro aos agentes culturais, é preciso haver um envolvimento. As empresas precisam de estar relacionada com as instituições das quais são mecenas porque quando elas "não são conhecidas, não são amadas", considera Steven Braekeveldt, CEO da Ageas Europa Continental e do Grupo Ageas Portugal. Por isso, o grupo segurador, que é mecenas através da sua fundação do Teatro Nacional D. Maria II, do Festival Internacional de Música Clássica de Marvão e do Coliseu do Porto (com um contrato plurianual de "naming" cultural), oferece bilhetes para espetáculos, concertos e peças de teatro aos seus colaboradores. "Isso envolve cada vez mais as pessoas com a cultura", afirma.



O encontro no MNAC aconteceu numa altura em que o Orçamento do Estado, que está ainda em negociações, continua a atribuir uma pequena fatia ao Ministério da Cultura. A proposta do Governo para 2022 prevê que a despesa total consolidada do setor se fixe nos 644 milhões de euros, um crescimento de 14,2% face ao exercício anterior. Olhando para o bolo completo, a cultura pesa 0,4% na despesa total consolidada da administração central. Se retiramos a RTP, ainda fica mais "leve", e passa a representar apenas 0,25% no Orçamento. Valor muito aquém do 1% reclamado pelo setor há anos.   

 

 

 

 

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