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Salvemos a casta Vital

Há uma casta da região de Lisboa em risco de desaparecer. Quem for amante de vinhos brancos envelhecidos e com carácter, pode ajudar a inverter a situação comprando este Casa das Gaeiras Vinhas Velhas Vital 2015. É investimento seguro.

25 de Março de 2017 às 14:00
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Em Portugal, não temos o hábito de juntar gente interessada e diversificada à volta de uma mesa para discutir livremente e sem a seriedade dos simpósios técnicos os defeitos e as virtudes de uma casta. E é pena, porque tal exercício produz informação útil para produtores, comerciantes e consumidores.

Em muitos anos de escrita sobre vinhos, só participei em dois encontros do género. Um, há mais de um ano, na Quinta de Lemos (Silgueiros), e dedicado à casta Alfrocheiro, e outro, na semana passada, na Casa das Gaeiras, em Óbidos, dedicado à casta Vital. Em comum, tais tertúlias debruçaram-se sobre castas que são muito difíceis de trabalhar na vinha, pelo que, vinhos de qualidade, só três ou quatro por década, o que é manifestamente insuficiente quando está em causa a rentabilidade das explorações agrícolas. Mas há um detalhe que pode baralhar tudo. É que, em certos anos, podemos provar vinhos extraordinários, quer de Alfrocheiro quer de Vital.

Falemos hoje da casta branca Vital e da tertúlia que os responsáveis do Grupo Parras (conhecido pelos vinhos da Quinta do Gradil, entre outros) promoveram na Casa das Gaeiras, um pequeno "château" na região de Lisboa, cujas vinhas estão a cargo dos responsáveis do mesmo grupo. Se em toda a região de Lisboa existirão menos de 20 hectares de Vital, é na histórica Casa das Gaeiras que se encontra a maior mancha contínua da casta - oito hectares. Documentos históricos guardam relatos elogiosos dos vinhos brancos de Gaeiras e de outras casas da região, onde participava em grande quantidade a casta Vital. Mas, como é muito produtiva (um defeito), melindrosa e atreita a doenças, num dia as uvas estão de boa saúde e no outro murcham e apodrecem sem mais nem menos. No linguajar dos antigos, os bagos "chuchavam". Isto porque as uvas em passa faziam lembrar dedos que tinham sido chuchados (ficavam enrugados). Como se imagina, a generalidade dos agricultores arrancou as videiras.


Daqui por cinco anos podemos ter um daqueles vinhos para, por exemplo, atirar à cara de um daqueles franceses que acha que só os chardonnays da Borgonha têm vidas longas em garrafa.


No processo recente de modernização da viticultura portuguesa, a Vital era coisa votada ao esquecimento. Mas, por causa do produtor irreverente que foi António Carvalho, alguns vinhos Vital de vinhas velhas começaram a chamar a atenção dos enófilos. E quando Luís Vieira, do Grupo Parras, deu carta branca aos enólogos António Ventura e Vera Moreira para explorarem a casta nas vinhas da Casa Gaeiras, novos horizontes se abriram para a Vital. Primeiro com a colheita de 2013 e, agora, com a de 2015.

Para provar a tese de que vale a pena apostar na Vital, no almoço que antecedeu a tertúlia abriram-se duas colheitas com idades de respeito. Um Gaeiras de 1996 e um Cerejeiras de 1987, da Companhia Agrícola do Sanguinhal. Muita gente não acreditará, mas os dois brancos estavam em forma, cheios de aromas misteriosos (notas químicas e resinosas, mineralidade, folhas secas) e uma boca untuosa e fresca. Coisas antigas com esta jovialidade só costumam a aparecer na Bairrada ou no Dão. É bem feito, que é para acabar com os preconceitos.

Claro que, perante tais vinhos, os produtores Carlos João Pereira da Fonseca e João Melícias, o investigador Eiras Dias e o presidente da Comissão Vitivinícola da Região de Lisboa, Vasco Avillez, só podiam dizer que acreditavam no futuro da casta. Sim, é a caprichosa, mas o melhoramento vegetativo das plantas, alguma paciência dos produtores, estratégias de comunicação precisas e uma política de preços correcta podem fazer renascer os vinhos da casta Vital.

E isso dos preços mete-se directamente com colheita que aqui se propõe - o Casa das Gaeiras Vinhas Velhas 2015, que é um vinho que mistura notas de frutos de polpa branca, algum cítrico e aromas vegetais. Na boca sente-se volume e frescura, com tudo bem equilibrado.

Dito assim, parece um branco igual a tantos outros. E é. Mas este não é um vinho para ser bebido agora. Seria até de mau gosto. E porquê? Porque como conhecemos o potencial de evolução da casta, como já bebemos várias colheitas com 5, 10, 15 ou 20 anos, sabemos que os aromas e sabores primários que sentimos agora vão ganhar complexidade e mistério com o tempo. Daqui por cinco anos podemos ter um daqueles vinhos para, por exemplo, atirar à cara de um daqueles franceses que acha que só os chardonnays da Borgonha têm vidas longas em garrafa.

Ainda por cima, estamos perante um vinho que custa €13,89 por garrafa, pelo que a compra de uma caixa de 6 não é desgraça alguma e pode vir a dar-nos muito prazer no futuro.

Eu, como toda a gente, gosto de comprar barato. Mas se os produtores querem arriscar numa casta difícil, €13,89 por garrafa parece-me um valor um tanto ou quanto desajustado face ao potencial do vinho. Agora, isso não quer dizer que também se vá começar a pedir fortunas por cada garrafa. Ouviu, senhor Luís Vieira?


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