Notícia
O grande golo do Qatar
Neymar é a nova estrela do Paris Saint-Germain. Mas, por detrás desta contratação milionária, está Nasser al-Khelaifi, um dos empresários mais importantes do Qatar. Resultado feliz de um jogo desportivo, económico e político.
Poucas horas depois do Barcelona anunciar que ia processar Neymar, Messi publicou uma foto no Instagram onde surge, sorridente, ao lado do craque brasileiro e de Luís Suarez. Enquanto a direcção do Barcelona quer que o brasileiro lhe devolva o valor do seu bónus de renovação, feita antes da sua transferência para o PSG, os antigos colegas de Neymar parecem estar do outro lado da barricada. Afinal a presença de Neymar em Barcelona começou logo mal, com um contrato ainda hoje muito discutido no fisco espanhol, e terminou com o pagamento da sua elevada cláusula de rescisão pelo Paris Saint-Germain. Guerrilhas legais e financeiras à parte, o certo é que o astro brasileiro conquistou Paris. E já começou a justificar o astronómico investimento do dono do PSG, que veio alterar as regras e os valores com que se negoceia no futebol actual.
O centro desta transferência não se situa em Paris, mas sim no Qatar. E mostra a dinâmica e inteligência táctica deste pequeno país do Golfo Pérsico, hoje cercado pela ofensiva de bloqueio económico da Arábia Saudita (com o suporte de Donald Trump), que quis transformar o emirato na caixa registadora do terrorismo. Durante muito tempo considerou-se que a influência de um país tinha a ver com o seu tamanho e população. Mas o Qatar dribla essas conclusões. Isso começou a ser notório com a criação do canal Al-Jazeera, que colocou o Qatar no mapa mundial. As imensas receitas, sobretudo do gás natural, transformaram o Qatar num poder económico e político muito forte. Criar influência própria (para não estar sujeito à hegemonia do poderoso vizinho que é a Arábia Saudita) tornou-se uma estratégia muito clara para os dirigentes do emirato. O seu fundo soberano, o Qatar Investment Authority (a partir do qual a Al-Jazeera é também financiada) tornou-se, por isso, um poderoso braço de influência do país no mundo, já que começou a investir em diferentes sectores e destinos. A teia de influências cresceu. E não foi por acaso que o desporto se tornou também uma das prioridades estratégicas, desde a capacidade para organizar o Mundial de Futebol de 2022, ao patrocínio a diferentes clubes, como o Barcelona (com a Qatar Airways) ou a compra de clubes, como o PSG. Isto para já não falar da aquisição de direitos desportivos globais.
É neste complexo contexto que surge o nome de Nasser al-Khelaifi, um antigo campeão de ténis, a face visível da Al-Jazeera Sports e da beIN (lembre-se que um dos pedidos da Arábia Saudita para terminar o bloqueio ao Qatar era o fecho da Al-Jazeera). É ele o presidente do Paris Saint-Germain, clube onde investiu centenas de milhões de euros, antes da sua jogada mais arriscada: a compra do passe de Neymar por 220 milhões de euros. Khelaifi é um amigo próximo do emir do Qatar. Há uma outra face da moeda da aquisição do craque: serviu para projectar uma imagem e força empresarial e política do Qatar numa altura de cerco por parte da Arábia Saudita. O futebol tem também servido para limitar os danos do boicote. Ainda recentemente três jogadores do Barcelona, Piqué, Jordi Alba e Busquets estiveram em Doha para visitar uma academia de futebol e se encontrarem com os adeptos num centro comercial. Uma foto surgiu de Alba a assinar uma camisola sua para o emir Sheikh Tamim bin Hamad Al-Thani. E, o lendário jogador do Barcelona, Xavi, que agora joga no Al-Saad do Qatar, apareceu num vídeo a pedir para o fim do bloqueio ao Qatar. Os canais de televisão beIN, que emitem múltiplos eventos desportivos (para delírio dos adeptos, especialmente nos países árabes) começaram por ser bloqueados, tal como a Al-Jazeera, mas recentemente os Emiratos Árabes Unidos voltaram a permitir o seu sinal, depois de protestos dos fãs das actividades desportivas por eles emitidos. É através da beIN que é possível ver os jogos do PSG de Neymar. Como força diplomática o futebol é um poder enorme.
Nasser Al-Khelaifi desembarcou em Paris há cerca de uma década para assumir o comando do Paris Saint-Germain e, desde então, tem revolucionado o mercado do futebol global. Move-se, desde então, na capital francesa como um verdadeiro príncipe. O antigo presidente, Nicolas Sarkozy, é presença assídua na tribuna de honra de Al-Khelaifi. Sarkozy, de resto, convidou o qatari para a festa do seu 60º aniversário. Outro dos seus amigos é o presidente argentino Mauricio Macri, que lhe agradeceu publicamente a sua intervenção na resolução do caso de uma família argentina retida no aeroporto de Doha por causa do embargo. E, claro, é conhecida a sua amizade com o emir do Qatar, conhecimento de infância nos "courts" do clube de ténis de Doha. Filho de uma família da classe média qatari, tornou-se uma das figuras mais importantes da estratégia do Qatar a nível global. Tendo sido tenista profissional entre 1992 e 2003, bebeu ali muitos ensinamentos. Há quatro anos, numa entrevista ao El País, dizia: "Tudo isto não teria sido possível para mim sem o ténis". Treinava muito em Paris e daí a sua paixão pela capital francesa. Quem o conhece diz que é reservado e amável. Mas não gosta de perder. Tornou-se o homem certo, pela sua caminhada no mundo do desporto, para ser a face do Qatar nesta área. O PSG (onde hoje o homem forte do futebol é o português Antero Henrique, vindo do FC Porto) foi adquirido em 2011 pelo Qatar Sports Investment, presidido por ele próprio. Este fundo foi também a responsável por a Qatar Airways se ter tornado a patrocinadora principal do Barcelona (o clube, por seu lado, tem tido um papel crucial para o desenvolvimento do futebol no emirato). Ao mesmo tempo o antigo tenista também dirige o grupo beIN Media que, desde 2013, controla as emissões desportivas da Al-Jazeera. A beIN está também ligada ao cinema e adquiriu também o estúdio de cinema e televisão Miramax, nos EUA. Al-Khelaifi é também presidente da Federação de Ténis do Qatar e membro do Comité Organizador do Mundial de Futebol de 2022. Desde 2013 é também ministro sem pasta.
A revista "Gulf Business" colocou-o como o terceiro empresário mais poderoso do Qatar, só atrás dos presidentes da Qatar Petroleum e da Qatar Airways. Na lista de árabes mais influentes surgia em 17º lugar. Recentemente falou-se de conflitos com o governo francês de Emmanuel Macron, que desejaria cortar os benefícios fiscais dados a empresas do Qatar em França, mas essa será uma batalha a prazo. Para já o necessário é afastar as sombras negras que, a partir da Arábia Saudita, ensombram o Qatar. E, nesse aspecto, o futebol e Neymar podem muito bem ser o grande golo do emirato.
O centro desta transferência não se situa em Paris, mas sim no Qatar. E mostra a dinâmica e inteligência táctica deste pequeno país do Golfo Pérsico, hoje cercado pela ofensiva de bloqueio económico da Arábia Saudita (com o suporte de Donald Trump), que quis transformar o emirato na caixa registadora do terrorismo. Durante muito tempo considerou-se que a influência de um país tinha a ver com o seu tamanho e população. Mas o Qatar dribla essas conclusões. Isso começou a ser notório com a criação do canal Al-Jazeera, que colocou o Qatar no mapa mundial. As imensas receitas, sobretudo do gás natural, transformaram o Qatar num poder económico e político muito forte. Criar influência própria (para não estar sujeito à hegemonia do poderoso vizinho que é a Arábia Saudita) tornou-se uma estratégia muito clara para os dirigentes do emirato. O seu fundo soberano, o Qatar Investment Authority (a partir do qual a Al-Jazeera é também financiada) tornou-se, por isso, um poderoso braço de influência do país no mundo, já que começou a investir em diferentes sectores e destinos. A teia de influências cresceu. E não foi por acaso que o desporto se tornou também uma das prioridades estratégicas, desde a capacidade para organizar o Mundial de Futebol de 2022, ao patrocínio a diferentes clubes, como o Barcelona (com a Qatar Airways) ou a compra de clubes, como o PSG. Isto para já não falar da aquisição de direitos desportivos globais.
Para já, o necessário é afastar as sombras negras que, a partir da Arábia Saudita, ensombram o Qatar. E, nesse aspecto, o futebol e Neymar podem muito bem ser o grande golo do emirato.
É neste complexo contexto que surge o nome de Nasser al-Khelaifi, um antigo campeão de ténis, a face visível da Al-Jazeera Sports e da beIN (lembre-se que um dos pedidos da Arábia Saudita para terminar o bloqueio ao Qatar era o fecho da Al-Jazeera). É ele o presidente do Paris Saint-Germain, clube onde investiu centenas de milhões de euros, antes da sua jogada mais arriscada: a compra do passe de Neymar por 220 milhões de euros. Khelaifi é um amigo próximo do emir do Qatar. Há uma outra face da moeda da aquisição do craque: serviu para projectar uma imagem e força empresarial e política do Qatar numa altura de cerco por parte da Arábia Saudita. O futebol tem também servido para limitar os danos do boicote. Ainda recentemente três jogadores do Barcelona, Piqué, Jordi Alba e Busquets estiveram em Doha para visitar uma academia de futebol e se encontrarem com os adeptos num centro comercial. Uma foto surgiu de Alba a assinar uma camisola sua para o emir Sheikh Tamim bin Hamad Al-Thani. E, o lendário jogador do Barcelona, Xavi, que agora joga no Al-Saad do Qatar, apareceu num vídeo a pedir para o fim do bloqueio ao Qatar. Os canais de televisão beIN, que emitem múltiplos eventos desportivos (para delírio dos adeptos, especialmente nos países árabes) começaram por ser bloqueados, tal como a Al-Jazeera, mas recentemente os Emiratos Árabes Unidos voltaram a permitir o seu sinal, depois de protestos dos fãs das actividades desportivas por eles emitidos. É através da beIN que é possível ver os jogos do PSG de Neymar. Como força diplomática o futebol é um poder enorme.
Nasser Al-Khelaifi desembarcou em Paris há cerca de uma década para assumir o comando do Paris Saint-Germain e, desde então, tem revolucionado o mercado do futebol global. Move-se, desde então, na capital francesa como um verdadeiro príncipe. O antigo presidente, Nicolas Sarkozy, é presença assídua na tribuna de honra de Al-Khelaifi. Sarkozy, de resto, convidou o qatari para a festa do seu 60º aniversário. Outro dos seus amigos é o presidente argentino Mauricio Macri, que lhe agradeceu publicamente a sua intervenção na resolução do caso de uma família argentina retida no aeroporto de Doha por causa do embargo. E, claro, é conhecida a sua amizade com o emir do Qatar, conhecimento de infância nos "courts" do clube de ténis de Doha. Filho de uma família da classe média qatari, tornou-se uma das figuras mais importantes da estratégia do Qatar a nível global. Tendo sido tenista profissional entre 1992 e 2003, bebeu ali muitos ensinamentos. Há quatro anos, numa entrevista ao El País, dizia: "Tudo isto não teria sido possível para mim sem o ténis". Treinava muito em Paris e daí a sua paixão pela capital francesa. Quem o conhece diz que é reservado e amável. Mas não gosta de perder. Tornou-se o homem certo, pela sua caminhada no mundo do desporto, para ser a face do Qatar nesta área. O PSG (onde hoje o homem forte do futebol é o português Antero Henrique, vindo do FC Porto) foi adquirido em 2011 pelo Qatar Sports Investment, presidido por ele próprio. Este fundo foi também a responsável por a Qatar Airways se ter tornado a patrocinadora principal do Barcelona (o clube, por seu lado, tem tido um papel crucial para o desenvolvimento do futebol no emirato). Ao mesmo tempo o antigo tenista também dirige o grupo beIN Media que, desde 2013, controla as emissões desportivas da Al-Jazeera. A beIN está também ligada ao cinema e adquiriu também o estúdio de cinema e televisão Miramax, nos EUA. Al-Khelaifi é também presidente da Federação de Ténis do Qatar e membro do Comité Organizador do Mundial de Futebol de 2022. Desde 2013 é também ministro sem pasta.
A revista "Gulf Business" colocou-o como o terceiro empresário mais poderoso do Qatar, só atrás dos presidentes da Qatar Petroleum e da Qatar Airways. Na lista de árabes mais influentes surgia em 17º lugar. Recentemente falou-se de conflitos com o governo francês de Emmanuel Macron, que desejaria cortar os benefícios fiscais dados a empresas do Qatar em França, mas essa será uma batalha a prazo. Para já o necessário é afastar as sombras negras que, a partir da Arábia Saudita, ensombram o Qatar. E, nesse aspecto, o futebol e Neymar podem muito bem ser o grande golo do emirato.