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A Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP27) encerrou neste domingo, dois dias depois do prazo, com um acordo inovador para proporcionar financiamento para "perdas e danos" aos países vulneráveis atingidos por catástrofes climáticas. Mas a sua implementação só entrará em vigor depois da COP28, nos Emirados Árabes Unidos, no próximo ano.
"Este resultado faz-nos avançar", disse Simon Stiell, secretário executivo das Nações Unidas para as Alterações Climáticas. "Determinámos um caminho a seguir numa conversa de décadas sobre o financiamento de perdas e danos, deliberando sobre a forma como abordamos os impactos nas comunidades cujas vidas e meios de subsistência foram arruinados pelos piores impactos das alterações climáticas".
Num contexto geopolítico difícil, a COP27 resultou num pacote de decisões que reafirmaram o seu compromisso de limitar o aumento da temperatura global a 1,5 graus Celsius acima dos níveis pré-industriais. O pacote também reforçou a ação dos países para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa e adaptar-se aos impactos inevitáveis das alterações climáticas, bem como para reforçar o apoio financeiro, tecnológico e de capacitação necessário aos países em desenvolvimento.
A criação de um fundo específico para perdas e danos "marcou um importante ponto de progresso", sublinhou a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC), em comunicado.
Os governos também concordaram em estabelecer um comité de transição para fazer recomendações sobre como operacionalizar tanto as novas disposições de financiamento como o fundo na COP28 no próximo ano. A primeira reunião do comité de transição deverá ter lugar antes do final de março de 2023.
As partes também acordaram nas disposições institucionais para operacionalizar a Rede de Santiago para Perdas e Danos, para catalisar a assistência técnica aos países em desenvolvimento que são particularmente vulneráveis aos efeitos adversos das alterações climáticas.
As associações ambientalistas ZERO e Oikos, presentes na Conferência do Clima que decorreu entre 6 e 20 de novembro no Egipto, elogiam o avanço deste fundo histórico para perdas e danos, mas consideram que a mitigação ficou muito aquém do necessário. "Esta foi uma vitória histórica da sociedade civil, em particular das populações mais vulneráveis, que lutaram pela criação deste fundo. Tal será, de acordo com a decisão agora tomada, um processo ainda moroso, mas relevante, a par de outros meios de financiamento", referem em comunicado conjunto.
Avanços na COP27
O UNFCCC salienta ainda que a COP27 registou progressos significativos, com os governos a chegarem a acordo sobre algumas matérias decisivas. No campo da mitigação, "fez avançar significativamente" o trabalho. Foi lançado em Sharm el-Sheikh um programa de trabalho com o objetivo de aumentar urgentemente a ambição e implementação da mitigação. O programa de trabalho terá início imediatamente após a COP27 e continuará até 2030, com pelo menos dois diálogos globais realizados todos os anos. Os governos foram também convidados a rever e reforçar as metas de 2030 nos seus planos climáticos nacionais até ao final de 2023, bem como a acelerar os esforços para a redução gradual da energia não diminuída do carvão e a eliminação gradual dos subsídios aos combustíveis fósseis ineficientes.
Foi expressa séria preocupação de que o objetivo de os países desenvolvidos mobilizarem conjuntamente 100 mil milhões de USD por ano para países em vias de desenvolvimento ainda não tenha sido atingido, sendo os países desenvolvidos instados a cumprir este objetivo e os bancos multilaterais de desenvolvimento e as instituições financeiras internacionais instados a mobilizar o financiamento climático.
Os delegados reconhecem que a crise energética global sem precedentes sublinha a urgência de transformar rapidamente os sistemas energéticos para serem mais seguros, fiáveis e resilientes, acelerando as transições limpas e justas para as energias renováveis durante esta década crítica de ação. Na COP27 foi também lançado um novo programa de trabalho de cinco anos para promover soluções tecnológicas climáticas nos países em desenvolvimento.
"Temos uma série de marcos importantes à nossa frente. Temos de nos unir, com determinação, através de todos os processos, sejam eles nacionais, regionais, ou outros, como o G20. Cada marco importa e constrói ímpeto", disse Stiell. "O próximo passo para a mudança está mesmo ao virar da esquina, com a administração dos Emirados Árabes Unidos do Primeiro Global Stocktake. Pela primeira vez, faremos um balanço da implementação do Acordo de Paris. Avaliará independentemente o progresso que fizemos e se os nossos objetivos são adequados. Informará o que todos, todos os dias, em qualquer parte do mundo, precisam de fazer, para evitar a crise climática".
Stiell lembrou ainda aos delegados no plenário de encerramento que o mundo está numa década crítica para a ação climática. Recordou que as emissões de gases com efeito de estufa devem diminuir 45% até 2030 para limitar o aquecimento global a 1,5°C.
Para a ZERO e a Oikos, apesar do avanço no fundo de perdas e danos, "o texto final não reflete a necessidade de eliminar gradualmente todos os combustíveis fósseis, condição essencial para assegurar um aquecimento não superior a 1,5°C em relação à era pré-industrial. O incumprimento destas premissas significa que todo o financiamento climático corresponde a dinheiro que pode abrandar um pouco a nossa velocidade, mas mantém-nos na autoestrada para o inferno". Por isso, acrescentam, "é fundamental que se aproveite o ímpeto criado em torno da justiça climática, direcionando agora a luta para a tarefa árdua de garantir melhores resultados nestas frentes na COP28 nos Emirados Árabes Unidos".