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Opinião
06 de Maio de 2015 às 00:01

Marine Le Pen e os seus

O momento é agreste para Marine Le Pen, mas, rumo às presidenciais de 2017, a Frente Nacional tem muito a ganhar face à impotência reformista dos socialistas franceses.

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Crises em cascada na União Europeia - ante a iminente bancarrota grega e a ameaça de saída do Reino Unido abalado pelo separatismo escocês -, intratáveis conflitos no mundo árabe e na África subsaariana - forçando migrações ilegais e alentando jihadismos - contam, também, a favor de Marine.

 

O parricídio político é uma etapa inevitável para deitar borda fora o fundador da FN que, com o seu racismo neofascista exacerbado e revanchismo inconformado pela perda da Argélia, se tornou um obstáculo à expansão eleitoral do partido.  

 

Um partido ganhador  

 

Em 1972 Jean-Marie Le Pen fundou a FN congregando essencialmente neofascistas, desvalidos das direitas bonapartistas e legitimistas, e deserdados do populismo de comerciantes e artesãos de Pierre Poujade.

 

Ao assumir a presidência da FN, em 2011, a filha Marine herdara um movimento muito mais abrangente capaz de fundamentar reivindicações políticas no quadro de um nacionalismo proteccionista e soberanista.

 

Depois de vampirizar o eleitorado comunista, de redefinir os termos da discussão política a partir de uma linha de xenofobia anti-islamista e contenção da imigração, frisando um laicismo republicano, a legitimação eleitoral obriga a FN a descartar alas neofascistas.   

 

A mutação da FN é o fenómeno que desequilibra a balança política da V República a partir dos anos 90 e, apesar da cisão de Bruno Mégret em 1998 revelar que minoritárias correntes tradicionalistas reaccionárias do partido já estavam abertas a alianças com a direita conservadora, a Jean-Marie ainda sobrava tempo e espaço para sovar opositores e seduzir eleitores.

 

Normalização reaccionária

 

Os 17% de Abril de 2002 que levaram Jean-Marie Le Pen à segunda volta das presidenciais contra Jacques Chirac consagraram a transferência do antigo eleitorado comunista e das camadas baixas das classes médias, numa conjuntura em que os opositores da extrema-direita isolavam politicamente a FN.

 

O marasmo eleitoral da FN até à década de 2010 não conseguiu esconder, contudo, a presença cada vez mais obsessiva dos argumentos reaccionários na definição dos termos da discussão política.

 

Com Marine confirma-se a implantação nacional da FN, cativando cerca de um quarto do eleitorado, em especial no Norte e Nordeste, Vale do Ródano e costa mediterrânea, e a aceitação, a chamada normalização, de valores republicanos proteccionistas, securitários, soberanistas e xenófobos.      

 

A mediocridade de François Hollande, o fracasso do "Pacto de Responsabilidade" proclamado em Janeiro de 2014, e herdado por Manuel Valls ao assumir no final de Março desse ano a chefia do governo, expressam a ausência de apoios sociais e políticas a projectos reformistas.

 

Os socialistas são incapazes de desmantelar regimes de proteccionismo empresarial, corporativo e sindical e dão apenas continuidade a uma pulsão imobilista generalizada que pretende preservar os ganhos das três décadas gloriosas do pós-guerra.

 

A candidata  

                                               

Em perda de competitividade, com finanças públicas cronicamente deficitárias e taxas de desemprego de 10% (acima de 25% entre jovens), almejando como menos má uma previsão de crescimento de 1,1% este ano (nos cálculos da Comissão Europeia), a França da alternância conservadora-liberal-socialista é uma potência "inconvincente".

 

Apesar de se manter no pelotão da frente como exportadora de produtos de alto valor acrescentado, surgir como opção preferencial para investimento directo estrangeiro e brilhar como atracção turística de excelência, a França mostra-se insegura e incerta.

 

A almejada liderança política na UE esvaiu-se à medida que a Alemanha agregava relevância política ao seu peso económico e as agruras da integração político-económico-financeira europeia deram força à persistência da tendência soberanista e proteccionista das direitas e esquerdas francesas.

 

Marine Le Pen terá de enfrentar a ira paterna, mas os ventos sopram-lhe de feição para se bater numa segunda volta das presidenciais de 2017 contra Nicolas Sarkozy.

 

Jornalista

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