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12 de Fevereiro de 2016 às 09:59

A esquina do Rio

Os automobilistas portugueses vão pagar mais 580 milhões de euros este ano, um Renault Mégane é proporcionalmente mais penalizado na nova fiscalidade automóvel do que um Lamborghini e os veículos híbridos e eléctricos ficam a perder no novo OE

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É muito perigoso querer ter razão quando o Governo está errado.
Voltaire

Poesias
Estava eu a ouvir Mário Centeno no debate parlamentar desta semana e lembrei-me de um poema de Bertolt Brecht, que começa assim: "Todos os dias os ministros dizem ao povo/Como é difícil governar. Sem os ministros/O trigo cresceria para baixo em vez de crescer para cima." É a segunda vez, em poucos dias, que Brecht me vem à memória. A primeira foi depois desse momento sublime dos conselhos de António Costa, quando recomendou que não se andasse de automóvel, que não se fumasse, estabelecendo regras de bom comportamento. Pensei nessa altura que, por este andar, qualquer dia vai estar a dizer-nos outras coisas que podemos ou não fazer. E vai daí lembrei-me deste poema, também de Brecht:

"Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro

Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário

Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável

Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho o meu emprego
Também não me importei

Agora vierem buscar-me
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo."

Dixit
Estou convencido de que queriam evitar que eu apresentasse a minha candidatura à Presidência.
José Sócrates, explicando a sua detenção, em entrevista a um jornal holandês

Semanada
• Os automobilistas portugueses vão pagar mais 580 milhões de euros este ano  um Renault Mégane é proporcionalmente mais penalizado na nova fiscalidade automóvel do que um Lamborghini e os veículos híbridos e eléctricos ficam a perder no novo OE  os técnicos da Unidade Técnica de Apoio Orçamental do Parlamento alertaram para a "elevada incerteza" das estimativas na proposta de Orçamento  Mário Centeno considerou, numa entrevista, que "quem tem 2.000 euros de rendimento tem uma posição privilegiada"  metade da consolidação orçamental vem do lado da receita, a despesa continua impune  as gorduras do Estado aumentam 8,6%, ou seja, 912 milhões de euros, e batem novo recorde  há 20 mil casos de propinas em atraso em quatro universidades, sendo que a de Coimbra lidera a lista  enquanto estava na oposição, António Costa passava a vida a acusar o Governo de ser obediente em relação a Angela Merkel, mas a verdade é que, como primeiro-ministro, Costa conseguiu arranjar um pretexto para ir ouvir Merkel antes de fechar o processo do Orçamento do Estado  apesar de todas as medidas da CML, tomadas ainda no tempo de Costa, o trânsito na Avenida da Liberdade aumentou 30% em apenas um ano, ao contrário das previsões anunciadas  extrapolamos a eficácia das suas previsões lisboetas para a matéria orçamental?  no último ano, duplicou o número de pedidos de asilo político em Portugal, sobretudo de cidadãos da Ucrânia, Mali, China e Paquistão  os turistas chineses gastam, em média, 600 euros em compras quando visitam Portugal  65% dos médicos trabalham no Serviço Nacional de Saúde; nenhum hospital público do Norte tem médicos especialistas à noite  em quatro anos, saíram do país mil médicos  mais de meio milhão de portugueses não sabe ler  antes de sair de Belém, Cavaco vai condecorar Vítor Gaspar - que mal frequentadas andam as condecorações nacionais.

Folhear
"A Ilha do Tesouro" - Há muito tempo que não pegava neste livro. Literalmente, há décadas. E, no entanto, foi um dos meus livros do início da juventude - via-o como o supra-sumo dos livros de aventuras. Foi a época em que devorava histórias de piratas, umas atrás das outras, e nem sonhava que um dia Indiana Jones haveria de tomar conta da minha imaginação. Razão tinha Robert Louis Stevenson, o autor de "A Ilha do Tesouro", quando disse que "a ficção é para o homem adulto o que o brinquedo representa para a criança". Folheio esta nova edição e vou-me recordando de tudo o que vivi, sonhando a ler este livro - desde os mistérios da arca do marinheiro aos enigmas do mapa do tesouro, e até aos feitos do insuperável Capitão Silver. "A Ilha do Tesouro" foi o primeiro romance de Robert Louis Stevenson e foi o livro que mais fama lhe trouxe. Fiquei fascinado ao redescobri-lo na nova edição da Guerra & Paz, com belíssima tradução de Rui Santana Brito. Na nota de contracapa, o editor diz, com razão, que "esta é a mais popular história de piratas de todos os tempos". Se Stevenson fosse nosso contemporâneo, não lhe haveria de faltar matéria-prima para falar sobre piratas, olhando para o que se tem passado em Portugal. 

Gosto
As exportações portuguesas cresceram 33% nos últimos cinco anos. 

Não gosto
Um terço dos parlamentares portugueses concilia a sua actividade enquanto deputado com actividades na advocacia ou na consultoria, o que potencia conflitos de interesse, denuncia um relatório do Conselho da Europa. 

Ver
Hoje não falo de exposições. Venho apenas recomendar um ciclo de cinema, dedicado à obra do cineasta Andrei Tarkovsky, amaldiçoado por Brejnev e pelo regime soviético, e o maior realizador russo depois de Sergei M. Eisenstein. Este ciclo começa exactamente pelo filme "Andrei Rublev", que foi a causa da irritação de Brejnev, que manteve o filme proibido de ser exibido na então União Soviética até 1971, acusando-o de mostrar uma visão deturpada da História. O ciclo começou ontem, quinta-feira, no Nimas, em Lisboa, e tem também programação no Porto a partir de dia 12, no cinema Campo Alegre. Além de "Andrei Rublev" (cartaz original na imagem), o ciclo, que se estende até ao início de Março, inclui a longa-metragem de estreia "O Pequeno Ivan" (que ganhou um Leão de Ouro em Veneza), "Solaris" (de 1972), "Stalker" (de 1979), "O Espelho" (de 1975), "Nostalgia" (de 1983) e o derradeiro "O Sacrifício" (de 1986). A programação pode ser encontrada no site da Medeia Filmes (http://medeiafilmes.com/eventos/ver/evento/ciclo-cinema-russo-andrei-tarkovsky-espaco-nimas/) e inclui também a curta-metragem "O Rolo Compressor e O Violino", que foi o trabalho de fim de curso do cineasta e que é exibido nos mesmos dias que "O Pequeno Ivan".

Arco da velha
Um estudo da OCDE aponta que Portugal é o quarto pior país para se trabalhar, apenas ultrapassado pela Turquia, Espanha e Grécia.  

Provar
Como os meus leitores já terão reparado, ando um pouco enfastiado com os "chefs" portugueses. Diria mesmo que vai sendo altura de substituir a adoração aos "chefs" pelo elogio aos "restaurateurs" - os criadores de restaurantes, os que pensam no seu conceito, na sua arquitectura, no tipo de serviço que querem prestar, na clientela que querem conquistar, em quem se vai ocupar da cozinha e da comida que pretendem servir, bem entendido - ou seja, pensam nos clientes antes de pensarem na sua própria glória.
Um restaurador - para usar o termo português (que se presta a alguma confusão) - é aquilo a que no linguajar contemporâneo se poderia chamar um curador de comensais. Às vezes, são eles próprios "chefs", mas não se põem em bicos de pés. Já houve um tempo em que havia alguns restauradores dignos de nota, agora a coisa é mais escassa na nova cultura ditada pela moda dos balcões dos mercados virados tascas modernaças - que, sinceramente, é um conceito que me irrita. Mas voltemos aos restauradores. Há em Lisboa um que merece destaque - é nepalês, veio para Portugal no final dos anos 1990, e conseguiu criar ambientes especiais. Chama-se Tanka Sapkota, dedica-se à comida italiana que estudou com afinco e não vacila em fazer experiências. É conhecido pela qualidade das suas pizzas napolitanas, mas não hesita em misturar massas tradicionais com, por exemplo, perceves ao lado de camarões da costa. E faz isso com tanto à-vontade, assim como é dos raros a servir trufa branca na estação e a incluir generosas lâminas de trufa negra nas suas pizzas. Depois de várias casas alheias, a começar pela antiga La Trattoria, o Come Prima foi a sua primeira grande experiência e agora tem também o Forno d'Oro, onde dantes era o Mezzaluna. Mas é o Come Prima que merece mais atenção pelos pormenores da decoração, pelo espaço, pelo ambiente e pela qualidade da confecção. O próprio Tanka Sapkota está nas salas dos seus restaurantes, fala com os clientes, permanece atento, como um bom restaurador deve fazer. O Come Prima fica na Rua do Olival, 256, e tem o telefone 213 902 457.

Ouvir
O pianista norueguês Tord Gustavsen é responsável por um dos melhores discos dos últimos anos, "The Well", de 2012. Interpretado com o seu quarteto, "The Well" teve uma sequência lógica em "Extended Circle", editado dois anos depois. Entretanto, Gustavsen sentiu necessidade de sair do caminho que tão bem tinha trilhado nesses dois discos e regressou à ideia de um álbum em que músicas e palavras se completassem, como já tinha feito no início da sua carreira. Com uma extraordinária cantora, meio alemã, meio afegã, Simin Tander, fez um CD de canções simples, maioritariamente com temas tradicionais e de raízes religiosas. Aqui estão textos da tradição popular norueguesa, versões inglesas de escritos do século XIII do poeta e místico persa Rumi, mas também o célebre "I Refuse" de Kenneth Rexroth, um poeta da Beat Generation. Além de Tord Gustavsen no piano, teclados e baixo sintetizado, e da voz de Simin Tander, o baterista Jaris Vespestad completa a formação que fez este "What Was Said", o CD gravado em meados de 2015 e editado em Janeiro deste ano pela ECM. Na Amazon. 

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