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Apostar na floresta é apostar no futuro

A gestão florestal é (muito) mais do que apenas ter um terreno com árvores. Feita da forma correta não só ajuda a atenuar as alterações climática, como promove a biodiversidade e, nalguns casos, combate a desertificação do interior.

22 de Novembro de 2023 às 11:30
Portugal é um país florestal, mas sem cultura florestal”, afirma Rosário Alves, diretora executiva da Forestis.
Portugal é um país florestal, mas sem cultura florestal”, afirma Rosário Alves, diretora executiva da Forestis. Vítor Mota
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A floresta é um ativo de um país e deve ser trabalhada de forma integrada. Ela pode e deve ser encarada como possibilitando um valor económico à sociedade envolvente.

Mas a verdade é que, pelo menos em Portugal, não há muito essa noção. Na opinião de Filipe Duarte Santos, professor na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e especialista em Alterações Climáticas, isso acontece, em grande parte, porque a maioria da população vive nas grandes cidades e, por isso, tem pouco contacto com o mundo rural e com a floresta. O que torna impercetível o valor económico da floresta. A isto Francisco Ferreira, presidente da Zero, acrescenta que não temos uma compensação dos serviços prestados, de acordo com os diferentes tipos de floresta. Porque há diferentes tipos de valores. Os tangíveis, como os obtidos pela venda e utilização da madeira, e os intangíveis, que resultam da floresta como paisagem, sendo que os proprietários não são compensados pelos serviços que são prestados. "Precisamos de renumerar esses diferentes serviços quer os tangíveis quer os intangíveis", aponta o ambientalista. Na mesma linha, Luís Neves Silva, diretor general na iNovaLand Investment Limited, lembrou que ainda são extremamente incipientes os mercados dos serviços ambientais. É certo que o mercado de carbono está a abrir caminho e que já existem estratégias complementares, o certo é que há toda uma questão da limitação das matérias-primas, dos preços, etc., "tudo isso está a esticar o sistema ao limite, daquilo que a economia convencional consegue pagar". Com uma adicionante: há falta de incentivo para os proprietários para tomarem decisões, ou aos investidores para investirem na floresta. Face a isto "temos de ir a esses intangíveis, que não estão, neste momento, a serem valorizados - mercados de carbono, de biodiversidade, da água". O diretor general na iNovaLand Investment Limited afirma categoricamente que temos de olhar para a floresta de uma forma muito mais abrangente e integrada.

"Portugal é um país florestal, mas sem cultura florestal", afirma Rosário Alves, diretora executiva da Forestis. Um exemplo claro é quando se ouve opiniões públicas que parecem indiciar que se pode plantar qualquer espécie em qualquer local. E não é assim. Como aponta Rosário Alves, o país tem condições edafoclimáticas que podem ser utilizadas para muitas utilizações e outras mais específicas. Um outro caso prende-se com a instalação de painéis solares em campos agrícolas. Filipe Duarte Santos referiu que já existem painéis mais altos (embora mais caros) que não só não impedem o cultivo dos campos como proporcionam sombra. A isto Rosário Alves aponta que o problema é quando os mesmos são instalados numa área onde é mais fácil construir e de implementar e, com isso, pagar mais ao proprietário. Sobre a sugestão de "obrigar" a implementação dos painéis em solos menos produtivos a executiva aponta que tudo é compatível, mas lembra que é necessário haver um equilíbrio de forças entre os vários setores.

"A madeira é um material nobre", constata Filipe Duarte Santos, que considera que queimar madeira - como fazem alguns países do centro da Europa, que substituem as centrais a carvão, cujas emissões são contabilizadas negativamente, por centrais a pallets, em que não há emissões. Quando as emissões reais são superiores às do carvão. Sobre isto Francisco Ferreira lembra que a neutralidade climática consiste no balanço entre as emissões e o que se tira como sumidouro. O ambientalista aponta ainda o problema de não se valorizar o stock de carbono. "O que está em jogo é o que vou tirar de carbono num determinado ano e é isso que faz o balanço com as minhas emissões", refere, mostrando-se preocupado pelo facto de, daqui a duas décadas, termos de garantir 11 milhões de toneladas de sumidouro/ano de carbono, dado que essas são as emissões estimadas para Portugal nessa data. Ou seja, sim, é importante trabalhar a mitigação das emissões de carbono, mas, é também importante trabalhar no garante de sumidouro. E isso passa por ter uma fileira florestal, "uma ocupação do território que me garanta a capacidade de ter este sumidouro para contrabalançar as emissões".

A isto há ainda a acrescenta que temos de garantir, na opinião do ambientalista, que a floresta tem uma utilização o mais eficiente possível. Do ponto de vista das emissões, mas também do ponto de vista material e das escolhas que fazemos.

Na prática passa por pensar a floresta de uma forma integrada e considerar qual a melhor opção do ciclo de vida e das oportunidades existentes. Porque a visão integrada permite auferir um valor económico à floresta. Algo que, em Portugal, é algo desconhecido. A partir do momento em que isso acontece há uma maior valorização do espaço florestal. Um maior cuidado. E isso inclui, quando integrado com a agricultura, no renovar do chamado espaço rural. O que, no caso português e quando acompanhado do investimento de infraestruturas, permite combater (ou ajuda a) a desertificação, permitindo que as pessoas percebam que há vida (e dinheiro) no interior do país. E que é possível viver do espaço agroflorestal. Principalmente se, através do recurso à tecnologia, se incentivar a economia circular com todos os bens derivados da floresta.
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