Opinião
Os pecados urbanos
Luís Afonso, o autor do Bartoon, é um dos grandes humoristas portugueses. Nesta semana, depois de se conhecerem as investigações em curso na Câmara Municipal de Lisboa por suspeitas de corrupção no urbanismo, o comentário da sua personagem central é demolidor
Se não os conseguir convencer, o melhor é tentar confundi-los.
Harry S. Truman
Semanada
n O número de alunos que frequentam cursos técnicos superiores cresceu 6% neste ano lectivo, há quase 13 mil inscritos em mais de 400 cursos curtos e mais de metade dos que os concluem ingressam depois numa licenciatura n na última década, duplicou o número de concelhos só com dois balcões bancários n Portugal tem hoje a mesma extensão de linhas de caminhos de ferro que em 1893 n das cerca de três mil freguesias portuguesas, apenas 370 são lideradas por mulheres n um inquérito da CIP indica que o Plano de Resiliência não terá significado para 48% das empresas n apesar de todas as declarações sobre a importância da economia do mar, dos cerca de 250 milhões de euros que o PRR lhe dedica, 230 são para investimento público, sobrando apenas 20 milhões para a economia real e para o desenvolvimento das empresas do sector n Março foi o quarto mês consecutivo de aumento dos inscritos nos centros de emprego, que agora totalizam 432 mil, e em alguns concelhos o número de desempregados mais que duplicou no espaço de um ano n um estudo divulgado esta semana indica que desde o Natal que a mobilidade dos portugueses nos dias úteis não era tão alta, e no último fim de semana a circulação da população aproximou-se do que acontecia no verão do ano passado n entre 16 de Março e 18 de Abril, duplicou o número de pessoas que responde "não" ao SMS da vacinação contra a covid-19 n a Sport TV registou um prejuízo de 5,7 milhões de euros no ano passado, um agravamento de 569% face ao período homólogo n os assinantes de TV paga em Portugal triplicaram em 20 anos e agora 93% das famílias utilizam o serviço, metade delas através de fibra óptica.
Dixit
Somos dominados por uma elite minúscula que vive em circuito fechado, pejada de conflitos de interesses. Isto é o sistema. Não foi criado por Sócrates.
João Miguel Tavares
Polémica à vista
Preparem-se para o choque e para a polémica: "Teorias Cínicas" é um livro sobre como activistas académicos reduziram tudo a raça, género e identidade - e os efeitos que isso tem gerado nas sociedades ocidentais. A ensaísta Helen Pluckrose e o matemático James Lindsay procuram desmontar algumas das teses mais polémicas dos movimentos intelectuais que se apresentam sob a capa da defesa da justiça social e afirmam que os estudos activistas e radicais, com a sua cultura de guerra e de cancelamento, fazem mais mal do que bem às comunidades minoritárias que juram defender. Os autores analisam teorias como "O conhecimento é uma construção social", "a ciência e a razão são ferramentas de opressão", "todas as interacções humanas são fontes do exercício opressor do poder", que, dizem, têm vindo a ser normalizadas e infiltradas na opinião pública por académicos activistas que julgam ter a receita para uma sociedade mais justa e paritária, particularmente no que diz respeito a questões de raça, género, sexo e sexualidade. Segundo os autores, estes movimentos assumem uma visão do mundo dogmática "que coloca as mágoas sociais e culturais num lugar de destaque, transformando tudo numa luta política de soma zero à volta de marcadores identitários". Lançado em Agosto de 2020 no Reino Unido, e editado agora em Portugal pela Guerra & Paz, o livro foi considerado o Ensaio do ano em vários jornais britânicos e analisa, com racionalidade, a inconsistência das teorias identitárias, que ameaçam a democracia liberal. Segundo Steven Pinker, professor de Psicologia na Universidade de Harvard, "este livro expõe as raízes intelectuais surpreendentemente superficiais dos movimentos que parecem estar a engolir a nossa cultura".
Escultura & fotografia
As esculturas de Alberto Giacometti e as fotografias de Peter Lindbergh coexistem na exposição "Capturar O Invisível", que está até 24 de Setembro no Museu da Misericórdia do Porto, no centro histórico da cidade. Bronzes e desenhos de obras de Giacometti, selecionados por Lindbergh, são apresentados ao lado das suas fotografias. Lindbergh, que se tornou conhecido sobretudo pela fotografia de moda, é fascinado desde jovem pelo trabalho e pela personalidade de Alberto Giacometti. Em 2017, foi convidado a fotografar na Fundação Giacometti em Paris, recebeu carta-branca e fotografou as peças de bronze de Giacometti, tratando-as como modelos. Utilizando "close-ups" e grandes ampliações, revela através da fotografia aspectos das esculturas de Giacometti impossíveis de perceber a olho nu. Em simultâneo, ao associar obras de diferentes períodos nas imagens, o fotógrafo estabelece um diálogo através de períodos e estilos.
Arco da velha
A Assembleia da República aprovou 52 recomendações ao Governo no primeiro ano desta legislatura e metade foram ignoradas, entre elas a requalificação das zonas ardidas em 2017 e a elaboração de um plano para evitar a seca do Tejo.
Cruzamentos sonoros
"Uneasy" é o quarto registo em trio do pianista Vijay Iyer, entre os seis discos que já gravou para o catálogo da ECM. Neste álbum junta-se a Linda May Han Oh no baixo e a Tyshawn Sorey na bateria. Esta formação reforça o sentido rítmico da sua música e abre novos caminhos em relação aos seus trabalhos anteriores, apresentando-se agora mais jazzy. Ao longo dos onze temas originais deste "Uneasy", desfilam as interpretações musicais que Vijay Iyer faz do mundo contemporâneo. Destaco temas como "Children On Flint", "Combat Breathing", e a colaboração em "Touba" com Mike Ladd, poeta e performer de Boston conhecido pelo seu trabalho no hip-hop e com quem tem trabalhado ao longo dos anos. Vale a pena ouvir o seu solo de piano em "Augury" ou a evocação oriental em "Entrustment". Saliento ainda a sua versão de standards do jazz como "Night And Day’’ e "Drummer’s Song". Vijay Iyer, que em breve completa 50 anos, nasceu nos Estados Unidos, filho de imigrantes Tamil vindos da Índia, e desde cedo se interessou por cruzar experiências de diversas culturas. Edição ECM disponível em streaming.
No regresso ao restaurante
Se passar pela Mealhada é inevitável que se cruze nos restaurantes locais com um petisco que se chama iscas de leitão. Trata-se do fígado dos pequenos leitões usados tradicionalmente na Bairrada. As iscas de leitão, cortadas muito finas, têm um sabor e uma textura completamente diferente do fígado dos animais adultos, como é bom de ver. É verdadeiramente um petisco, e mesmo algumas pessoas que torcem o nariz às iscas deixam-se conquistar. Na Mealhada, são servidas à antiga (marinadas em vinho e alho e fritas em banha), mas também grelhadas ou então de cebolada. Eu prefiro quando são preparadas à antiga e acompanhadas por boa batata cozida, que se deixa embeber no molho. Não é um petisco muito frequente em Lisboa, mas volta e meia aparece n’O Apuradinho (Rua de Campolide 209), e neste regresso aos restaurantes foi um dos primeiros onde me deliciei - e em dose dupla: os seus magníficos pastéis de bacalhau com arroz de tomate num dia, e as iscas de leitão com batata noutro.