Opinião
A esquina do Rio
Um recente acórdão da Relação do Porto desculpa a violência doméstica em caso de adultério e os juízes escreveram, preto no branco, que "se vê com alguma compreensão a violência exercida pelo homem traído, vexado e humilhado pela mulher".
"Devemos estudar o passado se quisermos definir o futuro".
O Estado das TVs
Este ano, oito dos dez programas de televisão mais vistos foram emitidos pela RTP1 e têm em comum o facto de serem transmissões de jogos de futebol, quer da selecção nacional, quer de equipas portuguesas em provas internacionais. Os outros dois programas deste "top-ten" televisivo foram da TVI: um deles é também a transmissão de um desafio de futebol, no caso, um jogo de preparação da selecção nacional, e o outro é "Pesadelo na Cozinha". A SIC tem, até agora, apenas um programa no Top 15, a novela "Amor Maior", na 14ª posição. Na média anual, a RTP1 tem 12,3% de share, a SIC regista 16,4% e a TVI lidera com 20,4% . A RTP2, pelo seu lado, regista uma média de 1,5%. No cabo, o líder é a CMTV, com uma média de share este ano de 2,2%, seguido da SIC Notícias com 2% e a TVI24 com 1,5%. Mas estes dados devem também ser interpretados de um outro ponto de vista: como está a evolução do comportamento dos espectadores de televisão? No global, este ano, em Portugal, cada espectador está a ver menos 25 minutos de televisão por dia do que no ano passado. E se os canais generalistas são os mais atingidos (RTP, SIC e TVI), a verdade é que também os canais de cabo não crescem ao ritmo da perda dos generalistas - o que está a aumentar é o consumo de outras formas de visionamento, nomeadamente as emissões na internet, em streaming, como a Netflix e outros - sobretudo o YouTube que, em Portugal, tem 4,8 milhões de utilizadores regulares e que algumas estimativas indicam ser a principal forma de visionamento de vídeos utilizado pelo segmento entre os 15 e os 24 anos. Como se vê pelos números do início desta nota, são as transmissões em directo, nomeadamente as desportivas, que conseguem captar maior audiência. O resto, que pode ser visto em diferido a qualquer momento, vai gradualmente passando para segundo plano. É esta a realidade: a forma de ver TV está a mudar mais depressa do que se pensava vir a acontecer.
Ver
Os espelhos são objectos muito interessantes devido à sua capacidade de nos transportar a outras dimensões, permitindo-nos ver o que parecemos ser - selfies antes de existirem smartphones. Ao longo da História, o artistas recorreram aos espelhos com diferentes propósitos, ora para revelar, ora para disfarçar aspectos das cenas que representam. "Do Outro Lado do Espelho", título que remete intencionalmente para o mundo de Alice Liddell, a heroína de Lewis Carroll, é uma nova exposição no Museu Gulbenkian, constituída por 69 obras e está dividida em cinco núcleos temáticos, precedidos por três figuras introdutórias: uma escultura que funciona como convite à visita, uma pintura que introduz o tema da mostra e um espelho-objecto. Com curadoria de Maria Rosa Figueiredo, é uma exposição temática, que tem o espelho como foco principal e que pretende demonstrar a sua presença na arte europeia, sobretudo na pintura, mas também em obras com outros suportes, como escultura, arte do livro, fotografia e cinema, com obras de Eduardo Luiz, Cecília Costa, Noé Sendas (o autor da imagem aqui reproduzida), Paula Rego, Richard Hamilton e Daniel Blaufuks, entre outros. Se for à Gulbenkian, aproveite para descobrir "Ana Hatherly e o Barroco", com curadoria Paulo Pires do Vale, e que permite entender como a investigação e experimentação de Ana Hatherly revalorizou o período histórico do Barroco. Destaque ainda para a exposição que assinala os 30 anos da Galeria Ratton (Rua da Academia das Ciências 2), com um mural colectivo, em azulejo, o suporte que é o foco de trabalho da Galeria fundada por Ana Viegas. Este mural evoca a Carta de Lisboa, uma iniciativa cívica do Fórum Cidadania e que gerou uma obra que contou com a participação de Lourdes Castro, Manuel Vieira, Pedro Proença, Jorge Martins, Andreas Stöcklein e Sofia Areal, entre outros.
Provar
Os doces e compotas portugueses têm melhorado muito nos últimos anos e cito aqui apenas o exemplo da produção da Quinta da Prisca. No entanto, há ainda uma coisa que falta - um bom doce de laranja amarga, algo melhor que o da Casa de Mateus, que é, mesmo assim, o mais sofrível. O que é preciso é que alguém consiga igualar a qualidade dos doces feitos desde 1938 na Escócia pela empresa familiar Mackays - sobretudo a Dundee Orange Marmalade. As laranjas vêm da região de Sevilha e os potes de cobre, aquecidos a vapor, são feitos por artesãos locais.
Como começou este doce de laranja de Sevilha no meio da Escócia ? No meio de uma tempestade, um navio espanhol abrigou-se no porto de Dundee no século XVIII e o carregamento de laranjas de Sevilha foi comprado por um comerciante local que descobriu que as laranjas eram amargas. A mulher resolveu fervê-las com açúcar e assim nasceu o doce de laranja de Dundee. A mesma empresa produz também a Mackays Vintage Dundee Marmalade, mais espessa, com casca em corte grosso, e com boa consistência para barrar torradas. À venda nos bons supermercados e na magnífica loja Ayur, na Avenida Visconde Valmor 34, onde existem quase todas as variedades produzidas pela Mackays (também vale a pena provar a de gengibre com especiarias).
Folhear
Cem anos passados sobre a Revolução de Outubro, já se consegue olhar de forma fria para tudo o que se passou. "Revolução de Outubro - Cronologia, Utopia e Crime", de Manuel S. Fonseca, é uma cronologia dos factos políticos ou sociais reveladores do que se passou, nomeadamente durante os meses que vão de Fevereiro a Outubro de 1917. O livro acompanha a revolução no dia-a-dia, do enforcamento do irmão de Lenine à morte do dirigente da revolução e entrada do seu corpo no mausoléu. Esta não é uma cronologia indiferente ou neutra: o autor arriscou ir buscar ao "lixo da História", para onde Trotsky os quis lançar, o pensamento e os esforços dos revolucionários que queriam "toda a democracia" e recorda que Outubro pôs fim ao pluralismo da esquerda e à democracia participativa que a Revolução de Fevereiro criara na Rússia. Como pôde um partido minoritário e extremista tomar o poder no maior país do mundo? De acordo com Manuel S. Fonseca, sem a I Grande Guerra, não teria havido revolução. Sem Lenine, a Revolução não teria sido em Outubro. Sem o Terror Vermelho, o povo teria apeado os bolcheviques do poder. E, sublinha: "Talvez a revolução tenha sido, afinal, uma contra-revolução, com tudo o que as contra-revoluções trazem: ditadura, prisão, tortura, fome e morte". A cronologia é acompanhada de extensa documentação fotográfica, o livro tem um surpreendente grafismo de Ilídio Vasco e ajuda, cem anos depois, a compreender aquele tempo e como foi possível, em nome de um ideal que parecia nobre, criar o monstro. A tomada de poder, escreve-se nas conclusões, vem instilada pelo vírus totalitário . Edição Guerra & Paz.
Ouvir
Para assinalar o centenário do nascimento de Ella Fitzgerald, foi lançado um disco que é o perfeito exemplo do que a manipulação tecnológica permite fazer. Com base em gravações de Ella Fitzgerald, feitas entre 1950 e 1961, a London Symphony Orchestra adicionou novas orquestrações que substituíram os arranjos originais onde, na maior parte dos casos, predominava o piano. Além da orquestra, a voz de Ella Fitzgerald, remasterizada digitalmente, ganhou novo acompanhante num dos temas, com Gregory Porter. As gravações originais, feitas em mono, deram um suporte precioso para esta manipulação, polémica, mas que em muitos momentos faz destacar a voz da grande senhora. O repertório escolhido percorre vários temas de Cole Porter, como "Misty", "Bewitched", "These Foolish Things" (Remind Me Of You) e "I Get a Kick Out of You", assim como duetos com Louis Armstrong em "Let's Call The Whole Thing Off" e "They Can't Take Away From Me". A última faixa, "With a Song In My Heart", é um magnífico exemplo da extraordinária forma vocal de Ella na época das gravações originais, ao lado do pianista Ellis Larkins. Ella Fitzgerald, with the London Symphony Orchestra - Someone To Watch Over Me. CD já disponível em Portugal.
Semanada
- Portugal lidera os "rankings" europeus de área ardida e é dos países que menos gasta no combate aos incêndios, metade da média da Zona Euro
- segundo uma contabilização feita pelas autarquias, nos recentes incêndios arderam 1.400 casas, 510 fábricas, 1.034 veículos e 1.755 construções de diversa natureza
- um milhão de bicas de resinas de pinheiros foram destruídas nos fogos deste ano, um número que representa 20% da área resinada em Portugal, e há 200 postos de trabalho em risco
- os assaltos a caixas multibanco triplicaram nos seis primeiros meses do ano, em comparação com igual período do ano passado
- o Aeródromo Municipal de Viseu registou, no ano passado, 9.119 movimentos de aviões, em comparação com os 800 movimentos registados no aeroporto de Beja nos últimos seis anos
- no ano passado, registaram-se em Portugal, por dia, 61 divórcios e 89 casamentos
- desde o início do ano, os portugueses gastaram 97 milhões de euros por dia em compras com cartões multibanco l um estudo do Instituto Português de Administração de Marketing indica que Cristiano Ronaldo é o jogador mais valioso do mundo e também a marca mais valiosa
- a marca Ronaldo cresceu quase 50% em relação ao ano anterior e já vale 102 milhões de euros
- na campanha para as directas do PSD, Rui Rio rejeitou a proposta do seu adversário, Pedro Santana Lopes, para que se realizem debates a dois em todas as distritais do partido
- o Supremo Tribunal de Justiça reduziu as penas de prisão aplicadas a um casal que escravizou uma rapariga romena, durante mais de quatro anos, depois de a Relação as ter agravado.