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Investir na floresta trava as alterações climáticas

Uma gestão sustentável da floresta permite não só sequestrar carbono como potenciar a bioeconomia, nomeadamente em zonas rurais e normalmente mais desertificadas. O que significa que ajuda a cumprir as metas da descarbonização, mas também a criação de postos de trabalho e de negócio.

30 de Novembro de 2022 às 12:30
O mundo tem vindo a perder floresta.
O mundo tem vindo a perder floresta. DR
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A forma mais fácil e rápida de combater as alterações climáticas é investir na floresta. Com a vantagem adicional de uma boa gestão da mesma contribuir para o crescimento da bioeconomia. No entanto, o que se tem visto é uma contínua diminuição da área florestal, nomeadamente da chamada floresta primária.

Atualmente, segundo dados da Our World in Data, as florestas representam um pouco mais de um terço (38%) da área de terra habitável. Ou seja, cerca de um quarto (26%) da área total de terra (tanto habitável como inabitável). Preocupante é o facto de que cerca de um terço da floresta mundial se tenha perdido, sendo que metade dessa perda ocorreu no último século. Um outro dado preocupante. A maioria das perdas não se dá devido a incêndios, mas, sim pela ação do Homem. Seja para o desenvolvimento de cidades ou para a agricultura.

A Europa (onde se inclui a Rússia) é a região que tem uma maior percentagem de floresta - 25,07% -, no entanto, as maiores perdas encontram-se nos chamados trópicos. Em termos de área perdida, nada bate o Brasil, que apenas em 2021 "perdeu" mais de 1,5 milhões de hectares de floresta. Contudo, se a análise incidir na percentagem sob a área total, a medalha é atribuída ao Camboja com 1,5%.

Mas no meio destes números - assustadores - há também dados que indicam que o processo pode ser reversível. A Indonésia é um bom exemplo, com o Global Forest Review, do World Resources Institute, a indicar a diminuição - pelo quinto ano consecutivo - da taxa de perda de floresta primária (25% em relação a 2020). A conclusão é a de que mais um ano de declínio é motivo de celebração, e indica que a Indonésia está a caminhar na direção certa para cumprir alguns dos seus compromissos climáticos. No ano passado, a Indonésia atualizou o seu plano climático nacional (NDC) com o compromisso de reduzir as emissões no seu setor florestal e de utilização do solo, de modo a tornar-se um repositório de carbono líquido até 2030.

As florestas são a solução natural mais poderosa que temos. Mark Wishnie
Chief Sustainability Officer na BTG Pactual
E Portugal? Os dados do Global Forest Watch indicam que em 2010 Portugal tinha 801 kha de floresta natural, que se estendia por 24% da sua área terrestre. No ano passado perdeu 10,2 kha dessa mesma floresta, com o valor a subir para 1,13 Mha de cobertura arbórea, equivalente a uma redução de 49% na cobertura arbórea desde 2000.

É essencial assumir uma correta gestão da floresta

Estes números mostram a necessidade crescente em atuar naquilo que é o pulmão do planeta Terra. Sem floresta não há oxigénio. Mais do que isso. Como afirmou, em entrevista exclusiva ao Negócios, Mark Wishnie, Chief Sustainability Officer e Head of Landscape Capital na área de Asset Management da BTG Pactual - que esteve em Portugal para participar no 14.ª Edição do Fórum de Sustentabilidade -, uma boa gestão da área florestal pode disponibilizar cerca de um terço da mitigação climática necessária para atingirmos os objetivos do Acordo de Paris. "As florestas são a solução natural mais poderosa que temos", constata, acrescentando que são a única solução que temos hoje que remove carbono da atmosfera em grandes quantidades.

No entanto, há que ter em atenção que optar pela gestão florestal é uma decisão a longo prazo. A boa notícia é que começam a crescer logo que são plantadas e o processo de captura de carbono também é imediato.

É certo, lembra o executivo, que, a nível mundial, o mundo tem vindo a perder floresta. No entanto, acrescenta, também se tem replantado uma parte dessa perda.

Isso é suficiente? Não. "Temos de proteger a floresta que temos, temos de parar de perder carbono das nossas florestas e temos de plantar e recuperar mais floresta", afirma, apontando que só assim começaremos a resolver o problema em vez de apenas parar de o piorar.

Outra questão, realçou Mark Wishnie, é que não basta plantar árvores (de forma indiscriminada). Uma correta gestão da floresta implica escolher as espécies certas (para o local em causa), mas, também, garantir que depois de plantadas continuem plantadas. Ou seja, assegurar a manutenção e a sobrevivência da plantação. E isso implica um envolvimento com a comunidade. Porque a verdade é que a floresta pode contribuir para o enriquecimento dessas comunidades ao potenciar o desenvolvimento da bioeconomia.

Só para se ter uma ideia, segundo o relatório "Bioeconomia 2030 - Linhas Estratégicas dos Setores de Produção Primária no Contexto do Desenvolvimento da Estratégia Nacional para a Bioeconomia Sustentável 2030", a bioeconomia em Portugal representa um volume de negócios de 41 mil milhões de euros, com o setor das florestas, suportado, em grande medida, pelas indústrias da fileira florestal, a ser responsável por 24% deste valor (9,8 mil milhões de euros) e 11% do emprego (cerca de 76,5 mil postos de trabalho).

"A FAO - Food and Agriculture Organization prevê que o consumo de produtos primários da floresta deverá aumentar 37% até 2030", aponta Mark Wishnie, realçando que o valor será ainda maior se houver um incremento da procura por biomateriais. O executivo lembra que a floresta é um sistema extraordinariamente produtivo. É certo que hoje usamos a madeira para fazer produtos como mobílias, têxteis, nanocelulose... mas há todo um potencial ainda não explorado. E isso implica plantar para restaurar a biodiversidade, mas, também, com capacidade de exploração e fazer negócio. Na prática investir em produtos capazes de substituir os materiais fósseis. A par, lembra Mark Wishnie, de criar oportunidades de negócio em zonas rurais, tradicionalmente deficitárias.

"Acredito que a integração de ambas as vertentes - restauração e produção - é crítica. Na verdade, não teremos sucesso se optarmos apenas por uma", afirma convicto Mark Wishnie.

As pessoas não têm noção do que é uma floresta de produção. Mark Wishnie
Chief Sustainability Officer na BTG Pactual
A falta de noção do valor económico da floresta leva a que ainda não se fale - e trabalhe - profissionalmente a mesma. Se se tivesse noção de que, segundo o estudo "The economic contribution of the world’s forest setor", publicado em 2019 no Elsevier, em 2011 o setor florestal contribuiu com 1.298 biliões de dólares para a economia global e apoiou mais de 45 milhões de postos de trabalho - sendo que esse número tem vindo a aumentar -, talvez se falasse mais na gestão da floresta. E se financiasse mais a sua gestão. Isto porque, de o relatório mais recente da Iniciativa de Política Climática, o setor terrestre - florestas, pastagens, zonas húmidas - recebeu 2% do financiamento climático global em 2021 (14 mil milhões de dólares do total de 632 mil milhões).

"Há uma falta de perceção da importância da floresta", constata Mark Wishnie que dá um exemplo muito simples. Se forma visitar um amigo e elogiarmos a salada e questionarmos a origem do tomate há uma noção de que veio de uma plantação, de que é de origem biológica ou mesmo de que região veio. Se a pergunta incidir sobre a origem da mesa de madeira... a resposta tende a ser vaga ou inexistente. "As pessoas não têm noção do que é uma floresta de produção", refere Mark Wishnie que acrescenta que a maioria das pessoas não sabe que cortar árvores, de forma sustentável não é igual a desflorestação. É precisamente o contrário.

Felizmente há quem tenha essa perceção e comece a investir na floresta. Historicamente os investimentos vinham de grandes fundos de pensões, seguradoras e instituições bancárias com visão a longo prazo. Principalmente porque o investimento na floresta é considerado como um investimento seguro, de baixo risco. Mas, lembra Mark Wishnie, nos últimos dois ou três anos, foram anunciados investimentos de biliões de dólares na neutralidade carbónica. "De repente grandes organizações estão à procura de investimentos que permitam reduzir as suas emissões e simultaneamente façam o sequestro de carbono e isso está a criar muito interesse na floresta", constata o executivo que acrescenta que na procura de oportunidades para investimentos de emissões negativas há poucas soluções. A agricultura e a floresta são as duas oportunidades principais. Um cenário que, aponta Mark Wishnie, está a levar muitos investidores a considerarem investir na floresta.

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