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04 de Março de 2009 às 11:32

Os tratos da Guiné

Logo em Novembro de 1980, quando Nino Vieira derrubou Luís Cabral, a Guiné-Bissau perdeu qualquer hipótese de estabilidade. Consumada a ruptura entre os dirigentes de origem cabo-verdiana e os líderes guineenses o novo estado ficou ainda mais dependente dos interesses dos vizinhos Senegal e Guiné-Conacri.

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Logo em Novembro de 1980, quando Nino Vieira derrubou Luís Cabral, a Guiné-Bissau perdeu qualquer hipótese de estabilidade.

Consumada a ruptura entre os dirigentes de origem cabo-verdiana e os líderes guineenses o novo estado ficou ainda mais dependente dos interesses dos vizinhos Senegal e Guiné-Conacri.

Os conflitos étnicos que extravasam as fronteiras coloniais, recrudesceram e, sem quadros nem projectos, a Guiné-Bissau afundou-se ainda mais na miséria e nas rivalidades de uns quantos homens de armas na mão.

Nos últimos anos um Estado sem lei tornou-se presa fácil dos traficantes latino-americanos que transformaram a Guiné-Bissau numa placa giratória do tráfico de cocaína para a Europa.

A entrada em força do dinheiro do narcotráfico num dos países mais pobres do mundo subverteu o que ainda restava das estruturas administrativas e corrompeu sem remédio as forças armadas e a polícia.

As desavenças pelo controlo das escassas receitas que o caju, o marisco ou arroz proporcionavam, os confrontos pelo lucros de contrabandos e tratos diversos, passaram a assumir um cunho ainda mais virulento.

O enredo do mata-mata
As tradicionais rivalidades entre as etnias da Guiné tiveram nos últimos meses o seu paroxismo no confronto armado entre os homens fiéis a Nino Vieira e outros que juravam pelo chefe do estado-maior Tagme Na Waie.

Não por acaso eram balantas quem apoiava o homem-forte do exército, enquanto as gentes da minoritária etnia papel se mantinham ao lado de Nino.

Em Novembro Na Waie tentou matar Nino e falhou.

Em Janeiro foi a vez de Nino falhar um ataque a Na Waie.

No domingo alguém próximo do presidente matou à bomba Na Waie e em retaliação tropas balantas acabaram com Nino à bala e à catanada.

O mata-mata entrara, aliás, nos lances finais logo em Dezembro, quando Nino perdeu o seu protector de sempre, o presidente eterno de Conacri, Lansana Conté.

A partir de agora a Guiné-Bissau poderá ou não cair outra vez numa guerra civil em larga escala como aconteceu em 1998.

Com o Senegal e o conflito de Casamansa em fundo e tráfico de armas pelo meio, o brigadeiro Assumane Mané tentou, então, aniquilar Nino e o presidente partiu para o exílio.

Mané acabou morto dois anos depois noutro confronto com o presidente Kumba Yalá, mas um dos homens que esteve a seu lado contra Nino, Na Waie precisamente, continuou à frente das tropas, maioritariamente balantas.

Era fatal que, cedo ou tarde, Nino matasse Na Waie, tal como abatera em 1986 outro general balanta, Paulo Correia. Nestes enredos ninguém esquece quem mata e dá a matar.

Ou, então, era de esperar que Na Waie matasse Nino.

Acabaram por morrer os dois.



A coca em fundo
Agora, é possível que tudo continue a apodrecer e meia dúzia de homens fortes repartam o poder por uns tempos.

É crível que a miséria de milhão e meio de guineenses seja insanável num futuro próximo.

Tudo é possível no meio da desordem, mas certo e seguro é que num estado falhado como a Guiné-Bissau só uma forte presença militar e policial estrangeira que comece por conter o tráfico de droga possa vir a dar alguma credibilidade a qualquer esforço de estabilização.

Mas é melhor não contar muito com isso.

Os tratos da Guiné sempre foram uma coisa brutal.

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