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Covid-19: Fome ameaça matar mais do que o vírus em 2020

O mundo caminha em direção a uma crise de fome sem precedentes.

David Ryder/Bloomberg
05 de Setembro de 2020 às 17:00
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O número de pessoas que passam fome em 2020 pode ser até 132 milhões maior do que se estimava anteriormente. A pandemia está a provocar disrupções nas cadeias de abastecimento de alimentos, a debilitar economias e a corroer o poder de compra dos consumidores. Algumas projeções mostram que, no final do ano, a covid-19 causará um número maior de mortes diárias por fome do que pela infeção pelo vírus.

A situação não tem precedentes já que o aumento está a acontecer numa altura de grandes excedentes globais de alimentos. E está a acontecer em todas as partes do mundo, com novos níveis de insegurança alimentar em países que tinham uma relativa estabilidade nesse indicador.

Em Queens, Nova Iorque, as pessoas esperam oito horas nas filas dos bancos alimentares, enquanto agricultores destroem plantações de alface na Califórnia e deixam frutas a apodrecer nas árvores no estado de Washington. No Uganda, bananas e tomates acumulam-se nas feiras ao ar livre e, por mais que os preços baixem, não são acessíveis para tanta gente sem trabalho.

Carregamentos de arroz e carne foram deixados nos portos no início do ano devido a congestionamentos logísticos nas Filipinas, China e Nigéria. Na América do Sul, a Venezuela está à beira da fome generalizada.

"Veremos as cicatrizes desta crise por gerações", disse Mariana Chilton, diretora do Centro para Comunidades Livres da Fome na Universidade Drexel. "Em 2120, ainda estaremos a falar sobre esta crise".

A covid-19 expôs algumas das desigualdades mais profundas, e determina quem come e quem não come, destacando divisões sociais globais em que os mais ricos continuam a desfrutar de um ritmo alucinante de acumulação de riqueza.

Milhões de pessoas foram despedidas e não têm dinheiro suficiente para alimentar as suas famílias, apesar dos biliões de dólares em estímulos dos governos que sustentaram recordes nas bolsas globais.

Além da crise económica, medidas de isolamento social e disrupções nas cadeias de abastecimento também criaram um sério problema de distribuição de alimentos. A paralisação súbita dos restaurantes levou produtores a despejar leite e destruir ovos por não conseguirem redirecionar mercadorias para supermercados nem para pessoas necessitadas.

Previsões iniciais da Organização das Nações Unidas mostram que, no pior cenário possível, cerca de um décimo da população mundial não terá comida suficiente este ano.

Os efeitos serão duradouros. Na melhor das hipóteses, a ONU prevê que a fome será maior ao longo da próxima década do que o previsto antes da pandemia. Em 2030, o número de subnutridos pode chegar a 909 milhões, em comparação com um cenário pré-covid de 841 milhões.

A crise atual é uma das "mais raras", com limitações físicas e económicas de acesso a alimentos, disse Arif Husain, economista-chefe do Programa Mundial de Alimentos da ONU.

Até ao final do ano, até 12.000 pessoas podem morrer diariamente de fome causada pela covid-19, potencialmente mais do que o número de mortes causadas pelo próprio vírus, segundo estimativas da organização beneficente Oxfam International. O cálculo baseia-se num salto de mais de 80% na população sujeita a fome crítica.

O esperado aumento da desnutrição também tem um impacto profundo. A desnutrição pode enfraquecer o sistema imunológico, limitar a mobilidade e até prejudicar o funcionamento do cérebro. Crianças que enfrentam desnutrição nos primeiros anos de vida podem sofrer sequelas até à idade adulta.

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