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A difícil missão de medir a sustentabilidade

Reportar um elevado número de indicadores de sustentabilidade está a pôr uma enorme pressão nas organizações, que se veem perdidas no meio de tanta regulamentação e exigência. Um processo difícil que precisa de fazer o seu caminho.

26 de Janeiro de 2023 às 16:00
Pedro Ferreira
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Foto em cima: O debate "Como medir a sustentabilidade" contou com a participação de Filipa Carmona, José Maria Brandão de Brito, Katrien Buys, Luís Capão e Peter Villax. O debate foi moderado por José Crespo de Carvalho, presidente do ISCTE Executive Education



Medir os critérios ambientais, sociais e de governação (ESG, sigla em inglês) de uma empresa ou organização requer analisar uma multiplicidade de critérios, que abarcam todos os dados não financeiros dessas mesmas entidades. E esta começa logo por ser a primeira grande dificuldade. "Temos de medir muitas coisas num banco e não há um indicador, há uma variedade enorme de indicadores que tornam esta tarefa muito complexa e difícil", começou por referir José Maria Brandão de Brito, responsável pela Direção de Estudos Económicos, Criptoativos e Sustentabilidade do Millennium bcp. No painel de debate "Como medir a sustentabilidade", da conferência ESG do Negócios dedicada à governação, Brandão de Brito chamou a atenção para a muita regulamentação que existe e também que falta facilitar soluções às empresas para empreenderem esta tarefa. "Como vamos conseguir gerar este número quase infinito de informação? O esforço tem de ser coletivo, tem de estar também na parte das soluções e não só na parte das exigências", defendeu. Porém, tal como aconteceu com a obrigatoriedade de reporte de indicadores financeiros no passado, o responsável acredita que "os standards irão aparecer naturalmente", sublinhando, no entanto, que "muitas vezes não sabemos que dados recolher".

Como vamos conseguir gerar este número quase infinito de informação? O esforço tem de ser coletivo, tem de estar também na parte das soluções e não só na parte das exigências. José Maria Brandão de Brito
Chief Economist e responsável pela Direção de Estudos Económicos, Criptoativos e Sustentabilidade do Millennium bcp
No caso da Caixa Geral de Depósitos, Filipa Carmona, responsável de Sustentabilidade deste banco, chamou também a atenção para a vastidão de dados sobre sustentabilidade, pelo que é necessário focar naquilo que interessa. "O principal propósito de um banco é o financiamento, então a preocupação do banco é orientá-lo para o financiamento sustentável e saber onde estão alocados estes capitais", explicou. Dando como exemplo a emissão de três obrigações sustentáveis pela CGD para financiar projetos com elevado impacto ambiental e social, Filipa Carmona explicou que "a preocupação é arranjar dados para se medir o financiamento sustentável, como, por exemplo, quantificar as emissões emitidas por uma barragem hidroelétrica".

E tal como acontece no reporte financeiro, em que usamos a mesma linguagem, no reporte de sustentabilidade também tem de se fazer o mesmo caminho.
Filipa Carmona
Responsável de Sustentabilidade, Caixa Geral de Depósitos
Filipa Carmona também acredita que este é um processo em andamento. "E tal como acontece no reporte financeiro, em que usamos a mesma linguagem, no reporte de sustentabilidade também tem de se fazer o mesmo caminho". E nesta necessidade de medição do ESG, a responsável de Sustentabilidade identifica como grandes desafios "o crescente número de leis nesta matéria", mas também a expectativa dos stakeholders em conhecer a atuação sustentável da entidade. "Por isso, temos de ir à procura de informação para dar resposta a estas expectativas", frisou. Neste sentido, destaca que a maior dificuldade é recolher informação da cadeia de valor.

Vamos conseguir ter respostas quando conseguirmos integrar a sustentabilidade na demonstração de resultados. É nessa direção que temos de trabalhar.
Peter Villax
Presidente da Associação das Empresas Familiares
Peter Villax, presidente da Associação das Empresas Familiares, defendeu que só se deveriam utilizar indicadores muito simples, como a redução do consumo de energia ou de água. E criticou que atualmente "não se conseguem comparar serviços e indústrias e dentro da mesma indústria nem se conseguem comparar fábricas". Por isso, considerou que, na realidade, "não há métricas de sustentabilidade neste momento. Não há formas de medir nem a sustentabilidade e nem a insustentabilidade". Perante esta "enorme pressão" que requer recursos humanos e verba, Peter Villax acredita que, a longo prazo, "vamos conseguir ter respostas quando conseguirmos integrar a sustentabilidade na demonstração de resultados. É nessa direção que temos de trabalhar."

Deveria haver a nível ministerial um responsável que congregasse a pasta da sustentabilidade do país, para orientar empresas para a mudança, para fazer a ligação com o PRR. Luís Capão
Presidente do Conselho de Administração da Cascais Ambiente
O debate contou também com a participação de Luís Capão, presidente do Conselho de Administração da Cascais Ambiente, que defendeu que "deveria haver a nível ministerial um responsável que congregasse a pasta da sustentabilidade do país, para orientar empresas para a mudança, para fazer a ligação com o PRR." Luís Capão referiu a existência de uma enorme quantidade de dados para analisar. "Esta ideia de querermos ir a tudo leva-nos a ter imensos dados", referiu, exemplificando que existe um enorme potencial de medição nos camiões de recolha de lixo, nos sensores de passagem de turistas em zonas naturais ou nos instrumentos preditivos do caudal de uma ribeira. Recordando as distinções que o município tem recebido na área da sustentabilidade, o responsável da Cascais Ambiente salientou a falta de um instrumento agregador que permita medir o impacto que as políticas têm nas dinâmicas da comunidade.

Há muita coisa que já medimos e outras tantas que ainda não medimos. Há muitos inputs, porque fazemos muitas iniciativas, mas a questão não é só os projetos, a questão é saber qual é o seu impacto. Katrien Buys
Responsável de Estratégia, Inovação e Sustentabilidade do Grupo Ageas Portugal
Por fim, Katrien Buys, responsável de Estratégia, Inovação e Sustentabilidade do Grupo Ageas Portugal, salientou a existência de mais 200 indicadores de sustentabilidade a reportar pela companhia, internos e externos. "Há muita coisa que já medimos e outras tantas que ainda não medimos. Há muitos inputs, porque fazemos muitas iniciativas, mas a questão não é só os projetos, a questão é saber qual é o seu impacto", referiu."
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