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19 de Setembro de 2017 às 23:00

Supervisão ou perversão?

Esta semana foram apresentadas as conclusões do grupo de trabalho criado pelo Governo e liderado pelo antigo presidente da CMVM, Carlos Tavares. A alteração mais polémica é a criação do Conselho Superior de Política Financeira, liderado pelo ministro das Finanças, e que terá de se pronunciar sobre medidas que tenham impacto nas contas públicas, como seja uma resolução bancária.

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Passos Coelho veio chamar-lhe uma "perversão", por comprometer a independência dos reguladores. Será?

Se aquele conselho tiver de facto o poder de recusar uma resolução, mesmo o Banco de Portugal tendo declarado uma instituição financeira insolvente, a dúvida é legítima. Vem-nos logo à memória a defesa de Ricardo Salgado: com outro Governo não teria havido resolução do BES. É o que basta para provocar arrepios na espinha...


A questão não é se resolver o BES foi ou não a melhor decisão – é se mesmo o sendo, ela deve poder ser vetada politicamente? Há bons argumentos dos dois lados. Sendo necessário ir ao bolso dos contribuintes, não é legítimo que estes tenham uma palavra a dizer? Mas a transparência de que tal decisão se deve revestir recomenda que ela possa acontecer com o máximo de independência possível. No novo modelo poderá deixar de o ser.

A intromissão na independência dos reguladores já teve outros episódios. O mesmo líder do PSD aprovou enquanto primeiro-ministro uma lei-quadro das entidades reguladoras que ao mesmo tempo que consagra a sua autonomia administrativa e financeira a retira ao pô-las sob a alçada do Orçamento do Estado. E nos últimos anos isso tem representado um garrote sobre a disponibilidade de recursos dos reguladores (neste caso, a CMVM e o supervisor dos seguros) para cumprirem as suas competências.

Há propostas que não deixam dúvidas, como retirar a resolução da responsabilidade directa do Banco de Portugal. Ou a nomeação do governador passar a ser da competência do Presidente da República, sob proposta do Governo e após audição na Assembleia da República. Só abonará a favor da credibilidade e legitimidade de quem ocupará o cargo.


A alteração mais significativa está na criação do Conselho de Supervisão e Estabilidade Financeira (CSEF), uma nova entidade autónoma que fica responsável pela supervisão macroprudencial – actualmente no Banco de Portugal –, melhorando a comunicação e a coordenação entre o Banco de Portugal, a CMVM e ASF. Correu mal no caso BES, é salutar que mude. 


Mas a abrangência das suas competências suscita receios de que se esteja a criar um supervisor dos supervisores, a juntar complexidade, burocracia, imprevisibilidade e custos. E de nada serve aprimorar a arquitectura se depois não há meios para a supervisão, nem autonomia na sua aplicação. Além de que o problema muitas vezes não está só no fato. Está em quem o veste.

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